Rio - À beira da quadra no ginásio do Tijuca, ao fim de um treino do RJX, Maurício Souza voltou no tempo e relembrou a sua adolescência na cidadezinha mineira de Iturama, aos 14 anos. Naquela época, ele era servente de pedreiro na obra de uma casa bem próxima a um ginásio e sempre entrava lá para beber água. Atraído pelo esporte e incentivado pelo irmão mais velho, ele começou a treinar vôlei e acabou construindo uma bela trajetória nas quadras. Hoje, aos 24 anos, está no atual campeão da Superliga e já ganhou chance na seleção brasileira com o técnico Bernardinho.
“Sou novo, mas tenho uma experiência de vida já bem grande. Servente de pedreiro foi uma das coisas que eu fiz. Trabalhava em Iturama e ia buscar água no ginásio para beber. Via a galera jogando e aí despertou a vontade de jogar também. Fui a um jogo de futebol e o treinador de vôlei estava lá. Falei para ele que gostaria de aprender o esporte. Ele me convidou para ir ao ginásio e meu irmão mais velho, que hoje é advogado, me levou”, recorda Maurício.
O primeiro contato, no entanto, não foi tão animador.
“Fui com tênis de futsal e meia social até o meio da canela. Imagina, né? (risos). Eu era desengonçado e todo mundo ria. Já era alto, tinha 1,97m aos 14 anos. Mas era ‘mole’, caía. Falei que não queria mais, mas meu irmão continuou me levando por três semanas seguidas”, diz ele.
Orgulhoso em contar a sua história, Maurício lembra que sempre ouviu em casa que “o trabalho enobrece” e até hoje carrega viva na memória a imagem do primeiro contato com o ginásio em Iturama.
“A gente nunca esquece esses momentos. Eu chego ao ginásio e me vejo naquela época. Chegava branquinho, de botina, com a mão encrespada de fazer massa de cimento. Hoje, quando eu vou lá para ver a galera, eu me vejo entrando no ginásio, pegando água. Tenho um projeto em Iturama e, sempre que vejo uma criança carente, tento dar oportunidade”, conta Maurício, gabando-se da casa que ajudou a construir: “Ficou linda”.
O meio de rede, de 2,08m, garante que até hoje não faz feio numa obra.
“Estou começando a construir a minha casa lá em Iturama e eu estou ensinando o pessoal da obra, né? Eles acham que sou novo e que sabem mais do que eu, mas não sabem, não (risos)”, brinca o central.
Após prêmio no bloqueio, a Amarelinha
Depois do primeiro contato com o vôlei em Iturama, Maurício se mudou para Sinop, no Mato Grosso, onde experimentou o basquete.
“Joguei vôlei lá também, mas não gostei muito do time. Então, joguei um ano de basquete. Até que fui num torneio de vôlei na areia e a técnica de Lucas do Rio Verde, Teresa, me chamou para jogar. Fiquei um ano lá e, depois, fui para São José do Rio Preto, no interior de São Paulo”, relembrou Maurício, que atuou ainda pelo Mauá, São Bernardo, Vôlei Futuro e Minas até ser contratado pelo RJX.
Melhor bloqueador da última Superliga pelo Minas, Maurício ganhou chance na Seleção que disputou a Liga Mundial.
“Acredito muito em Deus e Ele está me iluminando nesses anos. Em Minas, fui muito bem, consegui ser o melhor bloqueio da Superliga e isso influenciou muito para ser convocado”, diz.
Como pai, um 'exemplo dobrado'
Exemplo para as crianças de Iturama, Maurício também tem uma inspiração em casa para seguir o seu caminho nas quadras: Maurício Filho, de sete meses.
“É o meu príncipe. A melhor coisa do mundo é você chegar em casa e ver o sorrisão dele. É por ele que hoje eu faço isso e quero fazer muito mais. É uma motivação muito grande”, derrete-se.
Apesar da pouca idade, ele destaca a importância de passar bons ensinamentos: “Com um filho, tenho que ser exemplo dobrado. Sabemos que temos que ser um espelho para as crianças e para os adolescentes porque a droga está tomando conta”, alerta.
Com o filho por perto, Maurício se adaptou à vida no Rio, apesar de deixar claro que gosta mesmo do interior.
“Quando fui para Copacabana, não gostei muito. Estou na Barra, que é mais tranquilo. Não gosto de agito”, diz, bem-humorado.