Entregadores fazem protesto em frente ao hospital Salgado Filho, onde Nilton Ramon está internadoCleber Mendes / Agência O Dia

Rio - O caso do entregador Nilton Ramon de Oliveira - baleado pelo cabo da Polícia Militar Roy Martins Cavalcanti por seguir as normas da plataforma e recusar-se a passar pela portaria para entregar um pedido - refletiu-se em sentimento de medo para a categoria.

Sem querer ser identificado, um colega de Ramon afirmou que a plataforma deixa a desejar em relação à segurança dos entregadores cadastrados. "Nós botamos em pauta a questão do tempo de espera na porta do cliente. Tem um limite muito alto para quem trabalha a noite e em ruas desertas", disse.

Outro trabalhador que compartilha da sensação de insegurança é o Léo Família, presidente do "Família 2 Rodas", associação de entregadores de Niterói. Ele diz que "só quer trabalhar para ganhar o pão de cada dia".

"Essa sensação de insegurança não passa nunca. Está cada dia que passa de mal a pior. Saímos pra ganhar o pão de cada dia e não sabemos se voltamos para casa. Resta orar todos os dias para Deus nos proteger, só assim", completou.
Em nota, o Ifood disse que "lamenta muito o acontecido com o Nilton Ramon de Oliveira e está em contato com a família, que já está recebendo o apoio jurídico, por meio de uma advogada da Black Sisters in Law, que dará seguimento em todo processo jurídico do caso". Ainda de acordo com a plataforma, a conta de  Roy Martins Cavalcanti foi banida da plataforma.

O iFood esclareceu que "a obrigação do entregador é deixar o pedido no primeiro ponto de contato, seja o portão da casa ou a portaria do prédio". E reforçou que essa é a recomendação passada aos entregadores e aos consumidores.
Em relação à sensação de insegurança, a plataforma pontuou: "Desde 2023, a empresa vem realizando uma série de iniciativas em parceria com o Secovi Rio (Sindicato da Habitação do Rio de Janeiro), para conscientização de moradores e capacitação de porteiros e síndicos de condomínios da cidade. Além disso, expandiu o acolhimento feito pela Central de Apoio Jurídico e Psicológico na cidade do Rio de Janeiro, com possibilidade de atendimento presencial no edifício sede das Black Sisters in Law (BSL) - coletivo de advogadas negras - que fornece assistência para profissionais vítimas de qualquer tipo de violência. Lançamos recentemente uma Política de Combate à Discriminação e Violência que prevê condutas que não são aceitas, penalidades em relação aos agressores e formas de proteção às vítimas". 
Profissão perigo

Levantamento do Fogo Cruzado mostra que, nos últimos oito anos, 44 entregadores foram baleados na região metropolitana do Rio de Janeiro, com 36 mortes. A maioria dos alvos tem três pontos em comum: homens, faixa etária de 18 a 25 anos e pele negra.

Mais da metade dos casos ocorreram na capital, enquanto São Gonçalo aparece oito vezes. Maricá, Japeri, Nova Iguaçu, Queimados e Niterói também registraram ocorrências no período.

Entenda o caso

Nilton se negou a entrar no condomínio para entregar o pedido. Com a recusa, ele retornou ao estabelecimento. Minutos depois, o policial foi armado até a loja, na Praça Saiqui.

O entregador filmou os momentos antes de ser baleado, em que o PM já aparece com a arma na cintura. "Não estou armado, sou trabalhador. Estou sendo ameaçado, ele está querendo me agredir, mostrou a arma na minha cara. Tira a arma e faz na mão", disse Nilton.

O agente, por sua vez, alegou que o motoboy foi mal educado com sua mulher, que teria feito o pedido. "Trabalhador, o c..., minha mulher te tratou com maior educação, vai tomar no ... Seja educado, não se propõe a fazer entrega? Então seja educado, minha mulher tem 42 anos e te respondeu na maior educação", falou. Após atirar no rapaz, o PM teria prestado os primeiros socorros e ido embora em seguida.

O motoboy está internado em estado grave no Hospital Salgado Filho, no Méier, Zona Norte, desde a madrugada desta terça. Ele foi atingido com um tiro na coxa. A bala, segundo parentes, atravessou a perna direita e atingiu duas artérias. Ele precisou ser submetido a duas cirurgias e recebeu bolsas de sangue.

A Polícia Civil afirmou que Rony se apresentou na 32ª DP (Taquara) e foi ouvido. De acordo com a corporação, "/imagens do fato estão sendo analisadas e testemunhas serão ouvidas". O caso foi encaminhado para a 28ª DP (Praça Seca). A Corregedoria da PM também abriu um procedimento para apurar o fato. A arma chegou a ser acautelada, mas foi devolvida.