Wagner Cinelli de Paula Freitasdivulgação

Nossas conversas sociais giram sobre assuntos variados. Futebol, política, arte, religião e família. Falamos de nossas conquistas pessoais, nossos sucessos, mas também de nossas derrotas, muitas vezes até em histórias anedóticas, que é quando rimos de nós mesmos.
Porém, há temas marcados por uma interdição social, como é o caso da violência doméstica. Afinal, não gostamos de falar sobre isso, principalmente quando nos afeta. O ator Will Smith, em sua recém-lançada autobiografia, venceu essa barreira e contou sobre a violência em seu lar. Uma das passagens é quando ele tinha apenas nove anos e viu o pai bater na mãe com tanta força que ela desmaiou.
Will revela a aspereza dessa vivência, o sentimento de impotência do menino diante da agressão do adulto, a culpa por não ter interferido naqueles episódios, o trauma e os medos. Feridas doem e Freud, o pai da psicanálise, indicou haver luz no fim do túnel: aquele que sofre precisa falar, colocar para fora.
O relato de Will sobre essa violência é importante para ele e para os demais que partilharam da mesma experiência. É uma catarse e, mais que isso, ajuda a desvelar o manto de invisibilidade que esconde casos semelhantes, mostrando que não são únicos, que essa experiência de violência é reproduzida em muitas famílias e que só com o reconhecimento de que o problema existe é que poderemos buscar ações para reduzir sua ocorrência.
Will Smith não é o primeiro a vir a público contar sobre um pai ou companheiro abusivo que assombra pessoas vida afora. A cantora Christina Aguilera admitiu publicamente as dificuldades que ela e sua mãe passaram com seu pai agressivo. A atriz Halle Berry também declarou que sua mãe foi vítima de violência doméstica e que, posteriormente, ela própria também o foi. Caso notório é o da cantora Tina Turner, que sofreu nas mãos do marido Ike ao longo dos 16 anos de casamento, cujos detalhes estão relatados na biografia “My Love Story”.
A lista é longa e, para citar celebridades brasileiras que admitiram serem vítimas, temos Luiza Brunet, Gretchen e, mais recentemente, Duda Reis. Essa violência faz parte da história de famílias de todos os lugares e de todas as classes sociais. Mas na maioria das vezes está inserida em um pacto de silêncio, que atinge tanto os envolvidos quanto aqueles à sua volta e que fingem que o problema não existe.
Por isso, falar sobre violência doméstica é imprescindível. Contribui para a conscientização da população em geral e, em especial, auxilia vítimas a se darem conta da relação abusiva que vivenciam e da necessidade de apoio. Ajuda também as sobreviventes, que percebem que não estão sozinhas.
Will, Christina, Halle, Tina, Luiza, Gretchen, Duda e muitos já falaram. Você também pode e deve romper o silêncio, contribuindo para que a luz no final do túnel fique mais luminosa para todos.
Wagner Cinelli de Paula Freitas é desembargador do TJRJ e autor do livro “Sobre ela: uma história de violência”