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Por João Batista Damasceno Doutor em Ciência Política e juiz de Direito

A Constituição diz que a República Federativa do Brasil constitui-se em Estado Democrático de Direito. Democrático porque legitimado pelo povo e de Direito porque pautado pela ordem jurídica. O povo pode fazer tudo o que a lei não proíbe. Mas os agentes públicos somente podem o que a lei determina. Diz ainda que são independentes e harmônicos, entre si, os poderes Legislativo, Executivo e Judiciário. Pela independência, os Poderes funcionam sem subordinações entre si. A harmonia decorre do exercício por cada qual das competências que lhes são exclusivas, sem adentrar na área do outro.

Causa estranheza os comportamentos do juiz Sérgio Moro. Sem deixar a magistratura se manifesta como ministro da Justiça, depois de atuação em oposição aos interesses dos adversários políticos do candidato vitorioso. O ex-ministro do STF Carlos Ayres Britto disse que "o Judiciário se define pelo desfrute de uma independência que não pode ser colocada em xeque. Os magistrados devem manter o máximo de distância dos outros dois poderes. Isso não parece rimar com o 'espírito da coisa' de um membro do Judiciário pedir exoneração e já se transportar, com mala e bagagens, para um cargo do Poder Executivo".

O ex-presidente do STF foi benevolente. Tratou Moro como se já tivesse se exonerado para aceitar o cargo de ministro. Mas, Moro ainda é juiz. Apenas está em férias. E, portanto, tem todos os impedimentos para o exercício de política partidária ou desempenho de funções no executivo.

Para maior garantia dos direitos de quem os tenha aos juízes foram atribuídas as prerrogativas da vitaliciedade, inamovibilidade e irredutibilidade da remuneração. Mas, por interesse público e mediante julgamento, no qual se assegure ampla defesa, um juiz pode ser removido. E pode perder o cargo se praticar ato incompatível com a função judicial.

A Lei Complementar 35 de 14/03/1979, Lei Orgânica da Magistratura Nacional, editada no último dia do mandato do general-presidente Ernesto Geisel e única por ele no ano de 1979, diz que o magistrado vitalício somente perderá o cargo em ação penal por crime comum ou de responsabilidade e em procedimento administrativo para a perda do cargo quando exercite, ainda que em disponibilidade, qualquer outra função, salvo um cargo de professor; recebimento de vantagens indevidas e exercício de atividade político-partidária.

No pleno exercício da magistratura o juiz Sérgio Moro está se comportando como ministro em processo de nomeação e dando entrevistas sobre os planos a executar. Não poderia fazê-lo nem em disponibilidade. Em férias, nem pensar! Em férias recentes, Moro despachou em processo impedindo a soltura do principal concorrente do presidente a quem servirá e impediu cumprimento de decisão de desembargador. Férias é efetivo exercício do cargo para fins legais.

O CNJ tem um diligente corregedor, ministro Humberto Martins, que certamente representará pela instauração de Processo Administrativo Disciplinar, sem necessidade de prévia oitiva do infrator, antes que a exoneração se consume e o delituoso assuma o Ministério da Justiça, subtraindo-se à eficácia do poder disciplinar do CNJ ou do tribunal a que está vinculado.

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