Barbara Mendes lança novo disco em parceria com o marido - Dede Fedrizzi / Divulgação
Barbara Mendes lança novo disco em parceria com o maridoDede Fedrizzi / Divulgação
Por THIAGO ANTUNES
Rio - Barbara Mendes é uma cantora multifacetada. Com seu primeiro lançamento, em 2000, ‘Live in Greece’, a artista interpretou grandes sucessos da música brasileira, standards de compositores consagrados, de Chico Buarque a Ary Barroso. Em 2009 veio o autoral ‘Nada pra depois’ e, até chegar a 'Orgânico', deste ano, vieram os projetos ‘Superstars’ que vão a Red Hot Chilli Peppers, passando por Michael Jackson a Amy Winehouse — as versões para 'Billie Jean' e 'Rehab', com toque jazzistico que permeia essa fase, estão entre as músicas mais ouvidas em sua página do Spotify. Outros trabalhos incluem versões de bossa em ‘So many stars’, regravações de Roberto Menescal, além das incursões em trilhas de cinema.
Em 'Orgânico', Barbara canta músicas feitas pelo marido, o compositor recifense Tito Marcelo, em ‘Orgânico’, uma coleção de fases que, como o nome sugere, apostam em um som mais cru e vibrante. No álbum, os temas variam entre a solidão no mundo moderno (a sufocante ‘Respiração’) ‘ao amor (‘Degelo’, ‘Escárnio’) com descrições do Nordeste de Tito em ‘Santa d´água’ e ‘Raro e comum’. Ao DIA, Barbara contou como o álbum transita entre várias vertentes, fez um apanhado da carreira e analisou brevemente o mercado. "Tudo está cada vez mais compartimentado na música brasileira", decreta.
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O DIA: Você é uma cantora de muitas vertentes. Como você avalia sua carreira do começo até aqui?
Barbara: As minhas vertentes foram acontecendo muito por mudanças naturais, não foram exatamente escolhas pensadas e organizadas. Quando eu tinha 23 anos, me mudei para os Estados Unidos, em Nova Iorque, para poder estudar. Comecei a ouvir a música brasileira de outras maneiras, porque antes a gente ouve música internacional, muito por coisa da melodia. E existe um mercado lá fora para cantoras que cantam MPB, Bossa Nova, existe essa demanda...então naturalmente eu ia estudando e comecei a fazer show. Dessa forma, tudo foi acontecendo e fui trilhando esse caminho, de forma que a música brasileira foi se tornando tanto uma escolha quanto fui entendendo que ela é maior que si mesma. Comecei a cantar em clubes da jazz com repertório variado e as coisas começaram a se misturar. Fiquei 11 anos lá fora e posso dizer que minha carreira profissional começou fora do Brasil. Já tinha trabalhado com cinema, em projetos de dance music e tudo isso contribuiu para eu chegar até aqui.

E sobre os projetos pararelos, versões que você fez para músicas nacionais e internacionais?
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Meus discos de carreira eu considero quatro e os outros foram projetos em que fui chamada para trabalhar como cantora. O primeiro foi o 'Live in Grace', depois o 'Barbara Mendes' e o 'Nada pra Depois'. Tive muitos singles lançados, teve o 'Superstar'. Se você observar, a maioria das audições no meu Spotify, por exemplo, estão nessas músicas regravadas. Outro projeto foi o 'Barbara Mendes sings Roberto Menescal', em que o  Raymundo Bittencout me chamou pra gravar clássicos do Roberto para a Bossa Nova.

O que a motivou a gravar ‘Orgânico’?
Eu estava há um tempo sem gravar um disco de carreira. E hoje sou casada com o Tito (Marcelo), compositor de todas as músicas do álbum. A gente tocava muito em casa e falei: 'Vamos gravar no apê'. O processo foi ficando tão bacana e interessante e aí nós fomos escolhendo e gravando. Foi como decidir ter um filho (risos). No fim de 2017, paramos o processo por seis meses, porque ele desenvolveu síndrome do pânico. Se fosse cortar o tempo, o processo de gravação, tudo durou uns seis meses. Depois que o Tito se recuperou, a gente chamou o (guitarrista) Victor Biglione para produzir o disco e foi acontecendo até o lançamento.
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Como aconteceu a história com o Tito? Ele foi espécie de corpo no disco, certo?
Ele estava gravando um disco com produção do (pianista) Renato Fonseca, que tocava comigo. O Renato então me avisou do disco do Tito. Eu tinha me separado e pensei: 'Deus me livre, não quero relacionamento' e ele estava namorando. Um dia ele disse que queria me mandar uma música, que tinha feito, e começamos a nos falar por Skype. E aí foi aquela coisa, o olhar bateu (risos). Ele morava em Brasília e fomos tendo um relacionamento à distância, até que ele se mudou aqui pro Rio.

