Luís Pimentel, colunista do DIA - Divulgação
Luís Pimentel, colunista do DIADivulgação
Por Luís Pimentel Jornalista e escritor

Rio - O vice é um tipo curioso (para ser gentil), talvez até intrigante (em caso bem recente, a intriga sempre foi mesmo o prato preferido). No futebol, costuma ser comparado ao prosaico nadador que atravessa o oceano para morrer na praia, depois de alcançado, ultrapassado, sacaneado e afogado pelo campeão; no governo, especialmente o federal, é aquele personagem que costuma atravessar o mandato engolindo sapo salgado, nadando de um lado pro outro sem vislumbrar horizonte.

Os fortes, discretos e equilibrados (Itamar Franco, Marco Maciel e José Alencar entre eles) fizeram a travessia à sombra do titular (o presidente), embora ao seu lado para o que fosse preciso. Outros preferiram caminhar dois passos atrás, sempre prontos para dar a rasteira. Às vezes se fingem de mortos, por conveniência, e ressuscitam por oportunismo.

Alguns vice-presidentes se esforçam para ficarem longe dos holofotes. Um belo dia responsabilidade e faixa presidencial lhe caem no colo (como foi o caso de Itamar); outros conspiram para conquistar, no tapetão, o título que jamais lhe pertenceu. O primeiro, apesar do susto ("Uai, sô! Eu tava quieto, pescando lá em Juiz de Fora..."), mostrou que era do ramo e conseguiu fazer história, elegendo brilhantemente o sucessor.

Quanto ao segundo, nem o futuro dirá, pois futuro tem mais o que fazer.

Apesar do pouco caso que se faz do vice, tem sido árdua a luta dos atuais candidatos à Presidência da República para encontrar um candidato à função. Os possíveis lembrados em potencial são mais cortejados que noiva rica. Por que será? O meu palpite é que o cargo ficou mal visto, muito mal falado, depois dos recentes acontecimentos políticos.

Em 2002 ajudei a entrevistar, para 'Opasquim21', aquele que é o meu ídolo no time dos vice-presidentes, José Alencar (é exatamente o filho dele, Josué, que está hoje no papel de objeto do desejo de quase todos os presidenciáveis). O homem que estudara apenas até o primeiro ano ginasial (mais do que o seu presidente, Luiz Inácio), via o mundo, o Brasil e os brasileiros com um olhar capaz de desorganizar a física quântica. Fora o senador mais votado na história de Minas e, diante da pergunta de porque se achava capaz de ser o vice de Lula, deu essa resposta:

"Posso contribuir muito com o país, pois não tenho nenhuma necessidade material a ser atingida. Precisamos ter a política no próprio coração. E na alma. É preciso ter certeza de que a política é o que há de mais importante para a vida de uma nação, desde que seja exercida com amor e honestidade. Quando se fala em política, se fala em responsabilidade. Responsabilidade social."

Esse soube dignificar o cargo que ocupou, jamais fez intriga ou política de esombros. Foi exemplo de trabalho e de honradez até o último momento quando, debilitado pelo câncer, respondeu assim à pergunta sobre se tinha medo da morte:

"De jeito nenhum. Só tenho medo da desonra".

Luís Pimentel é jornalista e escritor

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