Rio - Em meio a crise financeira do Carnaval, a União da Ilha conta com um trunfo para a Sapucaí: o apoio do governo cearense e das manufaturas do estado por meio da doação de cerca de R$ 1,5 milhão em peças que vão compor o desfile da agremiação neste ano. No enredo que homenageará o Ceará através das obras dos escritores Rachel de Queiroz e José de Alencar, a escola de samba retratará o artesanato, comidas típicas, moda, belezas naturais, festividades e lendas da região do Nordeste.
Enquanto o abre-alas será forrado pela palha da carnaúba, a última ala terá as ‘Angels do Sertão’, metáfora do desfile da americana Victoria’s Secret. A velha guarda promete muito luxo com um figurino exclusivo do estilista Ivanildo Nunes, bordado à mão, com direito a rendas e cristais.
“Hoje vejo que temos um Carnaval de verdade, feito pelas mãos dos cearenses. Nosso objetivo é dignificar com beleza e autenticidade as obras de Rachel e Alencar, que escreveram com paixão sua gente e seus lugares”, ressaltou o carnavalesco Severo Luzardo, de 56 anos, que desde agosto viajou do litoral até o interior do estado para conhecer de perto a cultura.
Na região, o enredo já faz sucesso. “A União da Ilha invadiu o Ceará! Antes dos jogos do Ceará Futebol Clube toca o nosso samba-enredo, e na Feira de Artesanato de Iracema, em Fortaleza, um telão passa as imagens dos artesãos produzindo peças para o desfile. Foi uma acolhida emocionante”, disse Luzardo.
Para otimizar ainda mais as finanças, o carnavalesco reaproveitou material do ano passado. “Não tenho nada dentro do almoxarifado. Venho da Série A, então não tenho pudor. Lavo e está novo. Prefiro reaproveitar e andar com meu Carnaval”, ponderou ele. A estratégia deu certo, pois a maioria das alegorias já está finalizada a pouco mais de um mês do espetáculo.
DANDARA ENCANTA
Na abertura do desfile, a Ilha contará as lendas do estado. A primeira porta-bandeira Dandara Ventapane, de 27 anos, representará a princesa encantada de Jericoacoara. Segundo o folclore, ela foi transformada em uma serpente de escamas de ouro, só com cabeça e pés de mulher.
Neta de Martinho da Vila, a carioca se inspirou na história para a coreografia com seu par. “A ideia é trazer o espírito forte do Ceará, um povo aguerrido, na nossa dança”. Dandara deu a luz ao seu primeiro filho, Dante, há apenas dois meses e meio, e, por isso, o bebê passou a ser seu companheiro fiel. “Ele me acompanha em todos os compromissos e irá comigo para a concentração da Sapucaí. Vou amamentá-lo antes de vestir a fantasia, e depois encontro ele novamente no fim”, contou.
No segundo setor da agremiação, as delícias e a arte do Ceará ganharão vez em um carro alegórico com cores e rendas. O trabalho minucioso do carnavalesco teve cuidado até com a decoração das rodas do veículo. O camarão terá uma ala própria, apoiada pelos criadores locais do crustáceo. Em sequência, um boto guiará a terceira alegoria, das festas cearenses, que lembra as quadrilhas de São João e o maracatu. Esculturas de sereias farão referência a procissão marítima de São Pedro.
Já no setor das paisagens cearenses, uma ossada de dinossauro será reconstruída sobre um carro, uma alusão aos municípios do Cariri, que guardam fósseis raros e preservados. Luzardo quer deixar com o enredo ‘A peleja poética entre Rachel e Alencar no avarandado do céu’ o espírito cultural do Carnaval. “Muita gente que não sabe quem foram esses autores, pode passar a entender agora e se interessar. Precisamos valorizar nossa festa”, reforçou.
* Estagiária sob supervisão de Angélica Fernandes
