Ex-ministro da Justiça, Sergio Moro - AFP
Ex-ministro da Justiça, Sergio MoroAFP
Por Chico Alves
Desde que começaram as publicações dos vazamentos de conversas entre Sergio Moro e os procuradores da Lava Jato, obtidos pelo site The Intercept, o ex-juiz segue uma estratégia de defesa que é, no mínimo, controversa. Nas vezes em que esteve no Congresso ou pelas redes sociais, simplesmente evita as questões centrais de cada diálogo sobre o qual é perguntado. Repete essa prática hoje, ao se referir aos novos vazamentos publicados pela Folha de S. Paulo, nos quais integrantes da força-tarefa aparecem discutindo se seguiriam ou não as orientações do ex-juiz para formular o primeiro pedido de delação premiada de executivos de uma empreiteira, em 2015. "Tem que falar com ele (Moro) sob pena de ele dizer que ignoramos o que ele disse”, diz o procurador Deltan Dallagnol ao colega Carlos Fernando Santos Lima.

A revelação é grave porque a lei que define as regras para colaboração premiada determina que juízes devem se manter distantes desse tipo de negociação. Seu papel é verificar a legalidade dos acordos apenas após a assinatura. Os diálogos mostram que Santos Lima resistiu bastante à insistência de Dallagnol em seguir as orientações do então magistrado. "Isso até é contrário à boa-fé que entendo um negociador deve ter. E é bom lembrar que bons resultados para os advogados são importantes para que sejam trazidos novos colaboradores”, diz ele a certa altura.

Para rebater a interpretação de que fez parceria com a acusação, Moro foi ao Twitter nessa manhã para argumentar: "O juiz tem não só o poder, mas o dever legal de não homologar ou de exigir mudanças em acordos de colaboração excessivamente generosos com criminosos", escreveu. O que o ministro da Justiça não disse (mas sabe muito bem) é que a exigência de mudanças deve ser feita após o fechamento do acordo, como determina a lei citada acima. O que se viu nos vazamentos publicados hoje foi a participação de Moro na produção do acordo que ele próprio iria avaliar depois.

Em outras oportunidades, sobre matérias divulgadas pelo The Intercept, Moro já havia usado a mesma tática de se defender fugindo da questão central. "Todo juiz conversa com as partes", disse semanas atrás. "Isso é verdade, mas fala como?", questiona o jurista Walter Maierovitch. "A parte vai lá com uma petição e despacha num fórum, na sala de audiência, em locais públicos. Agora, falar com as partes por redes privadas é outra coisa". Além disso, os diálogos de Moro com Dallagnol não são banais, nada como um "bom dia" ou "qual a data da audiência?". Comprovariam a parceria entre juiz e acusação, algo completamente ilegal.

Sobre outro vazamento, publicado pela revista Veja, em que o ex-juiz teria alertado os procuradores para melhorar a argumentação antes que fosse apresentada oficialmente, rebateu dizendo que o réu foi inocentado daquela acusação. “O fato de ele ter absolvido não significa que cumpriu o devido processo legal. Se isso for verdade, não cumpriu”, avalia Maierovitch. (Veja aqui)

Para uma parte da opinião pública, Moro é um herói que está sendo atacado por combater a corrupção, com o único objetivo de manter impunes os políticos e empresários que teriam enchido os bolsos com dinheiro do povo. Para estes, a estratégia do ex-juiz é satisfatória. Para quem analisa a questão tecnicamente, porém, a tática não é boa. Se ficar apenas no jogo de palavras, a decisão vai depender cada vez menos da autodefesa de Moro e cada vez mais de a perícia confirmar se as conversas nos vazamentos são verdadeiras ou não. Se forem reais, será preciso bem mais que as explicações dadas até agora.