Chrystina Barros - Divulgação
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Por Chrystina Barros*
O verão deste ano trouxe notícias “turvas” para o Rio de Janeiro, uma água com cheiro, gosto e cor. Quando vamos acordar? Dados da PNAD Contínua/ IBGE, mostram que entre 2016 e 2018, a cobertura da rede de esgotamento sanitário girou em torno de 66%. A distribuição de água tratada mantém-se em 86%, deixando mais de 35 milhões de brasileiros sem acesso. Outros 105 milhões não têm rede de esgoto. Apenas 45% dos dejetos que produzimos no país são tratados.

O SUS gasta mais de R$100 milhões por ano com internações pela da falta de saneamento básico. Em dez anos R$1 bilhão jogados no esgoto, ou melhor, fora dele. Impacto importante também em outras áreas como educação e turismo, além do meio ambiente. No Brasil nossas estações de tratamento de água são praticamente usinas de reciclagem de esgoto que fazem milagres, só não o de conversão da água em vinho e sim de esgoto em água potável, ao menos para “se colocar no pote”. Então nos resta investir no carvão ativado para voltar a beber água com o mínimo de tranquilidade.

O Governador do Rio cogita a hipótese de sabotagem por se aproximar o leilão que “venderá” a concessão dos serviços da CEDAE à iniciativa privada. Mesmo que os investimentos na infraestrutura cheguem através desta estratégia, a gestão e a obrigação de garantir saneamento básico continuará a ser do Estado.

Em dezembro, a Câmara dos Deputados aprovou o Projeto de Lei que estabelece o novo marco legal do Saneamento Básico. Novas regras são definidas abrindo caminho para a exploração a iniciativa privada por licitações. Foram estabelecidas metas até 2033 para estas concessões, como a qualidade da prestação de serviços e reuso de efluentes sanitários, dentre outros. O Ministério do Desenvolvimento Regional estima que mais de R$ 500 bilhões sejam investidos entre recursos públicos e privados neste período. Entretanto, assim como na saúde, o poder público não estará isento da sua responsabilidade na garantia do serviço. Exatamente por isso as regras destes contratos devem ser claras para que investidores saibam muito bem o que deve ser feito e avaliem os riscos desta empreitada porque a responsabilidade é enorme e o déficit gigante. As expectativas estão lá em cima e a sociedade precisa cobrar. O valor é muito maior que o dinheiro, que também não é pouco.

O Portal do Saneamento Básico já relaciona mais de 58 editais abertos a concorrência no Espírito Santo, São Paulo e Rio de Janeiro dentre outros estados, somente no 1º trimestre. Os objetos de contrato variam entre a venda de produtos, elaboração de projetos até a gestão de sistemas completos de tratamento de água, por exemplo. O ano promete e precisa.

Infelizmente obras de esgoto ficam abaixo do nível do solo e não aparecem em fotos para campanhas políticas. Aliás, este ano temos eleições para prefeito. Tomara que o carvão faça efeito no Rio de Janeiro, mas que não apague da memória de todos as consequências de tanto descaso que a sociedade tem com seu lixo e sua sede do agora sem pensar no futuro.

*Chrystina Barros é pesquisadora em saúde