Luisa Arraes, Maria Duarte, Marina Vianna e Caio Blat são os idealizadores da montagem inédita. Divulgação/Jorge Bispo

Rio - Caio Blat e Marina Vianna são os nomes por trás da direção do espetáculo "Os Irmãos Karamázov", que está em cartaz no Sesc Copacabana, Zona Sul do Rio, até sábado (25). A obra é baseada no livro publicado em 1880 pelo autor russo Fiódor Dostoiévski e expõe as disputas financeiras e paixões de uma família desestruturada. Os diretores falam sobre a construção de uma abordagem psicológica do enredo.
"A ideia era não psicologizar a abordagem dos personagens. São pessoas em carne viva, em um estado febril. É impossível compreendê-los pela lógica cartesiana. Todos estão na beira do abismo e têm prazer em se lançar no vazio. Como se aproximar desses titãs? Foi preciso criar uma plasticidade cênica, sair da seara realista/naturalista para construir uma cena onde tudo é extremado. Não há explicação psicológica, há enigmas. A paixão e a violência que movem as personagens de Dostoievski têm a mesma fonte: o mistério da alma humana", pontua Marina.
Caio comenta a dedicação que eles, que também atuam na produção, tiveram para realizarem a obra. "A gente está se preparando para esse projeto há anos. Estudando, lendo todos os romances de Dostoiévski e entendendo a importância desses arquétipos para o século XX, para a descoberta do inconsciente, da psicanálise, do quanto esse romance é importante, simbólico nesse sentido. E depois entendendo o papel de cada um ali dentro da família, né? Como que todas as mágoas, todos os ressentimentos, o abandono desse pai, como tudo isso ressoa nesses filhos e a raiva, a revolta de cada um". 
A peça utiliza diálogos ágeis e cenas intensas para contar os três dias em que a tragédia familiar se desenvolve, mas sem perder a trama contado nas mil páginas do livro. "Tivemos que ir além de uma concepção de atuação psicológica. Precisamos entender no corpo as instabilidades das personagens de Dostoiévski. São personagens trágicos, arquetípicos e que não cabem na dimensão psicológica individual. Assim, todos os atores e atrizes se preparam para contar essa história de forma coral", diz Marina.
As atrizes Nina Tomsic e Luisa Arraes destacam o trabalho corporal para interpretar personagens com gêneros livres. "O autor foi muito a fundo nas questões existências do ser humano. Os personagens têm questões que são caras a homens e mulheres. A gente queria trazer essa complexidade de Dostoievsky para a literatura do palco. De modo que os personagens ficassem ainda mais complexos e contraditórios. Nós queríamos que tivesse essa camada a mais de questionamento humano, como o autor fez no livro, na nossa montagem. Foi uma tentativa também de descolar, de não trazer o realismo para uma história que é tão expressionista nos sentimentos", explica Luisa.
Trabalhar as emoções dos personagens também é desafiador. "Nossa peça pede que a gente esteja muito disponível para enfrentar questões muito pesadas, seja a raiva, a decepção, o medo, que são sentimentos que normalmente fugimos, e para isso, eu procuro estar com as minhas questões pessoais em paz. Gosto de me acalmar e me acolher antes de ir para o teatro, fazer coisas que gosto, ver pessoas que me fazem bem, estar com o interior calmo para poder abrir espaço para sentir o que o Aliócha Karamázov me pede", diz Nina, que também tem a companhia de Babu Santana no elenco.
Libras 
A diretora de produção Maria Duarte comenta a inclusão de artistas intérpretes da Língua Brasileira de Sinais nos diálogos. "Eu já tinha o desejo de realizar um espetáculo de teatro realmente acessível. Era uma questão que me mobilizava há tempos, desde 2017, quando produzi o 'Grande Sertão: Veredas', da Bia Lessa. No mesmo ano, eu estava dirigindo o ColaborAmerica, e fui completamente atravessada pela questão da acessibilidade como me foi apresentada pela Raíssa Couto, especialista em acessibilidade, no Festival. Eu não tinha nenhuma resposta de como resolver, e sabia que era um desafio imenso, porque nada poderia comprometer a criação artística, mas eu tinha a certeza de que não trataria isso como um recurso anexo, para cumprir tabela ou qualquer exigência. Tive a determinação de que este projeto ia olhar pra acessibilidade de verdade, de forma criativa", contextualiza.
"Eu levei a eles a ideia de termos intérpretes artistas, em cena. Convidamos a Raíssa para integrar a equipe criativa, e não equipe técnica, para que a acessibilidade fizesse parte do processo de criação do espetáculo. Propus a interação da equipe de acessibilidade com a direção musical, de movimento, figurinos, iluminação e cenário. Quis envolver consultores com deficiência desde o dia um de leitura e ensaios, e me envolvi diretamente no desenvolvimento da acessibilidade criativa do espetáculo. Me emociona demais ver uma plateia inteira balançando as mãos levantadas. Sinto que a equipe de 'Os Irmãos Karamázov' foi atravessada pela acessibilidade, assim como eu fui em 2017. Espero que o público também seja atravessado, e que o nosso espetáculo inspire novas montagens acessíveis", completa.
Serviço:
'Os Irmãos Karamázov'
Quarta-feira a domingo, às 20h
Local: Arena do Sesc Copacabana
Endereço: Rua Domingos Ferreira, 160 - Copacabana
Ingressos a partir de: R$ 15 (meia). Temporada esgotada; lugares somente em lista de espera.
Classificação etária: 16 anos