Por adriano.araujo

Rio - A história de Dona Terezinha Maria de Jesus, 40 anos, não é muito diferente da de outras Marias. Aos 11 anos já trabalhava em “casa de família”, cuidando de crianças e da casa. Aos 15, teve seu primeiro filho e aos 18 migrou para Brasília, para tentar a vida, deixando o menino com a sua mãe em Correntes, no interior do Piauí. Até o dia em que uma bala de fuzil atravessou o peito do caçula Eduardo de Jesus, de 10 anos, ela acreditava na Justiça. Desde então, sua vida mudou, pois a bala não tirou só a vida do menino: levou seu marido, sua casa e sua vida.

ODIA: Como aconteceu a tragédia?

TEREZINHA: Meu filho assistia TV quando ouviu a voz da irmã e falou: “Mãe, Patrícia chegou.” Ele continuou no quarto e eu, na sala. Quando deu o intervalo ele saiu e sentou na escada, esperando ela. Aí escutei o estouro, mas antes ouvi ele falando: “Mãe!” Tenho certeza que meu filho se levantou para entrar dentro de casa e o policial atirou nele. Quando corri para fora me deparei com aquela cena horrível, comecei a gritar desesperada, pedindo socorro ao pedreiro que estava na minha varanda. Ele só disse assim: “Seu filho não tem mais vida.”

Terezinha Maria de Jesus%2C mãe do menino Eduardo%2C morto no AlemãoJoão Laet / Agência O Dia

Então o pedreiro viu o policial?

Se ele tivesse falado na Delegacia de Homicídios que viu, isso já teria acabado. Lá no Complexo (do Alemão) ele fala para todo mundo que sabe quem foi o policial que matou meu filho. O filho dele foi o primeiro a gravar a tragédia. Ele gritava “covarde”, e o pedreiro apontava: “Foi aquele ali.” Não sei se está ameaçado, sei que ele disse que não é justo perder suas três casas para ajudar os outros. Se ele falar lá ele poderia ser ameaçado e ter de sair, igual a mim.

A senhora deixou sua casa porque foi ameaçada?

Sim, porque no dia da tragédia minha filha tentou arrancar a máscara de um dos policiais, e ele falou: “Pode aguardar que a gente volta.” Isso numa quinta-feira. No sábado, de noite, eles voltaram perguntando onde estava a “família do garoto.” Ninguém respondeu. Desde a tragédia a gente já não estava mais em casa. Só voltamos no dia da reconstituição, e para a gravação de um programa de TV. Pegamos uma mala de roupa e depois uma amiga embalou as coisas e levou onde eu estava.

Se a senhora ver o policial que matou seu filho, pode reconhecê-lo?

Reconheço. Ainda não fizeram acareamento entre nós, mas está em andamento. No dia, ele pôs o fuzil na minha testa e disse: “Assim como matei seu filho, posso matar você.” Foi ele. Coração de mãe não se engana. Eu disse: “Você pode me matar então, porque já tirou um pedaço de mim.” Aí um outro policial falou com ele. “Não faça esta besteira.”
Não acha que está demorando demais?

Espero que seja o mais rápido possível. Mas eu creio primeiramente em Deus, que tudo vai dar certo, e que o Dr. Rivaldo (Barbosa, titular da Delegacia de Homicídios) cumpra o que prometeu. Ele garantiu que vai botar este assassino atrás das grades. O Dr. Rivaldo acha que não foi este homem, mas eu tenho certeza.

O que a mantém de pé?

Primeiro de tudo eu acredito na Justiça divina. Deus sempre fez as coisas bem feitas. Uma hora vai chegar a vez dele. A Justiça humana pode até falhar, mas a de Deus nunca. Quem planta aqui, colhe aqui. Deus já está preparando o tribunal para ele. Ele vai pagar.

A senhora é evangélica?

Não, sou católica. Organizava todo ano excursão a Aparecida, e o Eduardo sempre ia. Ele era um menino maravilhoso, bondoso, carinhoso, muito responsável. Eu luto por Justiça.

Uma versão diz que o policial errou e confundiu o celular com uma pistola. Acha isso possível?

Não. Ele atirou porque é um covarde. Ele viu que era uma criança sentada, era 5h30 da tarde, não estava escuro, não tinha troca de tiro. Por que chegou e atirou? Se viu alguma coisa estranha, por que não abordou ele? Meu filho estava com um celular na mão e ele disse que era uma pistola. E ainda tentaram desfazer a cena do crime. Um policial disse: “Vamos pôr uma arma perto dele.” Disse a ele que se a arma estivesse com bala, eu pegaria e atiraria nele. Depois tentaram tirar o corpo, mas o povo foi chegando e não deixou. Tentaram até impedir a imprensa de entrar lá.

A senhora acredita que existem chances de se confundir um celular com uma pistola?

Não. O celular de meu filho era pequeno e branco. Branco! Um smartphone LG. Como ia confundir com uma pistola? Dudu ia começar a estudar inglês na Tijuca. Estava até matriculado.

A senhora acredita na Justiça?

A Justiça no Brasil só vale para três ‘Ps’: preto, pobre e prostituta.

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