Apesar de consagrado na vida cultural do Rio, o canecão, em Botafogo, Zona Sul, estava fechado desde 2010 e não abrigava mais do que uma péssima infraestrutura e lembranças de tempos gloriososCléber Mendes / Arquivo Agência O Dia

Rio – O leilão para a concessão do Canecão, sob posse da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), previsto para a tarde desta quarta-feira (21), foi cancelado. A suspensão acontece após não terem sido entregues as propostas para licitação do Equipamento Cultural Multiuso (ECM), espaço adaptável que seria erguido sobre a antiga estrutura da casa de shows, e da realização de obras de infraestrutura acadêmica e assistência estudantil.
De acordo com a Universidade, uma nova data para entrega de propostas será publicada em janeiro de 2023. Localizado em Botafogo, na Zona Sul, o Canecão está fechado desde 2010 e, desde então, apresenta sérios problemas de infraestrutura.
"Temos o sentimento de que, dada a complexidade da proposta, os principais interessados necessitam de mais tempo para apresentar as propostas", informou a Universidade, em nota.
Apresentado à comunidade acadêmica em agosto deste ano e aprovado no Conselho Universitário (Consuni) da UFRJ em novembro, o novo Canecão faz parte do projeto de valorização do patrimônio da instituição, tocado em parceria com o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).
A proposta é uma alternativa, diante das restrições orçamentárias atuais, para concluir obras inacabadas e obter novos espaços, e divide-se em duas linhas de trabalho: o ECM e a construção de espaços para uso da Universidade.

O Equipamento Cultural Multiuso (ECM) pretende demolir a antiga estrutura para erguer um espaço adaptável que abrigará desde apresentações teatrais à shows, com capacidade para receber no mínimo 1,5 mil pessoas sentadas e mais de 4 mil em pé.
A ideia é que o espaço também sirva à comunidade acadêmica, com a utilização do palco por alguns dias durante o ano para apresentação de espetáculos, formaturas e até congressos, além de salas destinadas a ensaios, apresentações ou exposições. O novo Canecão hospedará também o Espaço Ziraldo, emoldurado por um painel de 23 metros feito pelo cartunista. 

Além do equipamento multiuso, o projeto prevê também a permuta das unidades do Ventura Corporate Towers, pela conclusão de mais de 70 mil metros quadrados em diversas infraestruturas, bem como a construção de novos prédios acadêmicos, entre eles um restaurante universitário, com capacidade para oferecer cerca de 2 mil refeições por dia.
O BNDES informou em nota que "o leilão não foi realizado, pois os investidores interessados no projeto demandaram mais prazo para elaborarem suas propostas."

A polêmica
Durante a votação no Consuni, estudantes se manifestaram contra o projeto. Carregando cartazes com frases como "A UFRJ não está à venda", os discentes alegaram que a proposta entrega a UFRJ à iniciativa privada. A discussão também foi estendida para o espaço conhecido como Campinho, alocado no Campus da Praia Vermelha.
Recentemente, um projeto de extensão da Escola de Educação Física e Desportos (EFFD), aprovado pela Pró-Reitoria de Extensão (PR5), que utilizava o Campinho, foi suspenso por tempo indeterminado para que fossem apuradas irregularidades. A denúncia, feita pela Associação de Docentes da UFRJ (AdUFRJ), era de que o "Projeto Nova Geração Carioca: Futebol como veículo de transformação social" atuou em parceria com o Clube Atlético Barra da Tijuca, cujo sócio é Adilson Oliveira Coutinho Filho e o sócio e diretor de futebol, Luís Antônio Verdini. Ambos foram alvos da operação Smoke Free, deflagrada no último dia 23.

Palco histórico

O Canecão foi inaugurado em junho de 1967 como uma cervejaria, pelo empresário Mário Priolli. A mudança para casa de espetáculos veio dois anos depois, com o show da cantora Maysa, dirigido por Bibi Ferreira. De lá pra cá, estabeleceu-se uma briga judicial de quase 40 anos entre o empresário e a UFRJ, que recebeu o terrenos da União nos anos 1960 e alegava o não pagamento do aluguel por parte de Priolli.

Em 2010, a Universidade conseguiu a reintegração de posse do espaço. O Canecão chegou a ser cedido ao Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), mas, sem recursos para promover sua reforma, acabou retornando para a UFRJ. Desde então, ele permanece fechado.

Pelos palcos do Canecão, já passaram artistas nacionais e internacionais e nomes consagrados da nossa música. Embalado por artistas da Música Popular Brasileira, o público já prestigiou shows de Maysa, Tom Jobim, Toquinho, Vinícius de Moraes, Elza Soares e outros. Uma das grandes histórias envolve o cantor Elymar Santos, que vendeu seu apartamento e carro para conseguir alugar o espaço e se apresentar. Além disso, grandes nomes do rock nacional nos anos de 1980 fizeram shows memoráveis, como Paralamas do Sucesso, Engenheiros do Hawaii e Barão Vermelho.