João Batista Damasceno  - Divulgação
João Batista Damasceno Divulgação
Por João Batista Damasceno*
Até a chegada da Família Real ao Brasil eram proibidas as publicações de jornais, livros ou quaisquer meios de difusão do conhecimento. Os poucos textos escritos vinham da Metrópole, sob rígido controle. Até mesmo a impressão das bíblias católicas, destinadas aos padres, estavam sujeitas a autorização para impressão. Portanto, os primeiros 300 anos da nossa história foram de difusão da ignorância e da brutalidade.

Enquanto pelo restante da América eram instaladas as primeiras universidades fora da Europa, no Brasil somente em 1920 foi criada a Universidade do Brasil, atual UFRJ, que no último dia 07 fez 100 anos. A Universidade de São Domingos, de 1538, é historicamente a primeira universidade das Américas. A de San Marcos, no Peru, é de 1551, a México é de 1553, a de Bogotá é de 1662, a de Cuzco, também no Peru, é de 1692, a de Havana, em Cuba, é de 1728 e a de Santiago, no Chile, é de 1738. As primeiras universidades norte-americanas, Harvard, Yale e Filadélfia, surgiram respectivamente em 1636, 1701 e 1755. As universidades no Brasil são tão jovens quanto os negros e pobres que a brutalidade do capital e do Estado executa na periferia e, igualmente, querem asfixiá-las.

Assim como era proibida a produção e difusão do conhecimento no Brasil Colônia não se permitia, também, a liberdade de expressão. O dia 10 de setembro de 1808 marca o início oficial da imprensa no Brasil com a fundação da Gazeta do Rio de Janeiro. Era um veículo de interlocução entre os leitores do Reino e da América Portuguesa. Mas, clandestinamente, desde 01 de junho de 1808 já circulava o Correio Braziliense ou Armazém Literário, editado por Hipólito da Costa. Impresso em Londres, O Correio Braziliense difundia ideias liberais como a de uma monarquia constitucional e o fim da escravidão, deu ampla cobertura à Revolução Pernambucana de 1817 e aos acontecimentos de 1821 e de 1822 que conduziriam à Independência do Brasil.

A história da liberdade de expressão no Brasil sempre foi um caso de polícia. Cansado de apanhar da polícia, Apparício Torelly, o Barão de Itararé, escreveu na porta de seu jornal a frase destinada a ela: “Entre sem bater”. Quando algum poderoso não gostava de uma matéria mandava a policia prender o jornalista, recolher a edição e apreender os tipos, que eram as letras de chumbo com diferentes tamanhos e grafias com as quais se imprimiam os jornais. A polícia misturava todas as letras e as embrulhava formando um grande pastel. Ao devolvê-las estava destruído o instrumento de trabalho para impressão do jornal, pois era impossível separá-las. Alberto Dinis dizia que “era o linchamento aplicado a um meio de imprensa”.

A constituição de 1988 vedou toda forma de censura prévia e extinguiu os órgãos policiais destinados a tal fim. Dispõe a Constituição que é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença. A Constituição assegura a livre manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo.

Nenhuma lei pode conter dispositivo que capaz de constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística. A Constituição assegura a inviolabilidade da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem das pessoas e garante o direito a indenização por dano material ou moral decorrente de sua violação. Além, claro, do direito de resposta, proporcional ao agravo. Portanto, ao dispor sobre garantias individuais, a Constituição não autoriza censura prévia. Ao contrário, expressamente, veda toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística.

Se a Constituição extinguiu os órgãos de censura e vedou que lei contenha dispositivo que possa embaraçar a plena liberdade de informação jornalística, não pode o poder judiciário exercer o papel de censor prévio, sob pena de usurpação de poder que não lhe foi conferido pelo poder constituinte.
*João Batista Damasceno é professor da Uerj e doutor em Ciência Política