Thiago Marques Gonçalves, de 24 anos, ficou com diversos machucados pelo corpoAgência O Dia
'Piores dias da minha vida', desabafa motociclista preso injustamente após acusação de roubo
Thiago Marques Gonçalves, de 24 anos, participou do ato em homenagem a Igor Melo de Carvalho, baleado pelas costas por um PM da reserva
Rio - "Alívio e revolta". Após deixar o presídio em Benfica, na Zona Norte, o motociclista Thiago Marques Gonçalves, de 24 anos, assistiu às imagens do PM reformado Carlos Alberto de Jesus, que o acusou de roubo, deixando a 22ª DP (Penha) após prestar depoimento. "Alívio por ter conseguido sair dessa e de revolta por, quando cheguei em casa, ver a forma que o cidadão saiu da delegacia: rindo. Isso é revoltante, ele saiu rindo", desabafou Thiago ao DIA.
O motociclista e a mãe, Jaqueline Marques, compareceram, na tarde desta quarta-feira (26), em um ato organizado pela família do influenciador Igor Melo de Carvalho, que está internado no Hospital Estadual Getúlio Vargas, na Penha. O encontro foi marcado por choros e abraços longos entre os presentes.
Thiago e Igor se conheceram há três dias. No domingo (23), o influenciador saiu de uma casa de shows na Penha, onde trabalha como garçom, e solicitou uma viagem por aplicativo - atendida pelo motociclista. Cerca de dez minutos depois, os dois foram alvos de disparos por parte de Carlos Alberto, que alegou ter sido informado que os dois teriam roubado o celular da mulher, Josilene da Silva Souza. Igor foi atingido nas costas e perdeu o rim direito, enquanto Thiago teve queimaduras por ter pulado da moto no momento do ataque.
"Foi em uma distância de 5 a 10 minutos de onde busquei o Igor, no máximo. Eu percebi um carro vindo em alta velocidade pelo retrovisor e abri passagem para ele poder seguir caminho. Quando eu abri, ele parou do nosso lado e atirou. A gente se jogou no chão e tentou fugir. Estou bem machucado. Pulei da moto, então são todas queimaduras de asfalto. Pulamos da moto que deveria estar a 70 ou 60 Km por hora, não sei. Ainda pulamos de um viaduto. Se passar por ali, tem uns pedaços da minha moto", relatou.
A partir desse momento, Thiago passou a viver os "piores dias da vida", como descreveu. Enquanto Igor deu entrada sob custódia no Hospital Estadual Getúlio Vargas, o motociclista foi detido em flagrante por roubo e conduzido à 21ª DP (Bonsucesso). A Polícia Civil afirma que o jovem se recusou a prestar depoimento, mas ele nega que isso tenha acontecido. O rapaz relatou que Josilene disse ter o reconhecido como autor do roubo, enquanto ele implorava para que a mulher dissesse a verdade.
"Ela me acusou, falou que fui eu que botei a arma na cara dela. Que arma é essa que nunca apareceu? Nunca encostei nem em arma de paintball, não sei nem segurar. A atitude dos policiais foi de 'criminoso é criminoso'. Em nenhum momento, quiseram me ouvir. Não me escutaram, não me perguntaram nada. Só fui preso. Não dei meu depoimento. Só pude falar depois que saí da cadeia", desabafou.
Thiago, então, foi encaminhado a um presídio para aguardar a audiência de custódia. "São os piores dias da minha vida. Na minha concepção, todo mundo precisa pagar pelo que faz. Ali tem muita gente inocente, que não teve essa oportunidade de ser escutado que eu está tendo. Também tem muita gente que merece estar ali, pagando pelo que fez. Porém, ninguém merece passar pela forma que é lá dentro. Você está preso, já é um castigo, é horrível. Mas a forma que é lá dentro é surreal, nem animal merece passar por aquilo", contou.
