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Por O Dia

Rio - Aqui na Zona Oeste do Rio, assim como nos subúrbios em geral, há pouquíssimas livrarias. Como boa parte das minhas obras fala exatamente sobre a história desta região, muita gente me pergunta como faço para distribuir meus livros por esta imensa área da cidade tão carente não só de livrarias, mas também de bibliotecas, museus e centros culturais.

A solução que encontrei foi simples: distribuir os livros em qualquer estabelecimento onde o autor queira vendê-los. Por exemplo, barzinhos. Conheço vários amigos na Zona Oeste onde os donos de estabelecimentos vendem meus livros e de outros autores, sendo que alguns gostaram tanto da ideia que criaram pequenas bibliotecas comunitárias. O cliente, ou freguês, como ainda é mais chamado por aqui, vai lá, bebe ou come algo, fica curioso com a biblioteca, folheia algum livro e, se gostar, vai pedir para levar. Não tem cadastro. O cliente então pergunta: mas como você tem controle dos livros que saem? E o dono responde: "não tenho controle. Se você não devolver o livro, é porque gostou, e isso me deixa feliz. Mas se puder doar alguns para fortalecer o estoque, a casa agradece".

Deixou saudade em Campo Grande o Zero Grau, bar do meu amigo Adriano, em frente à FEUC, importante faculdade do bairro, que não só tinha a tal biblioteca comunitária, como também um tabuleiro de xadrez - que às vezes era disputado pelos clientes na madrugada -, uma vitrola com vários LP's à disposição e também o lema: Aqui se discute política, religião e futebol. Já no 'NR Restaurante', em Santa Cruz, a Dona Tatiana começou a botar os livros para vender e a coisa deu tão certo que hoje o restaurante é uma pequena livraria, com obras de outros autores, um espaço com poltronas e café para quem quiser ler e fotos históricas do bairro retratadas pelo fotógrafo Reinaldo Azevedo. Devido a esse trabalho, Tatiana também fez do seu restaurante ponto obrigatório de parada nos roteiros culturais e históricos que têm acontecido no bairro.

Além dos bares e restaurantes, temos também as bancas de jornal, que podem funcionar como pequenas livrarias, pois recebem uma boa quantidade de livros das distribuidoras. Há aqueles que não ligam e os jogam no fundo da banca. Mas há os que botam em destaque e ainda conversam com os clientes sobre os livros, principalmente dos autores locais. Já vendi muitos livros em bancas, mas também em papelarias, lojas de roupas, academias - não de letras, mas de musculação mesmo - e até o local mais inusitado de todos: uma clínica de fisioterapia em Marechal Hermes.

O paciente está lá sentado, aguardando ser chamado, não tem muito o que fazer, bota o olho no livro que fala exatamente sobre a história de Marechal Hermes, folheia e, no fim, depois de atendido, quando o astral já está melhor, pergunta quanto é e leva pra casa.

A música 'Nos bailes da vida', de Milton Nascimento e Fernando Brant, que diz que "o artista tem de ir onde o povo está", é a essência de tudo que escrevi nesse espaço. Por que fazer a pessoa atravessar a cidade e comprar um livro se ela pode encontrá-lo pertinho de casa, de repente no local onde compra pão todo dia? Ou então, como faço aqui em Campo Grande, levo de bicicleta, no serviço que nomeei 'book-bike'. Bom para quem compra, pois recebe o livro em casa, sem acréscimo no preço, e para quem entrega, que faz uma atividade física, apesar de alguns riscos em um bairro que tem poucas ciclovias para o seu tamanho.

André Luis Mansur é jornalista e escritor

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