Entrada do Quilombo do Grotão, que fica no bairro do Engenho do Mato - Divulgação
Entrada do Quilombo do Grotão, que fica no bairro do Engenho do MatoDivulgação
Por Irma Lasmar
Niterói - Espaço de perpetuação dos saberes e das práticas ancestrais do povo negro, o emblemático Quilombo do Grotão faz cem anos. A tradicional comunidade - situada na Rua 41 do Engenho do Mato - promove atividades culturais afrobrasileiras que atraem muitos visitantes, como feijoada à lenha, rodas de samba, capoeira, jongo e eventos religiosos, além de aulas de percussão e artesanato. Localizado dentro de uma área de preservação ambiental, o local é rústico e acolhedor, decorado com itens que reverenciam a memória africana, como imagens de orixás e panelas de barro. Por tudo isso, o ambiente é objeto de pesquisa em Antropologia, Direito e Botânica, entre outras frentes, de universidades públicas e privadas. (Veja galeria de fotos abaixo)
O lugar foi fundado por Manoel Bonfim e sua esposa Maria Vicência, descendentes de escravizados, que vieram do estado do Sergipe na década de 1920 para trabalhar na fazenda que mais tarde daria nome ao bairro, responsável pela produção de farinha, banana prata e hortifrutigranjeiros. Nos anos 1950, o negócio faliu e os dois ganharam como indenização um pedaço do terreno e duas mil mudas de banana para recomeçar a vida. Porém, em 1956, as imobiliárias lotearam o espaço e começaram a erguer imóveis tão desordenadamente que o Governo do Estado precisou interferir, determinando em 1960 que as terras ocupadas pelo casal continuassem com eles.
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Cinquenta anos depois, a comunidade ali desenvolvida pelos descendentes dos Bonfim precisou travar uma árdua batalha por sua permanência. Com a demarcação em 1991 do Parque Estadual da Serra da Tiririca, um plano elaborado entre 2000 e 2003 previa a remoção dos residentes dentro da área. Diante desse cenário, os moradores decidiram se mobilizar. Com a intenção de dar visibilidade àquela ameaça e arrecadar verbas para a fundação de uma associação própria, eles decidiram organizar uma programação cultural no local, que atraísse a atenção pública.
A ameaça de desapropriação foi sanada com uma emenda à lei estadual de criação do parque. Além disso, também o Decreto Federal nº 4887 de 2003 fortaleceu a comunidade ao garantir o reconhecimento e a delimitação da propriedade – pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) – de toda terra ocupada por remanescentes de quilombolas que assim se autodefinam segundo sua trajetória. Nesta época, oficializou-se seu nome, inspirado nas grandes grotas d’água existentes na subida ao local, que diminuíram com o fim do roçado e o aquecimento global.
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O Quilombo do Grotão chega ao século XXI sob a administração do neto do fundador Manoel Bonfim, José Renato Gomes da Costa, presidente da Associação da Comunidade Tradicional do Engenho do Mato (Acotem). O dinheiro dos eventos é revertido em obras de saneamento, sinalização e sustentabilidade. A preservação do meio ambiente, aliás, é objeto de grande defesa dos moradores, conscientes de sua origem na agricultura e da relação direta da natureza com uma vida de qualidade. 
Em 2016, o lugar foi reconhecido pela Fundação Palmares, órgão federal de preservação da cultura ancestral africana, que certificou sua autenticidade quilombola. Hoje, o Quilombo do Grotão se consolida como reduto da representatividade e resistência negra na cidade, que alimenta a história de Niterói com sua arte e sua cultura inspiradoras, zelando por conhecimento, valorização e respeito.