Rio - Depois de passar por São Paulo, Belo Horizonte e o sul do país, Irene Ravache está em cartaz no Rio com a peça "Alma Despejada", no Teatro dos 4, no Shopping da Gávea, na Zona Sul. No espetáculo, a atriz interpreta Teresa, que depois de morta faz sua última visita à casa em que viveu, relembrando histórias, pessoas marcantes e a vida de professora. Em entrevista ao DIA, a artista comenta o sucesso da produção, escrita por Andréa Bassitt e dirigida por Elias Andreato, e a identificação do público com os assuntos abordados.
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"Em todos os lugares fiquei muito feliz. Não só porque os teatros estavam lotados, mas também porque as pessoas vão falar comigo depois e me dão um feedback. Esses textos que tenho escolhido fazer, e muitos deles eu fiz como produtora, são textos que a plateia acaba tendo uma identificação bem rápida. Elas sentem vontade de me comunicar isso. É um envolvimento grande e uma necessidade de tornar claro que aquilo aconteceu com elas ou com alguém que conhecem, como elas ficaram emocionadas. É muito legal este tipo de experiência que o teatro permite", avalia Irene.
Questionada sobre qual trecho da peça a deixa mais emocionada, a veterana revela: "Há um momento em que a Teresa relembra a relação dela com a funcionária que trabalhou na casa dela durante muitos anos. Eu acho muito poético, acho bonito, acho que é uma forma de homenagear essas mulheres que trabalham em nossas casas. Elas muitas vezes levam uma vida muito difícil, tem que pegar inúmeros transportes, acordam muito cedo e chegam com uma cara boa no trabalho. Essas mulheres me comovem muito. A morte relativiza tudo, e a vida serve para nos acertarmos. Realmente acredito que a vida serve para gente se acertar com os nossos amores, desamores e afetos. É para isso que a vida me interessa."
A atriz também aponta a mensagem que gostaria que o público levasse para casa após assistir ao espetáculo. "Mesmo sabendo que a personagem está morta, a plateia encara isso de forma leve porque a personagem é bem-humorada. Não é uma peça triste, pesada ou rancorosa e fala muito mais de vida do que de morte. Eu adoro esse tipo de possibilidade que o teatro oferece. E não tenho medo de misturar essas coisas, porque isso faz parte da vida. Nossa vida não é linear. Ela tem essas nuances", afirma.
Envelhecimento
Aos 80 anos, a artista conta que lida de maneira leve com o envelhecimento. "Achei que fosse pior. Achei que ia ficar martirizada, mas não, é mais uma fase da vida, não é a mais fácil, mas daí eu penso: 'Quais foram as fases fáceis?'. Todos têm suas expectativas que não deram certo, muitas coisas que se imaginava fazendo e acaba não acontecendo. Não é uma coisa desesperadora, é da vida", opina.
Carreira
Com 65 anos de carreira, Irene revela de onde vem o desejo de ainda se manter nos palcos e telinhas. "Vem da curiosidade de fazer determinado papel. Quando eu aceito fazer um espetáculo é porque estou apaixonada. Eu acho que ainda tenho capacidade de me apaixonar".
Longe das novelas desde "Éramos Seis" (2020), na Globo, a atriz, que emocionou o público ao participar do encerramento da última temporada do seriado "Sob Pressão", poderá ser vista em breve em três novos filmes: "O Clube das Mulheres de Negócios", de Anna Muylaert, que estreia no Festival de Gramado, "Os enforcados", longa de Fernando Coimbra com direção com a Leandra Leal, e "Passagrana", de Ravel Cabral.
Repleta de papéis icônicos, ela conta que não tem um preferido, pois todos foram importantes. "O que eu posso dizer é o papel que as pessoas ainda me para e falam o quanto elas amaram foi a Lola de 'Éramos Seis'. Acredito que seja porque a Dona Lola é mãe e a história é muito boa".
Remakes
Em um momento em que a Globo tem optado por remakes, como "Pantanal" (2022) e "Renascer", a veterana comenta as releituras. "Acho que o remake não é um problema, o problema é como ele é feito. Você faz um remake porque foi bom, porque a história é interessante. Então se o adaptador também tiver esse mesmo cuidado, se ele também pensar assim, eu acho que é uma chance muito grande de que tudo dê certo. O que as vezes eu engraçado é que a pessoa vai fazer o remake e ela mutila o principal da obra. Então por que que fez o remake? Se muitas vezes era para meter a mão de forma desastrada".
"Para fazer, você tem que ter um respeito por aquilo e saber que a pessoa que escreveu, escreveu bem e sabia muito bem o que estava fazendo. Esse respeito é necessário. Mas isso não só na televisão. No teatro têm releituras de alguns espetáculos onde você teve um texto primoroso e mexe de uma forma que eu sinceramente digo que a pessoa teve peito não de fazer isso, porque quem escreveu sabia muito bem o que estava fazendo. Não é que as releituras não sejam possíveis, mas você tem que ter respeito por aquilo que você está fazendo, porque se você está fazendo uma releitura é porque a pessoa te deu uma chance de entrar em contato com a obra dele e fazer isso. Então no mínimo merece um respeito", completa.
Direitos autorais
Considerada uma das maiores atrizes do Brasil, Irene ainda opina sobre os direitos autorais dos atores em reprises. "Não sei como isso será um dia bem solucionado, porque de um lado temos as empresas que detêm esses direitos. Ninguém obrigou a gente a assinar determinados contratos, mas assinados porque não sabíamos que podia ser diferente. Não é justo, mas é uma briga que nós ainda vamos sair defasados. É uma briga com o poder."
Serviço:
'Alma Despejada' Em cartaz até 1° de setembro de 2024 Sexta e sábado, às 20h; e domingo, às 19h Local: Teatro dos 4 Endereço: Rua Marquês de São Vicente, 52, Gávea Ingressos: a partir de R$ 70. Vendas na bilheteria e pelo site
*Reportagem da estagiária Letícia Montrezor, sob supervisão de Isabelle Rosa