O motociclista é o filho mais velho de Jaqueline, que tem outros três. Ao DIA, a mãe ressaltou que Thiago sempre gostou de trabalhar e passou a atuar como motociclista por aplicativo, com um veículo alugado, para sustentar os filhos após ter sido demitido de outro emprego.
"O Thiago não tem passagem pela polícia, antecedente criminal, não é usuário de droga… Ele trabalha desde novo, desde o momento em que conseguiu qualquer trabalho. Nunca se envolveu com coisa errada. É um filho mais velho que é exemplo para os outros, sempre foi de correr atrás. Ele trabalhava de carteira assinada e acabou sendo mandado embora, então arrumou esse aplicativo para sustentar os filhos. Ele tem dois, um casal. O Thiago sempre foi um menino incrível", elogiou.
A mãe contou que compartilha o sentimento de alívio, além de se sentir grata pelo apoio que recebeu em um momento tão difícil. Jaqueline ressaltou que foi abraçada pela família de Igor e, juntos, vão lutar por justiça.
"O momento é de alívio e gratidão às pessoas que seguraram a minha mão. Tenho muito que agradecer ao vereador Leonel de Esquerda (PT), que foi um dos primeiros a segurar minha mão, dar atenção. Foi um momento que eu estava sozinha, desesperada, sem saber o que fazer. Quando a família do Igor começou a me abraçar, eu falei: 'a gente vai conseguir, vai dar tudo certo'", disse.
A mãe também contou que a 'ficha caiu' no momento em que ela chegou com o filho em casa, após buscá-lo no presídio. "Foi horrível, mas agora é um sentimento de alívio, gratidão e justiça. A justiça foi feita até aqui, mas ainda tem muito a se fazer. Como mãe, ser humano, não podemos deixar isso impune. Assim como aconteceu com eles, pode acontecer com outras pessoas. Estou pedindo para que seja feita justiça pelos danos causados ao meu filho: o que ele passou dentro da prisão, os ferimentos, o psicológico… O objetivo era tirar meu filho da prisão, agora é focar na saúde do Igor e a outra parte da justiça que tem que ser feita", cobrou Jaqueline.
Já Thiago ainda pensa como poderia voltar a trabalhar, já que está com diversos machucados e a moto alugada ficou destruída. "Mas estamos aqui, firme e forte. Estamos aqui pela justiça", finalizou.
Na terça-feira, a Justiça do Rio mandou soltar Igor e Thiago. "Todas as informações indicam que tanto Carlos Alberto quanto Josilene teriam confundido os ora custodiados com os supostos autores do crime de roubo, de forma que os indícios de autoria restam totalmente esvaziados, impondo a imediata soltura dos custodiados", escreveu a magistrada na decisão.
PM muda a versão
O PM reformado Carlos Alberto de Jesus e a mulher, a cabeleireira Josilene da Silva Souza, alteraram a versão dos fatos na tarde desta terça-feira, em depoimento na 22ª DP (Penha). Inicialmente, o agente afirmou ter visto o influenciador do Botafogo, Igor Melo de Carvalho, armado na garupa da moto do motociclista Thiago Marques, o que o levou a atirar. Agora, ele afirma que Igor teria colocado a mão próxima à cintura e feito um movimento que sugeria estar armado.
Carlos Alberto acrescentou ainda que ordenou a parada dos dois homens, mas eles não obedeceram. Josilene também modificou trechos de seu depoimento e incluiu novas informações. Agora, ela recua da alegação de ter visto uma arma com os acusados e afirma apenas ter notado um volume na cintura de Igor, que acredita ser uma arma.
No primeiro depoimento, prestado na manhã de segunda-feira (24), Josilene afirmou ter visto um homem de blusa amarela armado, que teria apontado a pistola para o seu rosto, roubado seu celular e fugido em seguida.
Igor foi atingido pelas costas e levado para o Hospital Estadual Getúlio Vargas, na Penha, onde passou por uma cirurgia e perdeu o rim direito.
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