Joana de Vilhena Novaes - Divulgação
Joana de Vilhena NovaesDivulgação
Por O Dia
Rio - Bela, recatada e do lar são representações históricas que aprisionam a mulher não somente no seu corpo, mas, igualmente, no universo dos cuidados domésticos. Lembremo-nos, contudo, de que onde há poder, há também resistência e nem só de sujeitos dóceis é feita a história.

Na esteira da militância que busca a ampliação dos direitos das mulheres, acreditamos ser legítimo destacar as mudanças que as campanhas publicitárias vêm sofrendo, na última década. O cuidado e a atenção às imagens veiculadas nos parece, inclusive, um caminho, inequívoco, para a prevenção de agravos, promoção da saúde e bem-estar.

E foi, justamente, dentro da perspectiva de falta de representatividade da mulher na mídia que surge então o Projeto #NosMostre – um banco com 5000 imagens que busca retratar a diversidade dos corpos femininos, rompendo estereótipos de beleza.

O projeto, criado por Dove em parceria com a Getty Images e a plataforma Girlgaze, representa não somente uma crítica aos padrões estéticos atuais, que têm na magreza excessiva e na juventude, juntamente com um perfil biotipológico ocidental e ariano, seus representantes máximos, - como também propõe uma reflexão sobre as categorias normativas associadas à beleza.

O projeto foi pensado após Dove realizar pesquisa de mercado que contou com uma amostragem de 9.027 mulheres, entre 16-64 anos, de 11 países onde a marca atua. Desse universo mencionado, 887 foram brasileiras.

A falta de representatividade é referida por quase a totalidade das entrevistadas, 70% das mulheres ainda não se sentem representadas pela mídia ou pelas propagandas.

No caso, por 8 em cada 10 mulheres brasileiras. De modo análogo, 9 em cada 10 mulheres têm interesse de que as peças publicitárias veiculadas melhorem a forma como as retratam e demandam, pois, que haja mais atenção na diversidade de categorias de análise como: aparência, idade, etnia, raça, forma e tamanho dos corpos, expressão de gênero e sexualidade.

No que tange à percepção da própria imagem corporal, aspectos como os sentimentos de inadequação e menos valia, decorrentes da avaliação moral depreciativa que fazem de si, contribuem fortemente na instauração de um sentimento recorrente de insuficiência. Chegando, em alguns casos, a existir a perda do interesse em expor seus corpos em espaços públicos. Dentro desta perspectiva é que, 6 em cada 10 mulheres brasileiras, reportam os efeitos nefastos da limitação das representações da beleza na mídia.
Finalmente, 6 em cada 10 mulheres brasileiras também referem uma falta da diversidade nos papéis sociais a elas atribuídos pela mídia. Partindo dessa estereotipia, destacam o lugar de mãe ou a função de cuidadora como exemplos paradigmáticos dos modelos de feminilidade exibidos. Reforçando, dessa maneira, os estereótipos atribuídos, historicamente, à mulher na propaganda. Quer seja, dócil, sempre pronta a servir, quer seja, por meio de representações degradantes e constrangedoras, que reforçam a superexposição e erotização dos seus corpos, engessando a sua imagem no lugar de “mulher objeto”.

Os resultados da pesquisa revelam um longo caminho a ser percorrido. A produção de novas narrativas sobre a mulher deve, pois, reforçar a sua aceitação corporal a partir de imagens mais inclusivas, que contemplem a diversidade dos seus corpos. E sendo assim, que as novas formações discursivas sejam transformadoras e permitam mulheres menos aprisionadas nas suas próprias medidas. O que, certamente, terá como saldo o desenvolvimento de uma relação mais generosa e de menos mal-estar com o próprio corpo. Afinal, como antecipara com aguda clareza o escritor e poeta argentino Jorge Luis Borges: imagens são incontinências do visual...
Joana de Vilhena Novaes é psicanalista e professora