Rio - Médicos, enfermeiros e parentes de pacientes fizeram na manhã desta sexta uma manifestação em frente ao Hospital Federal de Bonsucesso (HFB), na Zona Norte do Rio, após a direção da unidade decidir gastar R$ 156 mil para comemorar a festa de 70 anos da unidade, que foi encerrada após um grupo invadir o local. O evento acontece em um momento que a unidade de saúde passa por um “choque de gestão” por falta de materiais para trabalhar no local.
Sem ar-condicionado funcionando nos centros cirúrgicos, o evento aconteceu em uma tenda climatizada e com serviço de bufê.
A estrutura da festa dispunha de quatro aparelhos de climatização e dois ventiladores. A tenda refrigerada saiu à R$ 27,2 mil, segundo o jornal RJ TV, da TV Globo.
O coquetel, que incluiu nhoque de batata baroa e guacamole de camarão, para 300 pessoas, custou R$ 20 mil, ainda segundo a TV Globo.
Por conta disso, os funcionários protestaram contra a iniciativa. "Hoje tem 31 pacientes sentados na enfermeira porque não tem leito. Não tem seringa, não tem o lanceta para fazer o exame de glicose. Estamos correndo o risco de ser contaminado sem esse item para o exame de glicose", disse Zélia Diogo, técnica de enfermagem, 71 anos, 30 deles trabalhando no hospital.
"A emergência está fechada para obra e estamos em uma sala improvisada. É muito difícil trabalhar aqui desse jeito. Estou aqui há mais de 30 anos como técnica de enfermagem e é a primeira vez que vejo essa situação. R$ 156 mil para fazer uma festa e está faltando tudo. Falaram que é uma empresa que deu o dinheiro para a festa. Por que não deram esse dinheiro para comprar suprimentos para o hospital?", completou.
Enquanto a direção do hospital participava da festa, pacientes enfrentavam dificuldades para serem atendidos. É o caso do companheiro da dona de casa Andreia da Silva Santiago, 31 anos. "Meu marido está ali desde as primeiras horas do dia se contorcendo de dor nos rins. O atendimento da emergência diz que só tem um médico atendendo. Pagamos impostos e não temos atendimento. Isso é lamentável".
De acordo com pacientes, na quinta-feira, a direção da unidade chegou a fechar as portas da emergência por falta de espaço para os pacientes.
As tendas onde aconteciam a festa acabou sendo invadida por pelo menos cem manifestantes, entre médicos, servidores administrativos e enfermeiros, que gritavam palavras de protesto, além de "fora, Luana", se referindo a Luana Camargo da Silva, diretora do HFB. A gestora saiu chorando do local.
Seguranças do Hospital Federal de Bonsucesso hostilizavam repórteres que cobriam a manifestação. Um dos profissionais da unidade chegou a chamar a equipe de O DIA e Rádio BandNews de "animais" e chegou a apontar um dos dedos de forma obscena para os repórteres quando eles tentavam registrar o caos que o hospital vive. Os jornalistas procuraram a direção da unidade para falar sobre a agressão e um dos assessores pediu "compreensão, pois os ânimos estavam exaltados".
Em nota, o Hospital Federal de Bonsucesso (HFB) informou que o valor da festa R$ 156 mil "não é verdadeira". "O que está em curso é um evento de menor magnitude, contendo apenas uma tenda climatizada para facilitar o acesso de todos, haja visto que os nossos auditórios encontram-se nos andares superiores das unidades, o que acaba dificultando acessibilidade adequada para o evento. Esclarecemos que todo o evento está sendo realizado através de doações e que nenhum custo foi pago com dinheiro público", diz o texto.
Mulher sofreu aborto por falta de atendimento, diz marido
Luana Cristina Oliveira Rua, de 21 anos, estava grávida de três meses. Sentindo fortes dores no abdômen ela foi levada pelo marido ao Hospital Federal de Bonsucesso no último domingo. Medicada, a dona de casa foi liberada. No dia seguinte ela foi levada pelo marido, o ajudante de pedreiro Rodrigo Oliveira Santos, 25, ao Hospital Getúlio Vargas, na Penha. Lá, a mulher foi medicada, novamente, e mesmo sangrando e se contorcendo de dor foi mandada de volta para casa. Na madrugada de quarta-feira, Luana abortou no banheiro de casa.
Logo em seguida, a mulher voltou a ser levada ao Hospital Federal de Bonsucesso. Desta vez, ela foi internada.
“Ela estava sentindo muita dor, sentindo enjoo e viemos para o hospital. Aqui ela foi atendida, tomou soro e depois foi liberada — dizendo que ela não estava grávida. Ainda sangrando e sentindo muita dor fomos para casa. Fomos então no Hospital Getúlio Vargas. Lá, ela foi novamente medicada. Na quarta-feira voltamos aqui para o Geral de Bonsucesso com a minha esposa já sem o feto. Ela abortou em casa. O meu filho morreu por falha no atendimento”, conta chorando o esposo da mulher.
Após passar dois dias internada, a mulher deverá receber alta nesta sexta-feira. “Já sou pai de uma outra criança e estou muito triste e frustrado pois o nosso segundo filho estava sendo muito esperado. Foi um descaso que tiveram com a minha mulher. Da primeira vez, ela só foi atendida porque briguei”, lembra.