Armas apreendidas durante uma ação contra milicianos de Vargem Pequena na última semanaRenan Areias / Agência O Dia
Fome de poder: disputa por territórios entre milicianos e traficantes faz moradores reféns
Tentativa dos grupos em tomar o controle de áreas neutras tem desencadeado confrontos violentos
Rio - Os diferentes grupos criminosos que agem na Região Metropolitana do Rio acirraram uma violenta disputa por territórios. A busca pelo controle de comunidades do RJ entre traficantes e milicianos faz com que os moradores dessas áreas são frequentemente pegos no fogo cruzado, vivenciando um clima de medo e insegurança constante.
Em São João de Meriti, nesta quarta-feira (13), uma adolescente e uma criança foram baleadas em um confronto entre traficantes e milicianos na Avenida Euclides da Cunha. Segundo a polícia, membros da milícia da região cobravam comerciantes quando foram abordados por criminosos da comunidade do Dique e da Faisão, tendo início ao confronto. Atualmente, a região é palco de intensos tiroteios. De acordo com as investigações da Polícia Civil, a área em que o crime ocorreu, é considerada neutra, já que não é dominada nem por milicianos nem por traficantes.
A jovem, identificada apenas como Evelyn, 14 anos, foi atingida na cabeça, braço e perna e foi encaminhada para o Hospital Adão Pereira Nunes, em Duque de Caxias. Ela fez e uma cirurgia e foi encaminhada para o CTI da unidade, onde está internada em estado grave e entubada. Um menino de 5 anos chamado Deivid foi atingido de raspão no nariz e socorrido para a Unidade de Pronto Atendimento (UPA) de Sumaré. O estado de saúde é estável e a vítima não corre risco de morrer. A Polícia Militar informou que o policiamento foi reforçado na região.
A tentativa do tráfico e da milícia em tomar o controle de uma área neutra tem desencadeado confrontos violentos entre os dois grupos, resultando em um aumento da violência nas comunidades locais. O controle de territórios é fundamental para o tráfico de drogas, uma vez que essas áreas servem como pontos de venda e distribuição de entorpecentes, além de serem fonte de renda para as organizações criminosas.
As milícias surgiram na década de 1960, mas se proliferaram nos anos 2000. Policiais e ex-policiais corruptos passaram a “oferecer segurança” nas comunidades sob o pretexto de “resguardar” os moradores do tráfico. A “taxa de proteção” era apenas uma forma de exploração. Paramilitares passaram a impor o monopólio de serviços de internet clandestina e de distribuição de água e de gás.
As áreas dominadas por grupos paramilitares cresceram 387% em 16 anos. Os bandos atuam em 10% de toda a Região Metropolitana. Os dados são do Mapa dos Grupos Armados, feito pelo Instituto Fogo Cruzado em parceria com o Grupo de Estudos dos Novos Ilegalismos, da Universidade Federal Fluminense (Geni-UFF).
Segundo o especialista em Segurança Pública, José Ricardo Bandeira, criminosos demonstram uma audácia ao desafiar as autoridades policiais e trazer a guerra para áreas urbanas mais visíveis, como ruas e bairros residenciais. Para ele, isso está diretamente ligado aos conflitos internos entre os grupos. "Esses conflitos podem levar a uma escalada da violência, com disputas sendo resolvidas nas ruas através de confrontos armados. À medida que as facções rivais competem pelo controle de territórios e rotas de tráfico, a violência pode se espalhar para áreas anteriormente consideradas mais seguras", disse em entrevista ao DIA.
De acordo com Bandeira, para os grupos criminosos, o controle de territórios e o tráfico de drogas representam fontes significativas de lucro e poder. Por isso, estão dispostos a assumir riscos cada vez maiores para proteger seus interesses financeiros e expandir sua influência, mesmo que isso signifique desafiar abertamente as autoridades ou atingir a população.
Em relação à solução, o especialista ressalta que não existe uma única saída para acabar com a violência e o crime organizado. Segundo ele, é necessário um esforço conjunto coordenado por diversos setores, incluindo o governo, a sociedade e as próprias comunidades afetadas, para enfrentar esses desafios de forma eficaz.
Um levantamento feito pelo Instituto Fogo Cruzado indica que a violência que atinge o Rio já deixou 12 crianças e adolescentes baleadas, no acumulado de janeiro a março deste ano. Segundo o balanço, o número indica que foram cinco crianças, com idade até 12 anos, e sete adolescentes, entre 12 e 17 anos, sendo que desses cinco morreram.
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