
Rio - No dia 3 de novembro do ano passado, Alice Wegmann (a pronúncia é "véguimãn"), a Maria de 'Onde Nascem os Fortes', completou 22 anos. Nesse mesmo dia, ela gravou a cena de tentativa de estupro sofrida pela sua personagem. A sequência exibida na última segunda-feira registrou o recorde de audiência da supersérie, com 29 pontos de média em São Paulo (45% das TVs sintonizadas no canal) e 31 no Rio (50% de participação).
CENA DA VIDA
"Foi a cena mais forte e mais emocionante que já gravei em toda a minha vida", afirma a atriz. "Essa cena a gente fez em plano-sequência (direto do início ao fim) no meio daquela loucura toda que é a fábrica, com funcionários trabalhando, aquela poeira toda, caminhão passando. Saí dali e tive uma catarse. Acabou a cena, eu fiquei deitada em uma daquelas dunas tentando respirar. Foram me buscar de carro porque eu tinha corrido muito e, quando voltei para o set, estava o Zé (o diretor artístico, José) Villamarim de braço abertos. Ele chorando e eu chorando junto", acrescenta.

DESGASTE
A história que Alice conta é a de uma garota cujo irmão gêmeo, Nonato (Marco Pigossi), desapareceu. Ela e sua mãe, Cássia (Patricia Pillar), buscam desesperadamente qualquer notícia do rapaz e para isso enfrentam tudo e todos que cruzam o caminho da dupla. "A gente não sabe o que aconteceu com esse menino, ele pode estar vivo, pode estar morto, acho que isso é o que mais a angustia. É a presença da ausência. O não saber domina essa menina e isso faz com que ela faça tudo que vai fazer”, explica Alice.
Sobre as cenas fortes da trama, a atriz revela: “É desgastante emocionalmente. Fiquei doente. Tive queda de pressão, não foi nada grave. Foi estafa. É muito trabalho, muita intensidade, e querer fazer o melhor o tempo todo. Não medimos o esforço que estamos fazendo. A gente tem que repetir a cena. Por exemplo, pular um portão, pulo várias e várias vezes até ficar bom”, reforça. Nas gravações no sertão paraibano, de segunda a sábado, todas as cenas praticamente são externas, muitas vezes debaixo de sol forte e com o ar seco. “A gente tem o problema da voz. Às vezes, a roquidão é inevitável”, explica.
GINASTA OLÍMPICA
Curiosamente, o que ajuda a atriz a enfrentar a maratona de gravações é o passado de atleta de ginástica olímpica. Durante oito anos da vida, dos 3 aos 11, Alice treinou sete horas diárias. “É muito necessário o físico, uma força que vem de todos os lugares do corpo, de dentro e de fora. Acho que isso me ajudou muito. Eu não tive preparação, não mesmo”, frisa.
‘ORGULHO E PAIXÃO’
Alice realmente caiu de paraquedas em ‘Onde Nascem os Fortes’. Tudo porque ela estava reservada para fazer a novela ‘Orgulho e Paixão’. Interpretaria Ema, personagem que é vivida por Agatha Moreira na trama das 18h da Globo. Até deixou o cabelo crescer. Enquanto isso, Paloma Tomé, que estava se preparando para viver Maria — inclusive cortou o cabelo no estilo Joãozinho —, foi remanejada para a novela de Marcos Bernstein.
Era um sábado, por volta das 20h, quando Alice recebeu uma ligação do diretor artístico José Villamarim. “Ele perguntou como estava a minha vida e falei dos projetos que estava envolvida. Ele disse: ‘Você quer vir cá?’. Eu perguntei: ‘Como assim?’. Ele falou: ‘Para viver a nossa protagonista, a história é assim, assado. A gente está contando com você, quer vir?’. Eu: ‘Cara, eu largo tudo agora e vou’. E fui”, lembra, com orgulho, chegando em Cabaceiras (PB) para trabalhar na segunda-feira seguinte.
“Não tive preparação de sotaque. Os capítulos eu li no avião vindo para cá, então foi tudo muito rápido. Eu acho que foi a melhor forma de viver essa personagem. Ela é muito isso, é o impulso, a surpresa, a descoberta”, acrescenta a atriz, que adorou cortar o cabelo. “Sempre quis ter o cabelo curto”, completa.

GATILHO
Mas o sumiço do irmão de Maria é só o ponto de partida para o processo de transformação da personagem. De jovem da cidade grande, ela ganha novos ares. Matou Jurandir (Rodrigo García) acidentalmente, enquanto se defendia da tentativa de estupro. Antes disso, deu um tiro acidental em Joana (Maeve Jinkings), amante de Pedro (Alexandre Nero). Procurada pela polícia corrupta, que espalha cartazes com a foto da moça, é caçada pelos capangas de Pedro, pelo amado, Hermano (Gabriel Leone), e pela mãe, Cássia. Maria vai virar uma cangaceira moderna do sertão.
“Ela arma um bando com o Simplício (Lee Taylor) e o Mudinho (Démick Lopes), aprende a atirar e até fala que nunca imaginou, nem no pior pesadelo, que viveria aquilo tudo”, confessa. O nome da personagem é em homenagem a Maria Bonita? “Acho que não é à toa o nome”, provoca Alice, aos risos.
PEITO ABERTO
Em sua saga, Maria simplesmente encara Pedro, o empresário mais poderoso de Sertão; Ramiro (Fábio Assunção), o juiz da cidade; e Plínio (Enrique Diaz), o delegado. “Ela vai para cima, enfrenta o machismo, peita todo mundo. Ela tem medo, mas a coragem é maior do que o medo. Para uma mãe, isso é desesperador. Ela perdeu um filho e não quer perder outro”, observa a carioca.
APRENDIZADO
O fato dessa personagem ser tão intensa já tem deixado marcas na própria atriz. “A Maria me trouxe mais coragem de ser quem eu sou, de assumir isso e não ter medo disso”, revela. “Nesse tempo aqui (no sertão paraibano), o que mais percebi foi o encantamento pela vida, que a gente não pode perder, achar graça nas pequenas coisas. A Maria me trouxe muito isso. É a questão do largar o celular um pouco e ir ver o mundo. Olhar o que tem em volta. Que lindo é sentir o vento bater e ouvir o silêncio, e prestar atenção em si, no outro”, diz.
VOZ
Adepta de escrever desde a adolescência, quando postava em um blog, Alice usa sua conta no Instagram para compartilhar seus pensamentos com os fãs. Mas, outro dia, de folga, quando caminhava em um shopping na cidade de Campina Grande (PB), ela foi abordada por duas mulheres. “Uma delas disse que perdeu um filho e que meus textos a ajudaram a seguir adiante, sem sentir culpa (diz com voz emocionada), a ser feliz sem sentir culpa, com leveza. A outra mulher falou que perdeu o marido e estava reaprendendo a viver agora”, recorda-se.
DESPEDIDA
Vivendo tantas emoções nos últimos meses, Alice diz que o mais difícil ainda está por vir. “Como vou lidar com a ausência da Maria, com o fim da série? Esse é o meu maior desafio. Foi muito difícil chegar aqui, assim como muito bom e apaixonante também. Agora, me despedir dela vai ser uma dor muito grande e estou tendo que me preparar para isso”, lamenta, antecipadamente.