Por thiago.antunes

Rio - Rendeu boa discussão o artigo publicado aqui, semana passada, tratando de ‘Os miseráveis’, do Victor Hugo. Embora lançado em 1862, o livrão parece ter sido escrito para nós, que temos tudo para nos ver retratados nesse que é um dos romances mais importantes da história da literatura.

Alguns leitores me escreveram dizendo que essa identificação mostra que ainda estamos vivendo no século 19 (e retroagindo para a Idade Média). Um deles sugeriu que, para a gente sair desse atraso, está na hora de adotar um instrumento comum na França daquela época: a guilhotina. Será? Sou pacifista até demais, mas já nem sei.

Enquanto penso nisso, vou sugerir aqui um passeio a Paraty, onde rola, até domingo, a já tradicional festa literária (Flip). O autor homenageado, este ano, é Lima Barreto (1881-1922). Já recomendei a biografia desse meu herói pobre, negro, doente e, sem dúvida, um dos escritores mais críticos da nossa sociedade elitista, racista, perdida. Assinada pela Lilia Moritz Schwarcz, a biografia é leitura obrigatória — sem falar, claro, de toda a obra do Lima, que está sendo reeditada aos pouquinhos.

Mais do que isso, as mesas-redondas da Flip prometem ampliar a discussão sobre preconceito, intolerância e ignorância. Gostaria de estar lá para conhecer, por exemplo, a Conceição Evaristo, doutora em Literatura Comparada que tem sua obra ficcional reconhecida por diversos prêmios e edições em outros países.

Seus romances curtos mostram o quanto ainda é difícil livrar-se do peso da pobreza e viver com dignidade nesta sociedade que não melhorou nem um tiquinho desde que Lima Barreto morreu. Aliás, não seria exagero dizer que Conceição Evaristo continua (ou atualiza) a obra dele, uma bela responsabilidade que ela tira de letra. Para conferir, sugiro seus ‘Becos da memória’ e, principalmente, ‘Ponciá Vicêncio’. Lima Barreto aplaudiria.

Fica a dica de passeio para o fim de semana. Além de presenciar escritores exercitando sua vaidade em estado bruto, você encontra em Paraty uma programação que enriquece os bons leitores. Esse é seu grande mérito.

As mesas-redondas geralmente são conversas de compadre, é verdade. São muito raras as divergências dignas de registro — todos os participantes vivem, afinal, no lado bom da força. Mas não deixa de ser uma experiência válida.

E outra dica: quem for lá poderá acompanhar a transmissão simultânea dos debates na Casa Sky, que também vai oferecer cafeteria, carregadores de celulares e atividades infantis (o que é uma tremenda mão na roda).

Nelson Vasconcelos é jornalista

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