Forças de elite da Guiné afirmaram que conquistaram a capital Conacri neste domingoAFP
Este golpe de Estado militar pode tirar do poder um veterano da política africana que se encontrava cada vez mais isolado.
Não foram registradas até então mortes durante o golpe, apesar do intenso tiroteio ouvido pela manhã na capital deste país da África Ocidental, que há meses atravessa uma grave crise econômica e política.
O possível fim de mais de dez anos de governo de Condé provocou cenas de júbilo em várias partes da capital.
"Decidimos, depois de prender o presidente, que atualmente está conosco (...), suprimir a Constituição em vigor, dissolver as instituições, e também o governo, assim como fechar fronteiras terrestres e aéreas", declarou um dos golpistas, em um comunicado publicado nas redes sociais.
Denunciando o "caos" do governo, o chefe das forças especiais, tenente-coronel Mamady Dumbuya, envolvido em uma bandeira guineana, prometeu em rede nacional "lançar uma consulta nacional para abrir uma transição inclusiva e pacífica".
Os golpistas transmitiram um vídeo do presidente de 83 anos preso. Ao ser questionado sobre se foi maltratado, Condé, de jeans e camisa, sentado em um sofá, nega-se a responder.
À noite, anunciaram na televisão o estabelecimento de um toque de recolher a partir das 20h em todo o país "até segunda ordem" e a substituição dos governadores e prefeitos regionais por militares.
Além disso, convocaram os ministros cessantes e os presidentes das instituições para uma reunião na segunda-feira. “Qualquer recusa em comparecer será considerada um ato de rebelião”, alertaram.
Libertação "imediata"
O Ministério da Defesa afirmou inicialmente em nota que a guarda presidencial havia repelido os "insurgentes" quando tentaram tomar o palácio presidencial. Depois desse comunicado, porém, as autoridades ficaram em silêncio.
O secretário-geral da ONU, Antonio Guterres, condenou "veementemente" o golpe na Guiné e exigiu "a liberação do presidente" Condé.
O presidente da União Africana (UA), Felix Tshisekedi, e o presidente da Comissão da UA, Musa Faki Mahamat, condenaram "qualquer tomada de poder pela força" e exigiram a libertação "imediata" do presidente, em declaração conjunta em que solicitaram uma reunião de emergência da organização.
A Comunidade Econômica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO) também condenou "nos termos mais enérgicos esta tentativa de golpe" e exigiu o "respeito pela integridade física" do chefe de Estado guineense e a sua libertação imediata. Também pediu "um retorno à ordem constitucional, sob pena de sanções".
A França condenou a "tentativa" de golpe na Guiné e pediu a "libertação imediata e incondicional do presidente Condé", segundo nota do Ministério de Relações Exteriores divulgada neste domingo.
"Estamos orgulhosos das forças especiais, vergonha à milícia do ex-presidente Alpha Condé, morte aos torturadores e assassinos de nossa juventude", exclamou um manifestante sob condição de anonimato.
"Vamos reescrever uma Constituição juntos, desta vez, toda a Guiné", garantiu o líder golpista. “Não precisamos mais estuprar a Guiné, precisamos fazer amor com ela, simplesmente”, concluiu.
Os principais líderes da oposição, ao serem procurados pela AFP, não quiseram comentar.
Mas a Frente Nacional de Defesa da Constituição (FNDC), coalizão de movimentos políticos e da sociedade civil que liderou o protesto contra um terceiro mandato de Condé, disse que tomou conhecimento da "detenção do ditador" e das declarações dos militares sobre a Constituição.
Tiros no ar
"Vi uma coluna de veículos militares, a bordo dos quais soldados muito excitados atiravam para o alto e entoavam slogans militares", contou à AFP um morador do bairro do Tombo, perto do centro.
Há meses, este país da África Ocidental atravessa uma grave crise econômica e política, agravada pela pandemia da covid-19. É um dos mais pobres do mundo, apesar de consideráveis recursos minerais e hídricos.
Ex-oponente histórico, preso e até condenado à morte, Condé foi o primeiro presidente democraticamente eleito no país, em 2010, após décadas de regimes autoritários.
Para seus opositores e para os defensores da democracia, Condé faz parte da lista de líderes africanos que permanecem no poder além do que estipulado, com cada vez mais frequência e com base em argumentos jurídicos.
No ano passado, sua candidatura para um terceiro mandato gerou meses de tensão, com dezenas de mortos e presos.
Condé foi finalmente proclamado presidente para um novo mandato em 7 de novembro, apesar dos apelos de vários candidatos que denunciaram todo o tipo de irregularidade eleitoral.
Os comentários não representam a opinião do jornal e são de responsabilidade do autor.