Para alcançar o céu, os concorrentes precisam passar por processo que pode levar décadas, até que se cumpram os trâmites que envolvem quatro etapas: Servo de Deus, Venerável, Beato e Santo.
Vale do Paraíba prestes a se tornar a nova ‘Terra Santa’
Vinda do Papa ao Rio deve acelerar processo de canonização de sete candidatos a santos
Rio - A visita do Papa Francisco a Aparecida (SP), em julho, na Jornada Mundial da Juventude, terá significado especial para a região, conhecida como Vale dos Santos. A esperança de autoridades eclesiásticas, parentes e devotos dos sete candidatos à canonização que viveram no Vale do Paraíba — num trecho de 250 km entre Barra do Piraí (RJ) e São José dos Campos (SP) — é que Sua Santidade acelere os processos no Vaticano. Hoje, existe fila de mais de duas mil causas em análise, cada uma com cerca de duas mil páginas.
“Acredito que o Papa nos ajudará. Por ser nosso vizinho (referindo-se à Argentina, país de origem de Francisco), puxará a brasa para a nossa sardinha, como diz o ditado”, acredita a irmã Célia Cadorin, da Congregação das Irmãzinhas da Imaculada Conceição, maior autoridade sobre o assunto no país e postuladora dos dois únicos santos brasileiros, Madre Paulina e Frei Galvão. Este último é de Guaratinguetá (SP), também no Vale da Paraíba. Há sete possíveis futuros santos que viveram na região, entre os 80 candidatos brasileiros.
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“A Itália, com 57 milhões de católicos, tem mais de cem santos, enquanto o Brasil, com mais de 160 milhões de fiéis, só tem dois. O próprio antecessor de Francisco, Bento XVI, já admitia que a Europa tem santos de sobra”, ressaltou Célia Cadorin.
Pela Diocese de São José dos Campos, iniciou-se o movimento de canonização do advogado Franz de Castro Holzwart, já considerado Servo de Deus por Roma e único que nasceu em solo fluminense no Vale do Paraíba; de madre Maria Teresa de Jesus Eucarístico, paulista fundadora das Pequenas Missionárias de Maria Imaculada, também com o mesmo grau já alcançado por Franz; e padre Rodolfo Komó-rek, um polonês que viveu boa parte da vida em São José, onde ficou conhecido como ‘o santo milagreiro’. Este ostenta o título de Venerável.
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A Diocese de Aparecida, por sua vez, é responsável pelo processo de canonização do também já Servo de Deus Padre Vitor Coelho de Almeida, que se tornou famoso através da Rádio Aparecida, e Madre Maria de Lourdes de Santa Rosa, italiana que viveu em Guaratinguetá e fundou o Mosteiro da Imaculada.
A Diocese de Taubaté (SP), por sua vez, defende as causas de Madre Maria do Carmo da Santíssima Trindade, a Irmã Carminha de Tremembé, outra Serva de Deus, e dom José Antônio do Couto, que foi bispo na diocese entre os anos de 1976 e 1981, que também é considerado um Servo de Deus pelo Vaticano.
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Histórias em favor dos pobres
Todos os candidatos a santos têm histórias de vida em favor de pobres, doentes, presos e oprimidos. A eles, vários milagres são atribuídos.
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Irmã Teresa Maria de São João da Cruz, de 83 anos, se emociona ao falar de Carminha de Tremembé, com quem conviveu por 14 anos.
“Me orgulho de ter convivido com uma pessoa que, para nós, já é santa”, justifica. “O sentimento da comunidade é o mesmo. Só falta mesmo o Papa consagrá-la santa”, completa o padre de Tremembé, João Bernardo.
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Atrás das grades e portas pesadas do Mosteiro do Carmelo Santa Face e Pio XII, as 23 irmãs — a mais nova com 23 anos e a mais idosa, com 88 — que lá vivem torcem para que a fama de Irmã Carminha se espalhe do lado de fora, mesmo sendo proibidas de ler jornais ou ver televisão. Elas se concentram na produção de lembranças em forma de fotos, chaveiros e santinhos da fundadora do mosteiro. Irmã Maria do Carmo da Eucaristia, de 36 anos, está terminando de produzir uma escultura de Irmã Carminha, que deverá ser reproduzida em larga escala.
“Sabemos que pelos pequenos gestos, estamos ajudando a aumentar a fé por Irmã Carminha e também despertando a fé em futuras noviças”, garante a madre superiora, Maria Teresa de Nossa Senhora Aparecida, de 43 anos.
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De acordo com quem cuida das causas dos sete candidatos a santos, pelo menos 40 cartas e e-mails relatando milagres e graças alcançadas por intermédio deles são recebidas mensalmente.
Um longo caminho para ser agraciado com o título de santo
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Caminho exigido pelo Vaticano para a santidade: investigação da vida do candidato; comprovação de morte santa; Beato (comprovação de milagre) e Santo (dois milagres).
“Por ela, não fiquei paralítico”
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Quem disse que santo de casa não faz milagre? O vendedor de frutas José Louro, 50, atribui a irmã Carminha de Tremembé a cura de grave problema na coluna. “Por ela, não fiquei paralítico”, conta José, que, com a mulher, Maria, 52, vende frutas perto do Carmelo Santa Face e Pio XII, fundado por Carminha, e onde foi erguido memorial. Enquanto teólogos, peritos e médicos da Santa Sé esmiúçam a vida dos candidatos a santos atrás de comprovação de milagres relatados por fiéis, nas 50 cidades do vale paraibano, cresce a circulação de relíquias, fotos com orações, esculturas, livros e água benta, em igrejas, mosteiros e lojas. “Essa demonstração de fé pode encurtar em até 13 anos o tempo que Roma leva para decretar o grau de Beato”, comenta a irmã Maria Nazaré, de 53 anos, do Mosteiro da Imaculada Conceição.
O primeiro santo mártir dos presos
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Na corrida entre os sete candidatos a santos do Vale do Paraíba, o postulante de Barra do Piraí, no Sul Fluminense, o advogado Franz Holzwarth, leva vantagem. De acordo com a irmã Célia Cadorin, candidatos que morreram por martírio, como é o caso de Franz, não precisam passar por Beato, pulando de Venerável para Santo. Para chegar ao último posto, porém, é preciso a comprovação de um milagre. Em fevereiro de 1981, Franz, então com 38 anos, foi chamado para mediar um motim na cadeia de Jacareí (SP) e, depois de se oferecer para ficar como refém no lugar de um policial militar, foi fuzilado pela polícia com 30 tiros, junto com outros cinco presos. “Com justiça, meu irmão pode vir a ser o primeiro santo mártir dos encarcerados da história”, espera o servidor público, Peter Holzwarth, 64.