Imagem de Erika Wittlieb por Pixabay - Divulgação
Imagem de Erika Wittlieb por PixabayDivulgação
Por Priscila Correia
Já ouviu falar em estresse tóxico infantil? A situação acontece quando há estresse elevado e contínuo, que pode gerar danos irreversíveis ao desenvolvimento neuropsicomotor de uma criança. “A evolução do indivíduo depende da genética e do ambiente que o cerca. Durante a pandemia, esse ambiente tende a se tornar inapropriado para o crescimento adequado de uma criança, que está em intenso desenvolvimento cerebral”, explica a pediatra Andressa Tannure, membro da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) e especialista em Suporte de Vida em Pediatria pelo Instituto Sírio-Libanês e pelo HCOR.
Com o prolongamento do isolamento social, a procura por atendimentos nos prontos-socorros infantis tem aumentado para casos de dores no peito, abdominais, cefaleia e crises de ansiedade, sintomas, estes, que estão relacionados às manifestações do quadro. “Se a criança não encontra, no seu ambiente, os recursos de adaptação suficientes para vivenciar uma situação nova, o estresse se torna nocivo”, explica a pediatra Vivian Oliveira, do Hospital São Camilo. Além disso, novos comportamentos podem ser sinal de alerta, como o aumento do choro, dificuldades para dormir, alterações do apetite, regressão no desenvolvimento (uma criança que já havia realizado o desfralde volta a fazer xixi na cama), entre outros, evoluindo para quadros mais intensos de hiperatividade, agressividade, personalidade introspectiva, sentimento de incompetência e déficit de atenção.
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Excesso de gadgets
Em momentos como esse, voltar as atenções para dispositivos eletrônicos não é um “privilégio” apenas de adultos. As crianças, de variadas idades, também têm ficado atentas às telas. A médica Flávia Oliveira, membro da Sociedade Brasileira de Pediatra, ressalta que o estresse tóxico causado pelo número elevado de horas frente às telas, o que tem sido ainda mais comum com o isolamento, pode gerar alterações permanentes na arquitetura cerebral das crianças. "A formação cerebral termina por volta dos 20 anos de idade, sendo muito vulnerável às experiências adversas", esclarece.
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Já Aline Sabino, psiquiatra do Hospital São Camilo, pontua que o maior desafio para as famílias, em tempos de pandemia, tem sido encontrar meios de estabelecer uma rotina saudável no contexto atual. “Percebemos, por exemplo, que as crianças ficaram mais expostas aos dispositivos tecnológicos de telas e mídias, o que pode gerar uma série de problemas secundários à saúde dos pequenos”, complementa. Entretanto, diante da realidade atual, que requer medidas de adaptação, estabelecer limites saudáveis em relação ao uso das tecnologias pode ser mais difícil do que seria normalmente. “É preciso reforçar a importância desse cuidado, já que, usadas de forma inadequada e abusiva, as tecnologias podem ocupar o espaço de atividades importantes para o desenvolvimento infantil, como a interação face a face, o tempo familiar de qualidade, brincadeiras ao ar livre, exercícios físicos e, até mesmo, tempo de inatividade e ócio criativo”, enfatiza a psiquiatra.
E mais: é importante lembrar, também, que passar muito tempo utilizando eletrônicos eleva os riscos do sedentarismo e, consequentemente, de obesidade, bem como pode potencializar atrasos no desenvolvimento cognitivo e alterações sociais, com redução da interação direta entre a criança e seus familiares e/ou cuidadores.
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Quais as consequências?
Quando a criança é exposta ao estresse tóxico, toda a sua estrutura cerebral é afetada, provocando disfunção no sistema neurológico e endocrinológico. “Essas alterações se refletem na vida adulta, com o desencadeamento de doenças crônicas, como hipertensão arterial sistêmica, diabetes melitos, doenças pulmonares, distúrbios neuropsiquiátricos e comportamentais (como depressão ou transtorno de ansiedade generalizada) e maior risco à dependência química”, explica Tannure.
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Como lidar com os sintomas?
A psiquiatra do Hospital São Camilo destaca que a mudança drástica na rotina e, em muitos casos, o impacto econômico decorrente da pandemia afetaram a saúde mental de todos, deixando a criança mais vulnerável. A falta da escola, do convívio com amigos, as brincadeiras coletivas, tudo isso foi suspenso sem uma data definitiva para terminar. “Até mesmo os mais velhos, que são capazes de entender melhor o que acontece no mundo, sentem que suas vidas foram diretamente impactadas”, afirma a psiquiatra, destacando a importância da socialização para o desenvolvimento saudável das crianças.
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Sinais de alerta
Segundo o pediatra Mário Ferreira Carpi, intensivista em Pediatria e coordenador do Pronto-socorro Infantil do Hospital Águas Claras, os pais precisam ficar atentos aos sinais e buscar, sempre que possível, atitudes de acolhimento, proteção e amor.
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Abaixo, ele destaca alguns dos principais sinais de alerta:
1. Conversar: ouvir, sem julgar;
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2. Aceitar: o problema existe, não pode ser negado. Lide com ele com cuidado, mas também com coragem e resiliência;
3. Conversar sobre a situação atual com linguagem simples e adequada a cada idade. As informações devem ser transmitidas de forma tranquila para evitar elevação do estresse;
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4. Acolher o medo e incentivar atitudes positivas;
5. Incentivar práticas altruístas, como doação de brinquedos, roupas, livros, computadores;
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6. Diminuir as cobranças. É hora de praticar a empatia;
7. Reinventar rotinas com atividades que envolvam toda a família: tirar um horário no dia para fazer algo juntos como jogos, brincadeiras, leitura;
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8. Estabelecer prioridades quanto aos afazeres domésticos, incluindo as atividades escolares. Rotina é importante para a criança;
9. Promover encontros online com os amigos para diversão e entretenimento;
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10. Fazer uma caminhada ou dar uma volta de bicicleta, respeitando o protocolo de segurança e os melhores horários do sol;
11. Educar as crianças e adolescentes quanto à importância do distanciamento social, uso de máscaras (para crianças maiores, adolescentes e adultos) e higiene das mãos. Respeitando esses cuidados, não é preciso ficar trancado dentro de casa;
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12. Explicar que há esperança, que vai passar.