Rio - Moradores do Complexo da Maré, na Zona Norte do Rio, denunciam a paralisação dos serviços essenciais, como escolas e clínicas da família, após oito dias consecutivos de operação na região. A ação, conduzida pela Polícia Civil e pela Secretaria de Ordem Pública (Seop), visa a demolição de imóveis de luxo irregulares, construídos pelo tráfico no local.
A vereadora Monica Cunha, presidente da Comissão de Combate ao Racismo, oficiou, nesta segunda-feira (26), as secretarias municipais de Educação, Saúde e Ordem Pública, exigindo uma investigação aprofundada sobre as consequências dessas operações para os moradores da comunidade. Segundo o documento, mais de 10 mil crianças estão sem aulas e cerca de 50 mil pessoas foram impactadas sem acesso aos serviços de saúde, com as clínicas da família fechadas.
"Questionamos sobre o protocolo de segurança e o planejamento habitacional para as pessoas removidas dos imóveis. Até o momento, não recebemos nenhuma resposta das secretarias envolvidas, o que agrava ainda mais a situação de vulnerabilidade dos moradores”, afirmou.
Segundo Monica Cunha, os ofícios contém denúncias relatando que as ações policiais têm sido marcadas por abordagens truculentas e remoções de imóveis sem notificação prévia. Além disso, há outros relatos sobre a retirada de eletrodomésticos das casas, agressões físicas, ferimentos e até cárcere privado.
O que dizem os responsáveis?
A Secretaria de Ordem Pública informou que recebeu o ofício e que irá analisar os pontos do documento.
"Durante a operação de demolição de construções irregulares no condomínio com mais de 40 imóveis na comunidade Parque União, na Maré, do último 21, os agentes da SEOP apreenderam televisões, ar-condicionado, fogão e uma geladeira que estavam em um apartamento de luxo de um dos prédios que está sendo demolido. Nele, também foram encontradas máquinas para a realização da obra como gerador, furadeiras, marteletes, além de um depósito com materiais de construção. Nenhuma pessoa se identificou como dona dos equipamentos", destacou a pasta.
Todos os itens foram levados para o depósito municipal e poderão ser retirados pelo proprietário, mediante identificação e comprovação de compra. Segundo a pasta, até o momento já foram descaracterizados 32 prédios, com mais de 162 apartamentos.
A Secretaria Municipal de Educação disse que as 24 escolas localizadas na área da operação policial, na Maré, não abriram nos dias 19, 20 e 21 e nesta segunda-feira (26).
"Os conteúdos pedagógicos perdidos serão repostos. A secretaria avalia diariamente as condições de segurança para decidir sobre a abertura ou fechamento das escolas, seguindo o protocolo Acesso Mais Seguro, feito em parceria com o Comitê Internacional da Cruz Vermelha", acrescentou.
Já a Secretaria Municipal de Saúde do Rio confirmou que recebeu o ofício e disse que está envidando esforços "no intuito de atender o que é requerido".
Moradores protestam contra demolição
Na última sexta-feira (23), mais de mil pessoas ocuparam a Avenida Brigadeiro Trompowski com faixas pedindo paz e afirmando que os apartamentos demolidos são propriedades da população local, e não do tráfico. Segundo moradores, eles estão sendo despejados de suas casas. Na ocasião, os comércios locais ficaram fechados. Ao todo, o condomínio de luxo abriga 40 imóveis.
Devido as denúncias, no sábado (24), uma equipe da Secretaria de Habitação esteve na comunidade Parque União, na Maré, e cadastrou cerca de 40 unidades. Nos próximos dias será feita a análise dos cadastros feitos, verificando quais se enquadram no direito de receber o Auxilio Habitacional Temporário, sendo considerada inicialmente a lista da Associação de Moradores no primeiro dia de atuação da Seop na comunidade.
O que diz a Polícia Civil?
De acordo com investigações da Delegacia de Repressão a Entorpecentes (DRE), o Parque União vem sendo utilizado há anos, por meio da construção e abertura de empreendimentos, para lavar o capital acumulado com o comércio de drogas. Os agentes apuraram ainda a participação de funcionários de órgãos representativos da comunidade no esquema.
Os imóveis foram erguidos sem nenhuma autorização da prefeitura e não possuem responsável técnico pelas obras. Engenheiros da Prefeitura estimam prejuízo de R$ 30 milhões aos responsáveis pelas construções.
Segundo a Polícia Civil, as ações no Parque União revelam uma estratégia da facção criminosa de colocar ao menos uma pessoa em cada unidade habitacional para fingir que são moradores e dificultar as demolições. Ainda no início das operações, os agentes localizaram imóveis de luxo que eram usados por traficantes.
Dentre eles, duas coberturas, avaliadas em R$ 5 milhões, chamaram a atenção. Uma delas possuía dois andares, acabamento em mármore e porcelanato, além de uma grande área de lazer, com churrasqueira e uma piscina de 40 mil litros de água. O imóvel possuía vista privilegiada para a comunidade, para um campo de futebol e uma área onde eram realizadas festas.
Já a segunda era um quadriplex com acabamento de luxo, jacuzzi e closet, escadas com lâmpadas de led automático, além de uma piscina com cascata e churrasqueira. No térreo da unidade os agentes encontraram um quarto com dezenas de caixas de vinho e champanhe.
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