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Por Gabriel Chalita Professor e escritor

Eram irmãos que estavam em uma fila recebendo alimento. Os dois eram bem pequenos, talvez com uma diferença de dois ou três anos. Não sei muito bem. Um estava com a perna machucada, o menor. O outro, por volta dos 7 anos, estava na fila.

O calor do dia não veio naquele dia. E o frio fazia com que a espera fosse mais incômoda. Voluntários se juntavam na tarefa de alimentar os que alimento não têm. Tudo muito organizado.

A vida nas ruas é dura. Há muitos que julgam sem conhecer. Ninguém opta por deixar o lar e viver nas calçadas. Lembro-me de uma cena de um casal que vivia há pouco tempo na rua. Lembro-me dele dizendo que não aceitava ir para um albergue para passar a noite porque não havia albergue misto, e a ideia de dormir sem sua mulher era inconcebível. "Minha mulher é a mulher mais linda do mundo", disse aquele homem. A mulher ria, tentando esconder a timidez. E, depois de alguma conversa, quando a mulher foi sentar-se na calçada, ele, elegantemente, tirou um lenço do bolso e forrou o chão onde o seu amor iria se sentar. Romantismos difíceis de se encontrar mesmo em casas onde abundam recursos e sofisticações.

Já vi afetos entre moradores de rua e seus animais de estimação. Bem, mas é sobre os dois irmãos que se tem de escrever.

O pequeno, um pouco maior, chegou para pegar o alimento. Cada um tinha direito ao seu. Ele compreendeu e não tentou pegar para dois. Pediu apenas mais um prato para dividir. A senhora olhou e quis saber. Ele mostrou o irmão sentado, com a perna machucada. "É meu irmão", disse com um dizer orgulhoso, com um dizer cuidadoso. A senhora deu o prato e ficou observando. Ele chegou junto ao irmão e dividiu exatamente tudo o que havia no seu prato. A metade do frango. A metade da porção de arroz. Duas batatas para cada um. A metade da salada. O pão que veio junto, também foi dividido.

O irmão menor sorria agradecido. Sentaram-se juntos e começaram a comer. Havia também o suco. Ele se esqueceu de pedir dois copos. Deu para que o irmão tomasse primeiro a metade e, depois, ele tomaria o restante. A senhora, que servia a refeição, olhou comovida a cena. Levou mais comida para os dois. Conversou com eles. Quis entender a razão de estarem ali. Perguntou pelos pais. A história era mais triste do que ela imaginava.

Perderam tudo, mas tinham um ao outro. A senhora que servia, dona Regina, não conseguiu ir embora sem um gesto maior. "Querem dormir essa noite na minha casa?". E eles, timidamente, disseram que não precisava. Ela insistiu. Disse que queria ir com eles às autoridades responsáveis. Que cuidaria deles. Não sabia como ainda. Mas cuidaria deles.

Os dois irmãos ouviam a mulher com os braços abraçados.

Ela ainda teve tempo para perguntar a eles: "Quem os ensinou a dividir?". O pequeno maior olhou para uma estrela no céu e, como se mostrasse a mãe: "Porque é lá que vão os que sabem cuidar", explicou.

Mesmo que muito não tenha sido dito, Dona Regina entendeu.

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