Toda a mídia enfatiza agora os pedidos de arquivamento, pela Procuradoria-Geral da República, das investigações abertas contra o presidente da República por atos e omissões praticados durante o enfrentamento da pandemia.
As imputações do relatório final da CPI da Pandemia, tais como crimes de epidemia com resultado morte, prevaricação, infração a medidas sanitárias preventivas, charlatanismo, emprego irregular de verba pública, entre outros, foram solenemente desprezadas. Estão na fila para o inexorável pedido de arquivamento outros procedimentos, como a responsabilização do Presidente pela omissão na morte de pelo menos 1/3 dos quase 700 mil brasileiros mortos pelo vírus e organização criminosa.
Alguns articulistas, de maneira incauta, afirmam que, assim que o Bolsonaro sair do cargo e perder o maldito foro privilegiado, será denunciado por procuradores de primeira instância. Não custa avisar - olha eu aí de novo-: quando o procurador-geral da República pede o arquivamento e o Judiciário tem que arquivar, pois o PGR é o dono da ação penal contra o Presidente da República, só poderá haver nova investigação e denúncia se houver fatos novos. Não se pode dar uma outra roupagem e interpretação da investigação sobre os mesmos fatos. E eu, sinceramente, espero que não tenhamos outras 700 mil mortes para ensejar nova investigação.
O fato é que, durante a CPI, conversei com diversos senadores, escrevi vários artigos, participei de debates comentando o risco dos poderes imperiais nas mãos do procurador-geral da República. Ele, e só ele, é que pode propor ação penal contra o Presidente da República. Nem os 11 ministros do Supremo Tribunal podem instaurar um processo penal se não houver denúncia assinada pelo PGR.
Por isso, defendia a necessidade da proposta, pela CPI, de mudanças legislativas. Um dos poderes das CPIs é exatamente propor aprimoramento na legislação como um todo. Alertei diversas vezes sobre a real possibilidade de uma imensa frustração do povo brasileiro, especialmente os que perderam entes queridos pela criminosa ação do Governo, pois a CPI, no ponto referente ao presidente da República, não teria efetividade.
O que mais dói é que o arquivamento e a não responsabilização do presidente da República, que desdenhou da dor do povo brasileiro, que ridicularizou a doença imitando uma pessoa com falta de ar que, em verdadeiro culto à morte, deixou à míngua por longo tempo, sem vacina, a população do país, não vai trazer de volta os que morreram.
Que se cuidem os senadores da CPI, pois pode surgir algum procurador da república que os processe por prevaricação por, mesmo sabendo da necessidade das mudanças legislativas, quedaram-se inertes e não fizeram as propostas necessárias. E ainda vão afirmar que a satisfação de interesse pessoal, indispensável para o tipo penal, era a necessidade da exposição midiática.
Foram meses de dor e sofrimento impostos pela crise sanitária e de profunda humilhação vinda pela postura cínica, cruel e desumana do chefe da nação. Agora, às vésperas das eleições, o pedido de arquivamento vai ser largamente usado na campanha política para dizer aos eleitores que a conduta do Presidente foi correta e legal. Nada, porém, pode apagar da memória o inferno que vivemos. E nós sabemos que o Presidente alimentava o fogo e ainda brincava com a nossa dor. Se não fosse pedante, eu diria:” eu avisei que isto ia acontecer.”
Termino com Rui Barbosa: “De tanto ver triunfar a nulidade, de tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver crescer a injustiça, de tanto ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus, o homem chega a desanimar da virtude, a rir-se da honra, a ter vergonha de ser honesto.”
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