Por *Célio Lupparelli

O governo federal quer implementar a chamada educação domiciliar, alegando que os pais podem ensinar mais conteúdo que a escola. As crianças, segundo esse projeto, seriam educadas em casa, prática denominada ‘homeschooling’. Para os fomentadores desse modelo, o pai que senta com o aluno duas, três horas por dia pode aplicar mais conteúdo que a escola, durante quatro, cinco horas por dia.

Mas não devemos acreditar na inocência dos que planejam colocar essa agressão à educação escolar em vigência. Trata-se de estratégia macabra para dificultar ou impedir a formação de cidadãos críticos, organizados, capazes de conhecer e lutar por seus direitos fundamentais e, uma vez críticos, exigir do Estado e de seus governantes que cumpram as suas tarefas em defesa da igualdades.

Ditadores como Mussolini e Hitler devem estar se remoendo em seus túmulos, invejosos de não terem pensado nesta artimanha. Eles sabiam que, queimando livros e a própria história dos povos, apagariam da memória os feitos dos que pugnaram em defesa das liberdades; sabiam que, manipulando informações, subjugando a mídia e promovendo o culto fanático da “pátria”, o extermínio das minorias e a defesa da xenofobia conseguiriam se perpetuar no poder, pois, a capacidade de discernimento não se desenvolveria nas crianças e nos jovens, futuros cidadãos. 

Mas, apesar de suas mentes doentias, jamais tiveram a ideia de desorganizar a educação escolar da forma que nos estão apresentando agora. Limitavam-se a patrulhar o que era dito e ensinado nas escolas.

Ao se desestruturar a educação escolar, a organização social, a partir da escola, não acontece mais. Desaparecem os grêmios estudantis, celeiros de líderes políticos em todas as democracias; sucumbem os conselhos escola-comunidade, impedindo a participação da sociedade no processo ensino-aprendizagem. Desta forma, desaparecem, também, as reivindicações que tanto irritam os ditadores pelo mundo afora. Formam-se robôs, fáceis de serem conduzidos pelos falsos “salvadores da pátria”.

A escola tem papel fundamental na formação de um cidadão. Ela é o primeiro contato do indivíduo com um mundo “separado” da família. É nesse espaço que ele aprenderá a conviver com regras, diferenças, grupos e toda uma estrutura similar à vida em sociedade. Essa vivência é fundamental para a sua formação cidadã. Enquanto a família introduz a criança no universo dos direitos e deveres, a escola apresenta-se como um nível mais elevado dessa experiência. Nesse espaço, ela aprenderá a lidar com o que é da ordem do direito e do dever, tanto no nível individual quanto no nível coletivo.

Paralelamente ao conhecimento teórico, é preciso que a criança aprenda como as suas atitudes interferem na coletividade. Ela deve perceber as regras como limites que viabilizam a convivência em sociedade e compreender direitos e deveres.

A escola é o espaço ideal para que a criança compreenda a interdependência entre teoria e prática. O aluno precisa perceber que todas as matérias têm um sentido e uma função na vida.

Na formação de um cidadão, é papel da escola oferecer aos alunos espaços de fala, reflexão e expressão, valendo-se de estratégias apropriadas ao desenvolvimento dessas habilidades. A realização de debates, competições e assembleias estudantis são algumas das formas de se possibilitar o desenvolvimento dessas qualidades nos alunos.

Violência, desrespeito, dificuldade de aprendizado, preconceito, entre outros aspectos conflitantes, atravessam o cotidiano escolar. Envolver os alunos na resolução de problemas como esses por meio de projetos específicos, é uma forma de potencializar a formação de um cidadão. Desta forma, em lugar de defendidos diante das adversidades, os alunos se perceberão responsáveis por um ambiente de convivência saudável e produtivo para todos.

A escola é o pilar de uma democracia. Vamos acompanhar, com muito cuidado, a implementação de mais essa tentativa nefasta de impedir a organização político-social através da cidadania.


*Vereador (DEM) e pres. da Com. de Direitos da Criança da Câmara

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