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Por Gabriel Chalita professor e escritor

Dia desses, fui a um café com uma amiga. Sentamos numa mesa e, ao lado, duas senhoras conversavam. Falavam sem a menor preocupação em compartilhar a história com todas as mesas ao redor. Minha amiga olhou-me com estranhamento e, em um tom comedido, disse: "Por que falam tão alto?". E as gargalhadas também eram sem economias. E chamavam o garçom com um grito de "Oi" Alto.

As pessoas das outras mesas paravam de falar e olhavam para tentar compreender. Uma criança berrava reclamando de alguma coisa em uma mesa não tão distante. Os pais, entretidos com seus celulares, pareciam não se incomodar. Eu olhava um pouco indignado. Desperdício. Por que não contavam histórias aqueles pais? Por que não mediam o crescer cotidiano dos filhos? Não. Estavam em outro mundo.

A música não estava tão baixa. E, de repente, uma das senhoras das palavras altas gesticulou além do normal e derrubou a bandeja do garçom que vinha trazendo algumas xícaras de café, pães, sucos e água. O barulho roubou novamente a atenção dos que ali estavam.

Meus pensamentos buscavam por liberdade. Minha amiga, geralmente vagarosa para comer, deu-se rapidamente por satisfeita. Ir embora era um convite que nos parecia irrecusável. Pagamos a conta e saímos. 

Era um domingo. O sol aquecia o chão entre árvores centenárias naquela rua. Fomos andando e deixando para trás o barulho. Comentamos alguma coisa, brevemente, sobre a história que aquelas duas contavam. Não havia como não ouvir. E, depois disso, o silêncio.

Ficamos andando por algum tempo observando o lindo dia. Em silêncio. Aos domingos, a cidade tem menos carros nas ruas. Não havia buzina. Não havia gritos nem ditos em tom incorreto. Havia o silêncio. Interrompemos um pouco para comentar um som mavioso de um pássaro que não conseguimos identificar. E, novamente, o silêncio. Depois de algum tempo, sem determinarmos o quanto, voltamos às conversas. Conversar é bom. 

Cheguei em casa remexendo nas minhas impressões para compreender a beleza do silêncio. O barulho havia sido tanto que, sem percebermos ou combinarmos, ficamos em silêncio. Pensei nos outros barulhos. Nas palavras ditas em momentos incorretos. Nas opiniões cheias de barulho. Nos gritos arrogantes de superioridade. Nas ameaças. Nos ódios espalhados. Nas vinganças. Tudo muito pouco silencioso. 

Voltei-me para minha infância no interior. No acordar preguiçoso com o barulho dos bichos. No som das cachoeiras. No pensar sem pressa. Lembrei-me de um almoço na casa de uma amiga escritora. Quando terminamos, sentados em velhas poltronas, ela, de olhos fechados, convidou-me a ouvir o barulho de chuva. Repetiu quase que em êxtase: "Barulho de chuva". Fiquei à época imaginando a sua imaginação. Quantas lembranças habitavam a velha escritora em dias de chuva.

Mas era um domingo ensolarado quando, depois de tudo, sentei-me para ler, silenciosamente, um romance.  Quando percebi, em silêncio, o sol se despedia. Era um espetáculo digno de aplausos. Ah, aí está um barulho que nos faz bem!

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