O presidente russo, Vladimir Putin, assinou, nesta sexta-feira, 30, a anexação de quatro regiões da Ucrânia à Rússia em uma cerimônia no Kremlin na presença dos líderes pró-russos desses territórios controlados total ou parcialmente por Moscou. O movimento intensifica a guerra que já perdura há sete meses e dá início a uma nova fase imprevisível do confronto.
Os quatro líderes e Putin assinaram os documentos de anexação diante de um público composto por membros do governo, deputados, senadores e outros participantes da elite política, antes de se darem as mãos e gritarem "Rússia!", junto com os demais presentes.
Com a anexação, que corresponde à maior apropriação de parte de um país por outro desde a 2ª Guerra, Putin abre caminho para manobras militares mais intensas no conflito do Leste Europeu sob a justificativa de defesa do território russo — o que autoriza o uso de armas nucleares, segundo a doutrina atômica russa.
O presidente russo afirmou que o reconhecimento das regiões por Moscou é irreversível e que os habitantes delas se tornaram cidadãos russos "para sempre", prometendo utilizar "de todos os meios para proteger a integridade territorial russa''. "Nós vamos proteger nossa terra com todos os meios que tivermos para prover uma vida segura para o nosso povo. Essa é uma grande missão de libertação do nosso povo", acrescentou.
Mas para Putin, a incorporação desses territórios significa a união da pátria: "As pessoas foram separadas de sua pátria quando a União Soviética se rompeu”, afirmou Putin. “A Rússia não busca trazer a União Soviética de volta”, completou.
Com a anexação foram incorporados a Rússia as regiões de Donetsk, Luhansk, Kherson e Zaporizhzia no sul — cerca de 15% do território da Ucrânia. A Rússia anexou em 2014 a península da Crimeia (sul), o que também não foi reconhecido pela comunidade internacional.
Rejeição
Em um comunicado divulgado pelo Conselho Europeu, líderes dos 27 países da União Europeia rejeitaram e condenaram "de forma inequívoca" a "anexação ilegal", que consideram uma "violação flagrante" dos direitos da Ucrânia. "Não reconhecemos e nunca reconheceremos os referendos ilegais que a Rússia criou como pretexto para esta nova violação da independência, soberania e integridade territorial da Ucrânia", diz o texto. O comunicado também afirma que "as ameaças nucleares formuladas pelo Kremlin (...) não quebrarão nossa determinação" de apoiar a Ucrânia.
Putin também fez referências ao Ocidente em seu discurso, e afirmou que as elites desse grupo de países são "o inimigo" que está tentando destruir a Rússia. Eles "querem nos ver como uma colônia", disse Putin. "É extremamente importante para eles que todos os países desistam de sua soberania em favor dos Estados Unidos", acrescentou.
Pouco antes da cerimônia, o porta-voz do Kremlin, Dmitri Peskov, afirmou que a Rússia ainda precisa "esclarecer" se vai anexar a totalidade das regiões ucranianas de Kherson e Zaporizhzhia ou apenas as partes que ocupam. Segundo o ISW (sigla em inglês para Instituto para o Estudo da Guerra), a Rússia controla 72% da região de Zaporizhzhia e 88% de Kherson.
As regiões de Donetsk e Luhansk foram anexadas em sua totalidade, depois que Moscou reconheceu a soberania dos regimes separatistas pró-Rússia em fevereiro, pouco antes da ofensiva na Ucrânia. Somadas, as províncias reivindicadas pela Rússia correspondem a 15% do território ucraniano, com uma área comparável ao tamanho de Portugal e ao Estado de Santa Catarina
O reconhecimento da anexação já havia sido anunciado na quinta-feira, 29, mas não impediu que a Rússia continuasse os bombardeios no campo de batalha. Autoridades ucranianas denunciaram que um ataque russo com 16 mísseis realizado entre a noite de quinta e a manhã desta sexta deixou ao menos 23 mortos em Zaporizhzhia — incluindo pessoas de um comboio humanitário que prestava atendimento a um grupo que se dirigia para um território ocupado pela Rússia para resgatar parentes na região.
No discurso desta sexta-feira, em contrapartida, Putin pediu ao "regime de Kiev" que "cessasse imediatamente os disparos, todas as hostilidades e voltasse às mesas de negociação".
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