Patricia Pillar - Estevam Avellar/TV Globo
Patricia PillarEstevam Avellar/TV Globo
Por Gabriel Sobreira

Imagine a dor de ter um filho desaparecido misteriosamente, sem deixar qualquer vestígio. Em busca de qualquer notícia, se ele está vivo ou não, a mãe se vê obrigada a voltar ao lugar para onde jurou que nunca mais retornaria. Além desse turbilhão de sensações, junte a angústia de ter sua outra filha ameaçada de morte nessa fatídica localidade. Essa é a saga de Cássia (Patricia Pillar), em 'Onde Nascem os Fortes', supersérie que estreia amanhã, às 22h20. na Globo. O local é o fictício município de Sertão, no interior da Paraíba. "A Cássia é uma mulher sofrida, com vida difícil, mas muito íntegra, direita, corajosa, resistente. Como as coisas daqui, o cactus, vive com pouca água, mas ela também floresce", diz a atriz.

SERTÃO

Entre idas e vindas, o elenco está desde outubro do ano passado gravando no sertão semiárido paraibano, também no Piauí e em Pernambuco. “Sou do sertão. Minha avó era de Quixadá (município cearense). A família da minha mãe é do Ceará e a do meu pai é do Rio. Eu me sinto do sertão. Estou em casa, totalmente. Quando tem dia cinza, eu chamo de dia bonito”, conta a atriz, de 54 anos, que fi cou emocionada ao presenciar chuva em uma região que não via água há sete anos.

“Tem crianças de 6 anos que nunca viram chuva. Tem a sobrinha de um rapaz que atende a gente, e a menina disse: ‘Mãe, mãe, está caindo água do céu’. E a mãe respondia: ‘É chuva’. É muito duro não ter água. É muito indigno. Temos que ver essas coisas. Não podemos fi car fechados no nosso mundinho, no nosso ar-condicionado, saindo a nossa água da pia, sem a gente ter a menor noção do que se passa com o nosso irmão do Nordeste. Não podemos fechar os olhos para isso”, frisa a atriz. “Essa série também serve para que as pessoas de outros lugares se informem e vejam como é a vida de outro povo que mora em outro lugar, mas que também é brasileiro”, acrescenta.

EXPERIÊNCIA

Patricia diz que faz toda a diferença e que é fundamental gravar no cariri paraibano. “Não poderia apresentar esse trabalho se a gente não estivesse aqui. Se a gente não estivesse respirando esse ar, secura, lidando com as pessoas daqui, atores daqui, do Rio Grande do Norte, Ceará, Pernambuco. Isso dá uma legitimidade. Obviamente, não sou daqui ou de Recife. Esses atores perto da

gente ajudam a dar verdade”, explica a atriz.

A TRAMA

Na história de Geogrge Moura e Sergio Goldenberg, Cássia é uma engenheira química que trabalha em Recife, onde mora desde que deixou Sertão. Ela criou sozinha os filhos gêmeos Nonato (Marco Pigossi) e Maria (Alice Wegmann). A identidade do pai dos jovens é mantida sob sigilo.

“Pode ser qualquer personagem. Não vou dar nenhuma dica. Ela está em contato com isso a todo momento”, entrega. Assim que chega em Sertão, Cássia encontra apoio nos braços de Ramiro (Fábio Assunção), um juiz na cidade, e a ira em Pedro (Alexandre Nero), empresário sem escrúpulos. Ela se envolve com os dois. “O Ramiro é a pessoa que mostra que pode ajudá-la onde ela não conhece ninguém, onde está desamparada em uma situação de violência absurda que ela vive. Ele é a Justiça, então ela tem esperança que a Justiça possa estar ao lado dela nesse momento”, conta.

“O Pedro entra como o poderoso da cidade, o suspeito número um do desaparecimento do filho dela. Não é um romance qualquer. Vão ter envolvimentos, mas sempre passando por essa vida de cada um. Os personagens precisam todos de afeto e é isso que estão buscando, mas podem encontrar ou não, aí só vendo”, completa.

LEMBRANCINHAS

Em seis meses de trabalho intenso, Patricia conta que consegue arrumar uma folguinha para comprar lembrancinhas. “De vez em quando, tem tempo de comprar uma coisinha. O Nero comprou para o filhinho dele, que está pequeno. Comprei para o meu sobrinho-neto

uma sandalinha de couro de bode”, conta ela que, mais do que presentes físicos, vai levar na memória as sensações conquistadas nessa temporada. “Gente é muito mais legal do que coisa. Sou apaixonada por gente. Não vivo sem gente, admiro gente. Espero que a gente se reencontre com a gente mesmo. Assim, seremos bem mais felizes”, afirma.

MAIS HUMANIDADE

Natural de Brasília (DF), Patricia torce para que a supersérie inspire as pessoas a pararem de apontar o dedo para os outros e olharem para si em uma atitude de autoanálise. “É importante saber que não vivemos sozinhos, precisamos do outro. Essas maquininhas (diz apontando para celulares) nos deram a ilusão de que podemos viver cercados dessas coisas, mas elas sem nós não são nada. Não é papo careta, é de humanidade. Temos muito mais em comum com o outro do que pensamos. O que me moveu para escolher a minha profissão? Foi o interesse pelo outro. Desde menina é assim, e isso preenche uma vida. Muito mais do que olhar para si”, atesta. “Vamos morrer, vamos para debaixo da terra, todos iguais, temos que lembrar dessas coisas. Parece que, se for lindo, rico e bem-sucedido, a vida está feita. Não é assim. Os valores não são esses. O que importa não é isso. Estamos vivendo alguns enganos que podem ser revistos e podem trazer mais alegria para a gente. Isso é que faz a vida legal”, completa a intérprete.

CARREIRA

Com 36 anos de carreira e 33 deles na Globo, a atriz faz um balanço mais do que positivo de sua trajetória. ‘Lado a Lado’, novela de 2012, foi o último folhetim de longa duração da atriz. Desde então, ela se dedicou às minisséries e séries, como ‘Amores Roubados’ (2014), ‘O Rebu’ (2014) e ‘Ligações Perigosas’ (2016).

“Sempre mais qualidade do que quantidade. Não vou escolher personagem que não me transforme, que não me diga nada. Não quero sentar em nenhum louro. Nunca pensei na minha carreira nesse sentido (dinheiro, cartaz de protagonista). Pensei no meu desenvolvimento pessoal. Comédia rasgada? Nunca pensei isso de querer fazer uma comédia. Mas tenho uma quedinha por coisas mais cabeludas mesmo. Quero me desafiar, ficar melhor, maior, me desenvolver”, diz ela, aos risos.

FORÇA

Questionada se o povo do sertão é mais forte devido às dificuldades que enfrenta, Patricia afirma que todos nós podemos ser mais fortes. “Nossa coragem não tem a ver com nossa agressividade. Torço para que encontremos nossa força e que ela não seja para destruir, mas para nos unir e nos tornar seres melhores. O afeto é a arma necessária para a revolução. Temos um país muito desigual e essa desigualdade dói, principalmente na pele de quem tem menos chance, menos possibilidades e oportunidades. Não ter oportunidades iguais fere a gente. Essa dor só será sanada quando todos tivermos oportunidades iguais. É simples pensar assim, e eu luto por isso”, sentencia.

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