Júlio Furtado  - Divulgação
Júlio Furtado Divulgação
Por O Dia
Rio - Outro dia encontrei um velho conhecido no aeroporto. Foi ele que me reconheceu e numa reação efusiva me interceptou: “Júlio Furtado! Não acredito que é você!”. Surpreso e meio assustado estampei um sorriso amarelo que denunciava não saber de quem se tratava. “Procópio da locadora de vídeo, lembra?” Lembrei imediatamente da frustração que suas indicações de “bons filmes” causavam e das desculpas que tinha que inventar para não alugar suas sugestões. A partir dali iniciou-se um longo e frenético questionário que começou com “Para onde você está indo?” E terminou com “Continuo um cinéfilo. Qual seu zap? Quero te passar umas dicas quentíssimas!”.

O encontro não durou mais do que cinco minutos e eu poderia contar o número de palavras que disse nesse tempo. Quando tentava perguntar algo ou comentar uma resposta, a próxima pergunta surgia incisiva, junto com o desinteresse por qualquer coisa que eu pudesse dizer além do que ele perguntava. Durante o voo, pus-me a pensar sobre o ocorrido e sobre a falta da habilidade de dialogar que assola os nossos tempos.

Só para recordar, diálogo á uma ação entre duas pessoas que se alternam como falantes e ouvintes, com o objetivo de enriquecer a ideia central da conversa. Nessa alternância, é essencial que enquanto um ouve o que o outro diz, pense no que está ouvindo e produza uma síntese do que pensa sobre o que ouviu e esse será o objeto de sua próxima fala. Se ambos tiverem esse comportamento, o resultado será uma ideia amadurecida e, no mínimo, uma maior compreensão sobre a forma de pensar do outro.

A falta de diálogo que vivenciamos hoje parece resultante de um desinteresse por amadurecer ideias e um enorme esforço para ter razão. Talvez já estejamos colhendo as consequências de gerações criadas sem limites que deram origem aos adultos que não toleram opiniões diferentes das suas. Tudo isso é agravado pela ascensão das mídias sociais que permitem que discordemos sem ter que argumentar ou ouvir nada em contrário. Caso ocorram divergências, basta excluir.

Parece urgente uma providência educativa, caso queiramos resgatar o diálogo enquanto estratégia essencial ao amadurecimento humano e a escola pode (e deve) dar sua contribuição, levando as crianças e jovens a exercitarem a nobre arte de dialogar. Precisamos aprender a ouvir sem medo e descobrir que nossas certezas podem ser questionadas e que isso é a essência do amadurecimento.
Júlio Furtado é professor e escritor