Allan Borges Presidente da Fundação Leão XIII.11/02/2019.Foto: Rafael Campos ./ Vice-Governadoria - Rafael Campos
Allan Borges Presidente da Fundação Leão XIII.11/02/2019.Foto: Rafael Campos ./ Vice-GovernadoriaRafael Campos
Por O Dia
Rio - O Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) estima que cerca de 102 mil pessoas estejam em situação de rua no Brasil, conforme o último relatório divulgado em 2016. E, de acordo com levantamento da Defensoria Pública, pelo menos 15 mil estão só na cidade do Rio de Janeiro, colocando a capital carioca na segunda posição no ranking dos municípios com mais brasileiros e brasileiras nesta situação, superada apenas por São Paulo.

Importante destacar que as metrópoles, megalópoles e cidades de médio porte, ainda, uma vez que não se tem números concisos, tampouco um diagnóstico censitário mapeando o perfil de quem vive nas ruas, enfrentam enorme dificuldade de elaborar uma política pública consistente para essa problemática mundial.

Por observação, se percebe que maior parte dessa população invariavelmente é formada por homens. Boa parte deles com idade entre 30 e 59 anos, e com nível de escolaridade na faixa do fundamental incompleto.

Quando falamos sobre pessoas em situação de rua, sabemos que existem particularidades na condição de várias delas, isto é, cada pessoa tem uma história de vida. E cada uma tem seu motivo mais íntimo para viver em tais circunstâncias. Mas há também questões em comum. A renegação é uma delas. Digo, sobre a ausência de esperança e oportunidade, marcada pelo menosprezo da sociedade e principalmente pelas tímidas políticas públicas de inclusão social.

É no enfrentamento deste cenário que a Fundação Leão XIII se inscreve na agenda da política pública. Em um processo de trabalho que se baseia no diálogo e na construção de vínculo de confiança. (Re)pensando e, sobretudo, executando projetos que, sobremaneira, promovam acesso à rede de serviços socioassistenciais e das demais políticas públicas voltadas para a garantia de direitos.

Estamos experimentando, depois de anos, o serviço especializado de abordagem social, com o objetivo de conhecer pontos cruciais como: o histórico de vida; aspectos culturais; motivos para estarem em situação de rua; tempo de permanência na rua, uso ou não de drogas e álcool; situação familiar; previsão do tempo necessário para viabilizar soluções de caráter permanente - retorno ao estado e/ou município de origem, reinserção comunitária e/ou familiar; ou ainda o encaminhamento para alguma modalidade de acolhimento.

Fatores, como conflitos familiares, desemprego e uso de drogas ilícitas estão entre os que mais influenciam a permanência nas ruas. E deflagram um cenário de extrema pobreza e desigualdade. Essa realidade das ruas, só mesmo quem vivencia, tem a noção do quanto pode ser dolorosa. Por isso, olhar nos olhos, ouvir com atenção, estender a mão ou abrir os braços para um abraço, pode ser o caminho para transformação de vidas.

Neste sentido, estamos debruçados na construção de novos projetos de vida, cientes dos desafios, mas acreditando no potencial de quem está circunstancialmente nas ruas.

Uma pessoa sem sonhos é uma pessoa sem esperança, sem rumo. E atuar no suporte para que possam acreditar na possibilidade de um recomeço e prospectar o futuro, são nossos maiores desafios. E isso, só conseguiremos com aproximação, vinculação, conhecimento, reconhecimento, alteridade, investimento, fortalecimento e empoderamento. E, claro, com muita integração, intersetorialidade e transversalidade entre as pastas de assistência social, saúde, educação, cultura e habitação.

Por isso, buscamos que os usuários sejam atendidos em serviços que ofereçam cuidados e condições favoráveis ao seu desenvolvimento saudável, devendo-se trabalhar no sentido de viabilizar a plenitude dos seus direitos civis e sociais. Afinal de contas, precisamos integrar o Estado aos municípios e bloquear os vetores das fragilidades sociais.

Assim sendo, três frentes de atuação se complementam num processo de mudança que, de tão urgente, avança o sinal vermelho: romper o ciclo de reprodução da desigualdade social; restaurar a esperança dessas pessoas em relação ao seu futuro; e - principalmente - entender que a garantia da cidadania é um direito de todos, sem exceção.
Allan Borges é presidente da Fundação Leão XIII e mestrando em Bens Culturais e Projetos Sociais pela FGV