Como foi o processo de gravação do disco?
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Foi um processo que achei muito diferente. Como a gente estava com esse descompromisso, foi muito no processo de ver no que ia dar. Fizemos as gravações num home studio, todo mundo no passo de todo mundo, sem pressa. Foi muito alegre de escolher os caminhos, os tipos de arranjos, tinha realmente essa coisa leve, de ir tocando no tempo.

O álbum tem vários tons, você acha que ele se encaixa nessa angústia um pouco sufocante que tem sido este ano, por exemplo?
Você sabe uma coisa curiosa? 'Respiração' foi a primeira musica que o Tito fez, que retrata justamente essa coisa das solidões modernas provocadas por vários fatores. Essa faixa foi a maneira dele se libertar da síndrome do pânico. A minha maneira de cantar foi meio que um grito de raiva, uma coisa sofrida. Eu botei a raiva e ele botou o sofrimento. A música 'Recalque', que vai ganhar um clipe no dia 11 de junho, trata da relação de pais e filhos. Um pai com uma filha, uma mãe com uma filha, colocando a beleza que as relações podem ter. Sou mãe de uma menina de 12 anos e essa faixa é muito terna, tenho recebido boas resposta sobre. E é isso, soa quase como um contraponto para 'Respiração'. 

Nestas histórias do álbum, me parece que existem múltiplas jornadas. Como você dá voz a elas? Quais são suas influências?
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Eu tive que fazer uma desconstrução das músicas que eu ouvia, já fazia quase três anos que o Tito estava cantando na minha orelha (risos). Ele não é cantor, e aí eu não conseguia me apropriar daquelas canções. Então, precisei ficar muda, nem assobiava nada em casa (risos), fui pra rua e fiquei tentando achar minha voz. Como as letras dele têm uma profundidade, elas também precisavam ser minhas, eu não podia ser coadjuvante. Em relação às influências, elas vêm de tudo que eu vivi e ouvi. Sempre escutei bastante jazz, blues. Há muitos cantores e cantoras que admiro.
A última música, 'Flores raras' tem uma diferença que sai do dito orgânico: sua voz está modificada em estúdio. Qual a intenção?
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Como é um blues, uma música diferente do resto do 'Orgânico', ela não me tocava muito. O Tito insistiu em gravá-la, eu não queria. Achei ela muito fora do resto, mas ele disse: 'A gente está querendo seguir algum mercado?'. E aí já estava sendo respondido, porque é um disco sem expectativa, não tem fórmula. Eu entendi que depois de muitos anos, se algo não toca você, não vai tocar ninguém. O mercado da música está muito compartimentado e, no mínimo, a gente tem que fazer o que gosta muito. O show do disco será assim, o mais purista possível, com a mínima instrumentação. Serão dois violões de aço, bateria e baixo, sem grandes coisas, sem teclado, que é algo ligado à MPB tradicional. Será algo muito direto.

O que você está ouvindo atualmente?
Tenho voltado muito pra escutar jazz... Miles Davis, Herbie Hancock.. Há 20 tantos anos trás eu não entendia essa comunicação toda do jazz e agora estou voltada para essa parte mais instrumental.

Pensa em fazer parceria com alguém?
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Acho que parceria é sempre com quem a gente admira e quer. São as coisas coisas mais importantes para um músico. Eu adoraria cantar com o (Flávio) Venturini, com quem fiz um show muito lindo seis anos atrás no Tetro Rival. Acho até que meu show está parecido com o dele, no sentido da coisa da pouca instrumentação e acho que nos comunicamos muito nesse sentido.

Como será a turnê de ‘Orgânico’? Há datas previstas no Rio?
Além do clipe de 'Respiração no dia 11, farei um show de lançamento do disco no dia 18 de junho no Teatro XP Investimentos, às 21h. Em dezembro, vou voltar à Nova Iorque para gravar outro trabalho com outro produtor que já trabalhei, nesse conceito do que eles chamam de  'brazilian jazz'. As demais datas para o lançamento ainda estão sendo fechadas.