Hospital de campanha do Riocentro
Hospital de campanha do RiocentroDivulgação / Prefeitura
Por Bernardo Costa
Ao mesmo tempo em que chega ao limite a capacidade de internação hospitalar para pacientes de covid-19 no Rio, as unidades da Rede SUS destacadas como referência para o tratamento da doença no estado contam com 1.844 leitos impedidos. O número é o somatório de leitos inativos em unidades administradas pela Prefeitura do Rio, governo estadual e Ministério da Saúde. Todas ficam na cidade do Rio, à exceção do Hospital São José, em Duque de Caxias, na Baixada Fluminense. Além dele, estão no levantamento leitos nas seguintes unidades: Hospital de Campanha do Riocentro, Hospital Ronaldo Gazolla, Instituto Nacional de Infectologia Evandro Chagas (INI Fiocruz), Hospital Universitário Pedro Ernesto, Hospital Universitário Clementino Fraga Filho e Hospital Universitário Gaffrée e Guinle.

Os 1.844 leitos impedidos, número que aparece nas plataformas de regulação de vagas da prefeitura e do governo estadual, obtido pelo DIA, estão divididos da seguinte forma: 435 deles são exclusivos para o tratamento da Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG) e outros 1.409 se referem a leitos de outras especialidades. Os números foram apurados na última terça-feira.

Enquanto os leitos permanecem impedidos de receber pacientes, o boletim desta quarta-feira da Prefeitura do Rio aponta que há 420 pessoas na fila de espera por leitos de covid-19 na cidade do Rio e na Baixada Fluminense, um aumento de 445% em relação a duas semanas atrás, quando havia 70 pacientes na fila. Ainda de acordo com o boletim, a taxa de ocupação de leitos de UTI na cidade do Rio na Rede SUS, que inclui hospitais municipais, estaduais e federais - é de 91%. Já a de leitos de enfermaria é de 87%. Na rede municipal, há 288 leitos de UTI, 280 deles ocupados.

Subcoordenadora de Saúde e Tutela Coletiva da Defensoria Pública do Estado do Rio, Alessandra Nascimento afirma que, caso não houvesse o bloqueio de 1.844 leitos na Rede SUS, não haveria fila de espera. Ela conta que tem visitado unidades de saúde programadas pela prefeitura e pelo governo do estado para a abertura de novos leitos nas próximas semanas, mas afirma que o ritmo de ativação de espaços para internação ainda está longe do ideal.

"Provavelmente, voltaremos a ter um grande número de pessoas morrendo de covid-19 em casa, pois o prazo que a prefeitura e o estado dão para a abertura de leitos é insuficiente. Por isso, é importante que as pessoas mantenham o isolamento social e usem máscaras e demais métodos de prevenção, para dar tempo de a rede se preparar, o que não está acontecendo na velocidade desejada", diz Alessandra, que aponta a falta de profissionais como o maior gargalo para a abertura dos leitos hoje bloqueados:

"Em nossas visitas recentes às unidades com leitos bloqueados ouvimos dos gestores que o que impede a abertura de leitos é a contratação de pessoal, pois há medicamentos, espaços físicos e equipamentos. Para se ativar leitos de UTI, por exemplo, é preciso ter equipes completas multidisciplinares para atuação de segunda a segunda: médicos intensivistas, fisioterapeutas, anestesistas, enfermeiros..."
Hospital de Campanha de Nova Iguaçu, área interna. Unidade ficou pronta mas foi desativada sem receber um paciente sequer  - Foto do leitor
Hospital de Campanha de Nova Iguaçu, área interna. Unidade ficou pronta mas foi desativada sem receber um paciente sequer Foto do leitor
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CREMERJ: "HOUVE ERRO ESTRATÉGICO"

Segundo o presidente do Conselho Regional de Medicina do Estado do Rio (Cremerj), Walter Palis, o alto número de leitos bloqueados evidencia um erro estratégico dos poderes públicos no combate à pandemia, que optaram pela construção de hospitais de campanha em detrimento da preparação dos leitos bloqueados na rede.

"Acredito que a opção pelos hospitais de campanha tenha sido feita pela velocidade na abertura desse tipo de unidade, mas sabíamos que ela não deixaria legado, ao contrário da preparação dos leitos bloqueados, que já são um problema antigo na rede. Ainda assim, dos sete hospitais de campanha preparados pelo estado, só tivemos um e meio em funcionamento: o do Maracanã e o de São Gonçalo, que funcionou de forma parcial. Hoje, vemos que foi uma estratégia desastrosa, pois continuamos com grande quantidade de leitos bloqueados, que estão fazendo falta neste momento", diz Palis.

Segundo ele, os leitos que não são de covid-19, e constituem a maior parte dos leitos impedidos, poderiam ser adaptados para o enfrentamento da pandemia: "Nesses nove, 10 meses de pandemia, haveria tempo suficiente para a adaptação de um número de leitos que poderiam estar ativos hoje, zerando a fila de espera".
Rio de Janeiro 09/09/2020 - Movimentação no Hospital de Campanha do Maracanã. Foto: Luciano Belford/Agencia O Dia - Luciano Belford/Agencia O Dia
Rio de Janeiro 09/09/2020 - Movimentação no Hospital de Campanha do Maracanã. Foto: Luciano Belford/Agencia O DiaLuciano Belford/Agencia O Dia


NÚMEROS EM DETALHES E RESPOSTAS

Em relação aos leitos de SRAG, há 181 leitos impedidos de UTI adulto, três de UTI pediátrica e 251 de clínica médica. Já em relação aos outros leitos, há 277 impedidos de UTI adulto, 21 de UTI pediátrica e 25 de UTI Neonatal.

A prefeitura do Rio informou que vai abrir 220 leitos para covid-19 na rede municipal, que vão começar a ser abertos progressivamente na próxima semana. Em nota, a Secretaria municipal de Saúde disse que o Hospital de Campanha do Riocentro abrirá 170 leitos de enfermaria nos próximos 15 dias, e que outros 50 leitos de UTI serão abertos: 20 no Riocentro e 30 no Hospital Ronaldo Gazolla.

"Esses leitos intensivos estarão disponíveis em até três semanas, com a abertura de 20 por semana", diz a nota.

Já a Secretaria estadual de Saúde disse que 130 leitos serão abertos até o dia 18, e que a taxa de ocupação na rede estadual está em 67% em leitos de enfermaria e 76% em leitos de UTI. A nota informa, ainda, que o tempo médio de regulação de pacientes da fila de espera para leitos é de 1,57 dia para enfermaria e 0,98 para UTI, considerando as vagas disponíveis nas redes municipal, estadual e federal.

Também procurado, o Ministério da Saúde limitou-se a dizer que a responsabilidade para a regulação de pacientes é do município, sem responder aos questionamentos sobre os leitos bloqueados na rede federal.