Cultura é um conjunto de valores que permeiam as relações sociais. São ideias, comportamentos, símbolos e práticas sociais reiteradas por gerações. Cultura é parte da herança social que dá a dimensão da humanidade. Só o ser humano é capaz de produzir cultura. As expressões culturais distinguem-se dos comportamentos naturais ou biológicos. A cultura é aprendida com a socialização, desenvolvida e transmitida. É um complexo de comportamentos e conhecimentos; são crenças, artes, normas de conduta e costumes. Cultura é a forma de viver, de interagir e de se organizar de um povo, transmitida de geração para geração a partir de vivência e tradição comuns. É a identidade do povo.
Nos anos 80, o ministro da cultura Aluísio Pimenta disse que broa de milho também é cultura. E foi ridicularizado por uma elite que confunde cultura com belas artes. O que ele quis dizer é que comer é um ato biológico, mas o que comer e como comer é cultural. Os hábitos alimentares dos asiáticos nos parecem estranhos, assim como os povos do Oriente Médio têm nojo quando falamos que comemos camarão e carne de porco. Mas, pum de palhaço na cara do povo não é cultura. É escárnio com a pessoa humana. É a busca da desqualificação, preparando o terreno para a supressão dos direitos. Numa sociedade hierarquizada, rir do outro é imaginar-se em patamar inatingível por similar menosprezo. E os programas televisivos do “mundo cão” e das “pegadinhas” são a pedagogia para a desqualificação. Enquanto o povo ri ou reza seus direitos vão sendo abolidos e o patrimônio público transferido para mãos particulares.
Não se pode confundir a arte circense, que é expressão da cultura, com o pum do palhaço. Nem palhaçada com cultura. Palhaçada, às vezes, é mero desrespeito ao outro, usada para a desqualificação e o aviltamento do ser humano. A palhaçada pode ser o vilipêndio das próprias instituições por quem ocupa os cargos, sem decoro. O uso do carro e da faixa presidencial por um ator para ofender jornalistas, sob o aplauso de uma claque que não percebe que seus direitos estão sendo aniquilados, é emblemático. O ataque não foi aos jornalistas presentes. Mas, à imprensa e à cultura da informação e da comunicação em tempo de fake News e pós-verdade.
Numa sociedade que desumaniza as pessoas, o primeiro processo é submetê-las ao escárnio. A história registra a existência dos “Circos dos Horrores”, onde pessoas com deficiência física ou mental eram expostas para o entretenimento. O avanço da medicina e a difusão da cultura dos direitos humanos promoveu alteração no sentimento da sociedade. Pessoas com doenças ou mutações genéticas passaram a ser vistas como iguais, e não bichos a serem expostos. O primado da dignidade humana e a constituição de uma cultura de direitos humanos acarretaram o fim dos “Circos dos Horrores, espetáculo degradante para a humanidade. O pum, com talco, na cara do povo pode produzir a ‘risadaria’ infantilizada de quem ainda não percebeu que será atingido. Mas, não é cultura. A avacalhação retira a dignidade de quem a pratica e de quem a aceita, por proximidade ao poder. E, somente um servil bem remunerado é capaz de servir, indignamente, de escada para o protagonismo de um ser vil.