Em grande número, pessoas com relações de trabalho precárias, sem trabalho formal e, agora, sem uma renda básica de sobrevivência, extinta pelo governo federal
Por Eliomar Coelho*
Quem recebe até dois salários mínimos faz parte dos 52,4% dos trabalhadores que circulam pelos modais de transporte no Rio. Esse percentual pula para 80% no trem. Os dados são do Plano Diretor de Transportes Urbanos de 2015. Agora, imagine 2020 e 2021, em meio à pandemia, com muita gente em casa, em trabalho remoto. Quem sai à rua para trabalhar?
Em grande número, pessoas com relações de trabalho precárias, sem trabalho formal e, agora, sem uma renda básica de sobrevivência, extinta pelo governo federal. Uma multidão de usuários dos transportes que já sofre o impacto de ajustes recentes de tarifas, como o das barcas. Nos trens, teriam que arcar com um aumento brutal de 25% (IGP-M) nos gastos diários com passagens, autorizado por órgão do estado em 28 de dezembro.
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Um aumento absurdo e que não havia a menor condição de ser bancado pela parcela mais pobre da população. Injustificável porque os itens que compõem o IGP-M e sofreram com a alta (especulativa) histórica do período não guardam relação alguma com os usados na operação e manutenção dos serviços de transporte operados pela Supervia.
Graças à mobilização popular, o reajuste das tarifas dos trens foi reavaliado. Mas, além de uma decisão pontual, o governo precisa assumir e organizar seu sistema de transportes daqui para frente, que segue sob o comando de agentes privados. Esses não vão se furtar a exigir compensações financeiras enormes para a aplicação de uma tarifa mais adequada, ou jogar todo o custo para o Estado. Aliás, como sempre fizeram.
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Na CPI dos Transportes que presidi na Alerj, ficou evidente a ausência de planejamento e coordenação entre os vários órgãos. O relatório final aponta diversos descumprimentos dos operadores (os de sempre, há décadas) na entrega de serviços e investimentos. É preciso sempre lembrar: os mesmos empresários que operam os serviços também controlam toda a máquina da bilhetagem. E a tarifa continua do jeito que está, nas alturas.
Na decisão de agora, de aplicar nova tarifa dos trens, Agetransp (que autorizou o primeiro valor) e secretaria não se falaram. Se a secretaria não tem condições de negociar previamente com o concessionário, das duas uma: ou falta organização ou há muita pressão por parte dos empresários de transporte.
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Um transporte público de qualidade é aquele que respeita a vida. Mas não é o que temos visto. Pelo contrário, houve redução das linhas que passam pelas cidades e pelos bairros, nas barcas e trens. Nos ônibus da cidade do Rio, não é de hoje que as linhas somem sem aviso prévio. Durante a pandemia não foi diferente, diversas foram as reclamações de sumiços, também nas linhas intermunicipais.
Falta fiscalização, mas falta direção, uma secretaria que retome o controle público da gestão e planejamento dos transportes. E que defenda uma tarifa justa, e não o descontrole de recursos públicos em favor dos empresários ou que atente sobre o bolso dos mais pobres.
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*É deputado estadual do PSOL-RJ e presidiu a CPI dos Transportes da Alerj