
Com um texto semelhante, mas acrescentando que a informação procede do “VIROLOGY Center, Moscou, Rússia”, a mensagem viralizou no Twitter. Em espanhol esta mensagem circula desde o início do mês e acumula mais de 40 mil compartilhamentos.
Embora na Rússia existam vários centros de virologia, não há registro na Internet de que algum deles tenha se pronunciado sobre os efeitos do pH no combate à COVID-19.
Alimentos contra a COVID-19?
O especialista sustenta que mesmo que a pessoa tenha um bom estado nutricional, o vírus pode atingi-la: “Não importa se ela se alimenta bem. Mesmo que a pessoa tenha boas defesas e seu sistema imunológico esteja bem, mesmo consumindo alimentos alcalinos, o vírus pode atacá-la porque até agora não existe cura nem vacina possível para não ser infectada, e os alimentos não podem prevenir o contágio por um vírus”.
O pH, ou potencial hidrogeniônico, é uma “medida que expressa o grau de acidez ou basicidade de uma solução em uma escala de varia de 0 a 14. Uma solução com o pH menor que 7 se diz ácida, enquanto se for maior do que 7 é classificada como básica. Uma solução com pH 7 será neutra”, como indica um estudo sobre o tema.
O pesquisador da Associação Argentina de Virologia Juan Carballeda concorda com Castillo: “De maneira nenhuma um alimento varia o pH do corpo humano” e, menos ainda, “fornece um tipo de defesa para impedir que fique doente”.
“Por mais que consumamos alimentos ácidos e básicos, isso não muda o pH do corpo humano. De maneira nenhuma qualquer alimento, por variação de pH ou porque faça algo em nosso sistema digestório, irá combater a infecção, ou o contágio do coronavírus, ou de um vírus em geral. O pH do nosso organismo é muito estável. Está sempre entre 7,35 e 7,42, e não se modifica por consumirmos alimentos”, assegura o especialista.
E Carballeda conclui: “Nada pode modificar o pH do corpo humano. Nada. O pH está finamente regulado e é impossível alterá-lo. Se o pH de um organismo mudar, mesmo que apenas por um momento, gerará imediatamente uma condição patológica”.
Em sua página de informação sobre a COVID-19, a Organização Mundial da Saúde (OMS) indica que até o momento não existe vacina, remédio, ou tratamento, que possa prevenir ou curar o novo coronavírus.
Os especialistas concordam que uma vacinação maciça permitiria imunizar uma alta porcentagem da população mundial, o que poderia frear a pandemia, mas, por enquanto, os cientistas não sabem se a vacina estará pronta este ano.
Alimentos alcalinos e ácidos
“Beiram o absurdo os valores colocados nessa mensagem. A escala de pH vai de 0 a 14 e diz-se que o abacate tem um pH de 15,6. Quanto aos outros valores indicados nas publicações [virais], se fossem verdadeiros - o que não é o caso - seriam demasiado alcalinos e, quando consumidos, teriam um efeito cáustico nas membranas da boca e do trato digestivo superior, impossibilitando o seu consumo”, afirmou o especialista.
O Serviço ao Consumidor do Departamento de Agricultura da Carolina do Norte explica esta classificação em um documento: “Os alimentos são classificados como ácidos, ou alcalinos, de acordo com o efeito que têm no organismo humano depois da digestão, e não de acordo com o pH que têm em si mesmos. É por essa razão que o sabor que têm não é um indicador do pH que gerarão em nosso organismo uma vez consumidos”.
Os alimentos ácidos são os que “têm um pH natural de 4,6 ou menos”, define a FDA, a agência do governo norte-americano para regulação dos alimentos. E os alcalinos devem “ter um valor final de 4,6 ou mais, excetuando-se as bebidas alcóolicas”.
Tabelas de alimentos
“Dado que a FDA não tem os recursos para examinar adequadamente esta informação, eliminou-a de seu site oficial”, explicou à AFP por e-mail a equipe de suporte do LACF (Low-acid canned Foods, ou alimentos enlatados baixos em ácido, na tradução livre para o português), dependência da FDA encarregada da avaliação do processamento de alimentos.
Alguns centros de pesquisa, no entanto, como o Serviço ao Consumidor do Departamento de Agricultura da Carolina do Norte desenvolveram algumas aproximações.
Neste documento, este departamento assegura que a sua lista inclui apenas os alimentos “sobre os quais a maioria dos analistas concorda em classificar como ácidos, ou alcalinos, depois de serem digeridos [...] pois existe uma discordância a respeito do pH de certos alimentos”.
Também existem tabelas com pH dos alimentos no site do Ministério da Agricultura de Quebec, do Canadá, em páginas de universidades, como a de Clemson, na Carolina do Sul, nos Estados Unidos, ou do Centro de Pesquisa de Alimentos e Produtos de Agricultura da Universidade de Oklahoma.
Embora nem todos os alimentos mencionados nas mensagens virais estejam nestas listas, a AFP realizou uma comparação dos mesmos com a informação disponível.
Imunidade contra o novo coronavírus?
Os vírus são “organismos simples que não têm capacidade de regular o seu pH e estão expostos ao pH da célula hospedeira, por isso não podem ser imunes”, explica Garavito, da Universidade Nacional da Colômbia.
“O vírus [todos, em general] não pode ser imune, já que não conta com um sistema imunológico nem gera uma resposta imune a nada [...] mas pode ser mais suscetível quando perde a sua camada e fica exposto a condições extremas de pH, temperatura e baixa umidade. É nisso que se baseiam os métodos de limpeza e desinfecção existentes: em tentar remover a cápsula protetora do material genético do vírus e, desta maneira, torná-lo mais suscetível, mas isso só se aplica quando o vírus está em materiais inertes, não quando está no corpo humano”, detalha.