Opina 07 setembro - Arte
Opina 07 setembroArte
Por O Dia
Ecos da Primavera Árabe, do Occupy Wall Street e das Manifestações de Junho de 2013 (Manifestações dos 20 centavos) reverberam continuamente no imaginário da sociedade e ajudam a consolidar a mudança de paradigma na estrutura do poder político. Por certo, não foram apenas as quedas de três chefes de Estado no Oriente Médio e no norte da África os resultados da onda revolucionária de manifestações e protestos da Primavera Árabe. Assim como que milhões de brasileiros estavam nas ruas protestando em 2013 não apenas pelos vinte centavos.
As consequências dessas explosões sociais continuam sendo percebidas no mundo político. O impeachment de Dilma pode ter sido o efeito mais sentido na nação, mas a ascensão de um partido como o PSL e a maior renovação que a Câmara teve desde a redemocratização nas eleições de 2018 são efeitos colaterais óbvios dos eventos citados. Nessa mesma esteira novos modelos de representação política ganham força no Brasil. Em especial a possibilidade do mandato coletivo.
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Concebido na Suécia, em 2002, como experimento para alargar as possibilidades da democracia, o conceito de mandato coletivo vem se aprimorando e ganhando espaço no contexto político brasileiro. Nas entrelinhas dos protestos podemos ler com clareza hoje, que a democracia representativa em seu formato tradicional já não dá conta das pulsões da sociedade. Nesse sentido, as novas formas de construção coletiva surgem para revigorar as instituições democráticas e aproximar o cidadão do processo decisório.
Muitos são os motivos para crer que o conceito de mandato coletivo florescerá na atividade parlamentar brasileira. Questões como o custo de campanha e a baixa adesão de votos de pautas não prioritárias podem ser mitigadas com a união de ativistas que congreguem visões de mundo parecidas e que tenham objetivos comuns. Nessa proposta, as fragilidades e potências individuais são combinadas para formar um corpo coletivo capaz de representar com mais força e transparência às demandas sociais.
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No lugar de um parlamentar para ser cobrado, a população tem acesso a um grupo de agentes políticos que respondem pelo mandato, fazendo, dessa forma, com que muito mais pessoas interajam com o legislativo. Essa também é uma equação que favorece à ética: matematicamente é muito mais difícil a cooptação de um
projeto coletivo do que um mandato personalista. Ou seja, na mesma medida em que a população tem mais acesso ao legislativo, diminui-se drasticamente a possibilidade da corrupção, da compra de votos.
Deslocar o poder estabelecido, fragmentando a tomada de decisão como propõe o conceito de mandato coletivo, é sempre um processo doloroso e incerto. Contudo, já percebemos que é impossível retroceder. A sociedade anseia por mais voz e vez na construção dessa nação.
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Em 2020 veremos muitas novas candidaturas coletivas espocando pelo país, ocupando assento nas mais variadas câmaras municipais desse território. O avanço dessas iniciativas ajuda a oxigenar o Poder Legislativo. O sucesso dessas propostas é fundamental para dar credibilidade ao poder mais mal avaliado pela sociedade (segundo pesquisa de 2019 da FGV).
Prevejo conflitos, crises, indisposições e infinitas dificuldades pelas quais passarão esses grupos na jornada de legitimação de seus mandatos. Mas é justamente nessa hora que lanço mão da poesia de Leminski para lembrar que: “Isso de querer ser exatamente aquilo que a gente é ainda vai nos levar além.”

*Poeta, empreendedor cultural e articulador da Bancada do Livro