Funcionários denunciam sucateamento do HFA
Funcionários denunciam sucateamento do HFAWhatsApp O Dia (98762-8248)
Por Bernardo Costa
O aumento de casos de covid-19 após a desativação dos hospitais de campanha - principal estratégia do governo estadual para o combate à pandemia - expõe a precariedade de algumas das unidades de saúde do Rio, com leitos bloqueados devido a problemas como falta de profissionais e danos de infraestrutura. Uma das unidades que sofre com os dois fatores é o Hospital Federal do Andaraí (HFA), cujos médicos chefes de serviço vêm denunciando entraves para o bom atendimento à população e cobrando providências pelo menos desde 2013, quando o prédio onde funcionava a emergência da unidade foi demolido, deixando o serviço, até hoje, em um espaço improvisado. O antigo setor tornou-se um terreno baldio dentro do hospital, cercado por tapumes.
Em imagens enviadas ao WhatsApp de O DIA, é possível conferir os problemas de infraestrutura no interior do edifício onde funciona a Unidade de Pacientes Internos (UPI): paredes mofadas e com infiltrações, fiação exposta, goteira, reboco destruído e espaços interditados por falta de condições de funcionamento. As imagens foram registradas no último dia 16. Segundo profissionais do hospital, as áreas fechadas no prédio são resultado de um conjunto de 14 obras iniciadas há sete anos, mas que, até hoje, não foram concluídas.

O edifício da UPI abriga serviços do Centro de Tratamento de Queimados (CTQ), unidade tida como referência nacional na rede pública de saúde. Nas imagens enviadas ao DIA, há paredes com infiltração e mofo em duas salas do 4º andar, onde funciona o ambulatório do CTQ. Em uma delas, é possível ver um profissional durante atendimento a um paciente.
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Problemas de infraestrutura no Hospital do Andaraí. Terreno baldio onde funcionava o prédio da antiga emergência da unidade, demolido em 2013 - Foto de leitor
Problemas de infraestrutura no Hospital do Andaraí. Terreno baldio onde funcionava o prédio da antiga emergência da unidade, demolido em 2013Foto de leitor


"O atendimento ambulatorial está acontecendo no prédio da UPI de forma improvisada há oito anos. As infiltrações e fungos trazem risco de contaminação a pacientes e médicos. O correto seria o setor estar no prédio da frente, o da Unidade de Pacientes Externos (UPE). Mas lá, no local onde deveríamos ficar, está tudo quebrado, com obras paradas todos esses anos", diz o médico Roberto Portes, ex-presidente do Corpo Clínico do HFA e ex-diretor do CTQ, removido da unidade por decisão da Superintendência do Ministério da Saúde no Rio, no dia 11 de novembro, junto com outros seis profissionais.

Ainda no edifício da UPI, o CTQ também ocupa o 9º andar, onde funciona o setor de internação. Segundo Portes, há 14 leitos no total, onde deveria haver mais seis e uma sala cirúrgica - espaços cujas obras não tiveram conclusão. O médico também aponta falta de profissionais: há 11 médicos no total, quando o efetivo para atender os leitos ativos deveria ser de 18. E não há pediatra.

"Há déficit de médicos, principalmente de pediatras e clínicos intensivistas com expertise para o acompanhamento de grande queimados. Nos dois últimos anos, perdemos os dois únicos pediatras que tínhamos e, mesmo assim, não deixamos de atender crianças. Quando necessário, um médico da emergência pediátrica, que funciona no prédio em frente, tem que vir até o CTQ", diz Portes.
O 10º andar, onde funcionava maternidade, está desativado há sete anos - Foto do leitor
O 10º andar, onde funcionava maternidade, está desativado há sete anosFoto do leitor
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O andar acima, o 10º, está desativado. Nas imagens, é possível ver salas trancadas, goteira, elevadores, paredes e teto com marcas de destruição. O abandono causa reflexos no 9º andar.

