O ex-lateral-esquerdo Filipe Luís se mostrou ativo à beira do campo Gilvan de Souza / Flamengo

Rio - Ídolo do Flamengo, Filipe Luís vem enfrentando o desafios ao longo dos últimos meses como treinador do time sub-17. Em entrevista ao "ge", o ex-lateral detalhou como tem sido o novo desafio e explicou a rotina na nova função desde que pendurou as chuteiras, no fim de 2023.
"Posso dizer que é uma chuva de emoções tudo o que eu vivi desde o ano passado até agora. A profissão de treinador é mais divertida, digamos assim. Você se diverte mais quando vê as coisas que faz com o resultado acontecendo, mas também a derrota é muito mais dolorosa, mais solitária. O desafio é muito grande, a responsabilidade é muito grande. Estou completamente apaixonado por essa profissão. E cada dia estou mais viciado em trabalhar, em melhorar e continuar evoluindo", declarou o agora técnico.
"O trabalho do treinador, e eu já falei com vários desde que comecei a carreira, é infinito. Não acaba nunca. Se você quiser, pode continuar e cada vez vai assistir mais jogos, mais coisas novas... Muitas vezes me pego com o laptop na cama 22h, 23h30 para ver só mais uma jogada. Ou acordo 4h da manhã porque lembrei de alguma coisa com uma ideia nova e anotei no celular. Ou para mandar mensagem para algum companheiro para lembrar de um sistema que jogava contra... Isso é principalmente ainda por falta de organização do tempo. Sou novo nisso, estou me adaptando, me organizando e tende a melhorar. Conforme a comissão passar a ter mais clara a ideia para se organizar, em um clube profissional com seis analistas trabalhando, tudo fica mais fácil", completou.
Apesar da aposentadoria recente, Filipe garante que não teve dificuldades na virada de chave. Segundo o ídolo rubro-negro, no fim de sua carreira como jogador ele já tinha alguns pensamentos de treinador.
"Por sorte, eu já pensava como treinador muitos e muitos anos atrás. Enquanto ainda jogava. Já pensava em coisas que eu queria, ideias que eu gostava, coisas que queria passar para os meus jogadores e anotava tudo. Quando fui chegando na reta final da minha carreira, tinha essa dúvida sobre começar como auxiliar, começar como treinador da base, começar como treinador no profissional... E eu fui vendo cada vez mais, falando com mais gente, e pensei que se eu começasse como auxiliar ia ser muito difícil. Eu tenho uma ideia tão forte do meu modelo de jogo, que seria difícil me adaptar para outra ideia de outro treinador", afirmou o ex-camisa 16.
"Eu pensei em começar a carreira solo e não estava preparado para começar no profissional. Ninguém está. Nunca fui treinador na minha vida. Por mais que a gente ache que sabe, são muitas responsabilidades e decisões que temos que tomar que não estão no nosso controle. Eu pensava em começar em uma categoria mais perto do profissional, mas o Flamengo me deu a oportunidade de começar no sub-17 e não pensei duas vezes", seguiu.
Por pouco, Filipe Luís não iniciou sua carreira fora dos gramados na seleção brasileira. O ex-jogador garante que não foi fácil recusar o convite feito pela CBF, no início deste ano, para ser coordenador técnico, mas sua vontade em estar perto do campo falou mais alto.
"O presidente Ednaldo me ligou, conversou comigo sobre a possibilidade. Primeiramente, a seleção brasileira ligar e você dizer não é difícil. Mas eu tenho tão claro que quero ser treinador, que seria desviar do meu caminho, fazer uma curva. Primeiro, por ser totalmente inexperiente para o cargo, há muito melhores do que eu para essa função e que vão ajudar mais. E segundo porque eu egoistamente quero começar essa carreira como treinador. Deixei a porta aberta caso ele quisesse algum cargo no campo, mas para esta função eu preferi não aceitar. Por mais que financeiramente, status, e tudo mais, seria melhor ir para lá, meu coração quer estar no campo. Não me arrependo", garantiu Filipe.
Veja outras respostas:

Dificuldades como treinador

"No começo, tive dificuldade de me posicionar de uma forma para ver tudo o que eu queria ver no jogo. Como jogador, eu me posicionava na lateral esquerda e ali, jogando, eu via tudo. Via se o zagueiro fechava, se o cara estava se posicionando certo, o ponta direita... E me peguei na primeira semana ao lado do campo e não estava vendo nada. Tive a ajuda da comissão, que foi me guiando, guiando a equipe e fui aprendendo onde me posicionar nos treinos para dar os feedbacks necessários."

Evolução do futebol brasileiro

"A mudança vem devagar, mas vem. No meu caso, vou fazer de tudo o que estiver ao meu alcance para mudar esses problemas. Por exemplo, temos um jogo 11h da manhã, 38 graus, grama muito alta... Não é a melhor forma sair jogando. O certo para ganhar jogo é chutão, brigar pela segunda bola e parar perto do gol adversário. Mas não é o melhor para os meninos. Pela minha parte, eu vou fazer o que é melhor para eles e não ganhar a qualquer custo. E tenho encontrado treinadores que gostam e fazem a mesma coisa. A gente está fazendo a nossa parte. Claro que há treinadores que vão mandar dar porrada, perder tempo, enganar... É claro que isso existe no futebol, mas não de mim."

Arbitragem

"Eu, particularmente, gosto da arbitragem brasileira. É a arbitragem mais pressionada do mundo. Os programas de televisão analisam mais a fundo o desempenho do árbitro do que taticamente uma equipe. Isso me chama muito a atenção. Existem árbitros aqui de altíssimo nível. Não todos, obviamente, mas gosto muito da evolução que eles têm tido durante os jogos, têm deixado correr mais."

Saúde mental no futebol

"Falam: "Podem me vaiar, mas me dá a bola que eu vou jogar igual". Há outros que sentem mais. Mas onde se cresce muito (a pressão) é muitas vezes algo interno, uma pressão que eles mesmo colocam. É uma linha fina e muitas vezes exagerada. Por exemplo, o Andreas errou, o Flamengo perdeu uma final de Libertadores, mas ele jogou muito. Ele errou um gol, mas o time perdeu aquela final, não foi ele. A cobrança foi toda nele. Eu quase não sinto cobrança em mim, e eu saí daquele jogo machucado sem fazer quase nada. Tive cobrança? Tive, mas não como o Andreas. E ele foi muito forte mentalmente para superar, mas não deve ter sido fácil. Aí está o perigo, quando é algo exagerado, injusto, com memes e tudo mais. Mas por seleção natural normalmente o jogador já passou por tantas coisas que chega com uma cicatriz grande para ser jogador."

Treinador no profissional do Flamengo?

"Nas duas primeiras semanas dei graças a Deus por começar na base, onde eu posso tomar minhas decisões, posso errar e fazer tudo o que o clube me respaldar. Esse é o primeiro passo. A partir daí, o que surgir só Deus sabe. Eu vou estar nesse caminho de preparação para um dia estar no profissional seja do Flamengo, do Inter, do Cruzeiro, sei lá... Onde for poder desempenhar o meu principal objetivo, que é ser campeão."