Rio - Todo dia, quatro milhões de pessoas sofrem com as péssimas condições dos ônibus do Rio, pagando caro por carros lotados e quentes. Perdem mais de 17 dias por ano no trânsito, segundo o IBGE, e quase sempre de pé, sem segurança ou conforto. Em alguns casos, ficam à procura de linhas fantasmas. Além disso, motoristas acumulam a função de cobrador enquanto dirigem com pressa para cumprir as metas de lucro dos patrões. Mesmo assim, a tarifa não para de aumentar.
Há um ano, terminava a CPI dos Ônibus da Câmara Municipal. Na sessão final, o cheiro de pizza invadia a sala: o relatório aprovado não indicou nenhuma medida, não indiciou nenhuma autoridade, apenas reuniu as atas das sessões que ocorreram ao longo dos meses anteriores. Uma vergonha. Mas isso já era esperado. Desde o início dos trabalhos, a maioria dos membros da CPI se encarregou de blindar as tentativas de investigar a fundo os problemas do sistema de ônibus do Rio. Como membro da CPI, passei meses brigando para conseguir obter documentos oficiais e convocar autoridades públicas a depor. Reuni todo esse material em um relatório alternativo que foi apresentado para a prefeitura, divulgado para a imprensa, distribuído a especialistas e pesquisadores e entregue a todos os órgãos fiscalizadores, em especial, o Ministério Público do Estado.
Concluímos que o sistema é comandado por uma organização criminosa composta por autoridades públicas e empresários. Essa máfia se consolidou entre 2010 e 2016, durante o governo de Eduardo Paes. Para comprovar, apresentamos diversas evidências. O edital da licitação de linhas de ônibus feita em 2010 é inteiramente direcionado para dar fachada de legalidade ao esquema mafioso da Fetranspor. Os mesmos empresários que gerenciam os ônibus controlam o caixa financeiro e todas as informações do sistema. Botaram a raposa pra cuidar do galinheiro. Além dos dados do sistema serem viciados desde a origem, os cálculos ainda são fraudados. Só em superfaturamento de despesas, conseguimos comprovar que houve mais de 3,6 bilhões de lucros ilegais. E durante esse período ocorreram aumentos indevidos da passagem que estão sendo investigados pela Justiça. No relatório, indicamos 21 recomendações, além de indiciar cinco autoridades públicas e 46 empresários.
Mas nada parece ter mudado com a gestão do prefeito Marcelo Crivella. A verdade é que a máfia dos ônibus continua mandando na cidade, e quem paga a conta é o trabalhador. Mas a luta continua. Semana passada, saiu uma liminar que proíbe novo reajuste nas passagens enquanto os consórcios não entregarem balanços auditados. A prefeitura, por sua vez, tem que inspecionar a frota até junho. Na Câmara Municipal, criamos recentemente a Frente Parlamentar pelo Direito ao Transporte. Sua justificativa é, infelizmente, óbvia: a cidade ainda está longe de garantir à maioria dos cariocas um transporte coletivo de qualidade, acessível e eficiente.
Tarcísio Motta é vereador no Rio de Janeiro e presidente da Frente Parlamentar pelo Direito ao Transporte