"As tubulações são todas muito velhas e, toda hora, estoura uma tubulação e vaza água para o andar de baixo, que acaba tendo que ficar com espaços interditados. Os elevadores enchem de água e começam a vazar para baixo. A manutenção sempre foi precária", relata Portes.
Infiltrações no 4º andar, onde funciona o ambulatório do Centro de Tratamento de Queimados (CTQ) - Foto de leitor
Infiltrações no 4º andar, onde funciona o ambulatório do Centro de Tratamento de Queimados (CTQ)Foto de leitor


Segundo o médico, no 10º andar funcionava a maternidade, que foi desativada para obras que não tiveram conclusão. No local, explica, funcionariam quatro salas cirúrgicas e 16 leitos de pós-operatório.

DOCUMENTO COBRA MANUTENÇÃO

Mesmo com carência de profissionais, seis médicos e mais um técnico de laboratório, todos com mais de 35 anos de atuação no HFA, foram transferidos da unidade ex-officio, sem possibilidade de recurso, no dia 11 de novembro, por determinação da Superintendência do Ministério da Saúde no Rio. Eles alegam que a medida foi uma retaliação às denúncias que vêm fazendo há pelo menos uma década à direção do hospital, ao Ministério da Saúde, ao Conselho Regional de Medicina do Estado do Rio (Cremerj), ao Ministério Público Federal e à Justiça Federal, além das entrevistas recorrentes à imprensa relatando problemas no hospital.
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O que teria sido o estopim para as remoções, afirmam, foi um documento assinado por um total de 16 profissionais, em 29 de outubro, cobrando melhorias e adequação de serviços para que seja mantido o perfil de atendimento clínico e cirúrgico de média e alta complexidade e ao atendimento ao paciente oncológico.
Obras interditadas no 9º andar, no serviço de internação do Centro de Tratamento de Queimados - Foto do leitor
Obras interditadas no 9º andar, no serviço de internação do Centro de Tratamento de QueimadosFoto do leitor
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No documento, os profissionais chama atenção para a necessidade de avaliação dos elevadores dos edifícios da UPI e UPE e para a segurança predial, especialmente em relação à prevenção de incêndios - "já que o HFA é uma construção antiga e possui enfermarias, setores intensivos fechados e outras áreas de circulação de usuários e funcionários verticalmente distribuídos em 12 andares", destaca trecho.

Em outro trecho, o texto aponta que outras áreas aguardando decisão referem-se à conclusão de obras de enfermarias e ambulatório do CTQ (Centro de Tratamento de Queimados), à obra de conclusão da cozinha do hospital, à definição sobre as instalações adequadas para o setor de Oncologia e os espaços ociosos do 10º andar, à conclusão das obras da fachada principal do hospital e descaracterização da atual emergência como de "portas abertas 24 horas" devido ao funcionamento de forma improvisada após a demolição do prédio em que o setor originalmente funcionava.

"A permanência desse setor (Emergência) em área física desprovida dos requisitos necessários compromete usuários e funcionários, tendo se tornado foco de vulnerabilidade potencial da unidade", destaca trecho do documento.
RESPOSTA DO MINISTÉRIO DA SAÚDE
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Segundo o Ministério da Saúde, está em andamento a elaboração de projetos para que sejam reiniciadas as obras nos espaços interditados do HFA, como os do 9º e 10º andar do edifício da UPI. A previsão de término destes projetos é março de 2021. O 4º andar, diz a pasta, está sendo preparado para receber leitos destinados a pacientes de covid-19.
Sobre a Emergência, o Ministério da Saúde disse que o projeto está em andamento e será entregue em março, com previsão de licitação das obras do novo espaço em 2021. 
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"Paralelamente, estamos desenvolvendo um projeto de requalificação da ambiência na área de acesso/recepção entre os prédios da UPI e UPE (onde ficam os tapumes), a fim de dar conforto e segurança aos usuários que transitam pela área", diz a pasta. 
Sobre a manutenção precária, o Ministério da Saúde argumenta que a empresa de manutenção foi trocada há dois meses após inúmeros problemas com o contrato anterior. E que há uma série de procedimentos de manutenção corretiva sendo iniciados, a fim de retornar as edificações ao estado de conservação adequado.
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Já em relação ao déficit de profissionais, o Ministério da Saúde disse que o setor de Recursos Humanos do HFA estuda o redimensionamento dos profissionais para o CTQ (Centro de Tratamento de Queimados), condizente com a realidade atual do setor. A pasta acrescenta que os profissionais admitidos em processo seletivo de setembro para os hospitais federais do Rio estão em fase final de contratação.