Simone Duque - presidente da Associação de Proteção aos Animais Silvestres Animal Care - divulgação
Simone Duque - presidente da Associação de Proteção aos Animais Silvestres Animal Caredivulgação
Por Simone Duque*
No Brasil, é muito comum o hábito de criar em casa animais como papagaios, maritacas, corujas e até cobras ou pequenos primatas. O desejo de possuir um animal silvestre remonta aos hábitos da população originária e à colonização. Desde sempre, indígenas brasileiros tiveram a fauna silvestre como elemento cultural, seja na alimentação, vestuário e, também, como companhia. E os portugueses que aqui chegaram adotaram o hábito de criar silvestres em casa. "Esses animais eram mantidos nas aldeias como xerimbabos, que significa “coisa muito querida”, nome dado aos animais silvestres mantidos como de estimação” (Renctas, 2001). 
A tradição de domesticar os “xerimbabos” tornou-se parte da nossa cultura ao longo dos séculos. O problema é que não vivemos em florestas, mas em espaços urbanos. Não temos conhecimento nem condições de garantir a qualidade de vida, alimentação correta, cuidados veterinários e as necessidades territoriais dessas espécies.
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Nos estados brasileiros, é possível criar um animal silvestre de pequeno porte, como um papagaio ou uma Iguana. Mas apenas se adquirido em um criadouro autorizado pelos órgãos ambientais para reprodução em cativeiro. Reproduzir um animal silvestre legalmente, no entanto, é um processo de alto custo, o que leva à grande procura dos compradores por animais traficados.
A prática de caça e a retirada das espécies da natureza é ilegal, no país, desde 1967 (NASSAR0, 2015). Mais de 50 anos depois, ainda estamos longe de acabar com esse crime ambiental. Por ano, cerca de 38 milhões de animais silvestres são arrancados da natureza. O tráfico da fauna silvestre, juntamente com o desmatamento e ocupação indiscriminada de áreas florestais, é uma ameaça de extinção para milhares de espécies.
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É notório que os animais que abastecem o comércio ilegal, principalmente as aves - que correspondem a 80% das espécies traficadas -, são capturados muitas vezes ainda filhotes, confinados em caixas superlotadas para o transporte, e deixados sem alimentação. Para que não chamem a atenção da fiscalização são dopados, têm olhos furados, dentes e garras arrancadas ou, no caso das aves, as asas.
O Artigo 29 da Lei de Crimes Ambientais 9.605/98 prevê uma detenção de apenas seis meses a um ano para quem matar, prender, perseguir, caçar espécies da fauna silvestre ou nativa. Mas a legislação também permite que infrator apenas pague uma multa ou consiga reverter a penalidade em serviços prestados à comunidade. A brandura da lei não coíbe e até facilita a prática. Os caçadores retiram da natureza um número muito maior do que chega às feiras. De dez animais transportados em condições as mais adversas, apenas um sobrevive. Dos que são resgatados pela polícia especializada, muitos perdem a capacidade de sobreviver na natureza.
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Ter vontade de criar um animal “diferente” dos nossos pets pode ser até ser um desejo culturalmente compreensível. Mas, para os bichos que nasceram na natureza, essa vontade significa muito sofrimento, tanto físico como emocional. Domesticar um animal silvestres colabora com esse crime ambiental, agrava a extinção das espécies e contribuí para a degradação dos nossos ecossistemas.
Com a preocupação de acolher os animais que não têm mais condições de voltar à natureza, foi criado o Animal Care, uma instituição privada sem fins lucrativos. A entidade tem autorização dos órgãos competentes (Ibama e Inea) e, desde 2014, acolhe animais silvestres vítimas de maus tratos. O Santuário está situado em em uma Área de Proteção Ambiental (APA), na Serra da Bocaina, na cidade de Angra dos Reis (RJ). No mantenedouro, não é permitida visitação pública, reprodução nem, tampouco, comercialização ou doação.
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*Presidente da Associação de Proteção aos Animais Silvestres Animal Care