Violência contra mulheres choca o Rio no início de 2014
Polícia procura acusados de jogar recém-formada de terraço e esfaquear vendedora
Por tamyres.matos
Rio - Três crimes contra mulheres deram tom violento ao 2014 no Rio de Janeiro nesses três primeiros dias do ano. Ontem, o caso de Allessandra Alcântara Isack, de 21 anos — que levou três facadas supostamente dadas por ex-namorado, em frente ao Shopping Tijuca, e está em estado grave no Hospital Federal do Andaraí — impressionou, assim como já ocorrera com Nívia de Araújo, de 24.
A recém-formada em Direito teria sido jogada do terraço de casa, em São Gonçalo, na madrugada do dia 1º, também pelo ex-namorado. A morte cerebral dela foi constatada ontem de manhã. No Réveillon, Adilson Rufino da Silva tentou enforcar a mulher, em Copacabana, e a briga, que envolveu policiais, acabou em tiroteio e feridos.
Nos dois primeiros casos, os suspeitos estão sendo procurados pela polícia. O delegado da 19ª DP (Tijuca), Roberto Nunes, disse que procurou o suposto agressor de Allessandra, Pierre Alexandre Inacio de Lima, de 41, na casa dele, no Méier, e em locais onde frequenta, mas não o encontrou. A faca usada foi jogada no Rio Maracanã, mas encontrada logo depois por policiais.
Pouco antes das 10h desta sexta, a vendedora, que trabalha em loja de roupas femininas no shopping e aguardava o centro comercial abrir,teria dito a bombeiros, antes de desmaiar, que Pierre era o agressor. O homem, que é promoter de uma casa noturna na Lapa e lutador de jiu-jítsu, deixou sua mochila no local do crime com certificado de conclusão de um curso de lutas, uma medalha e uniforme de academia, antes de ser visto seguindo em direção ao Centro. Ele será indiciado por tentativa de homicídio.
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Allesandra levou uma facada no pescoço e duas, mais graves, no tórax. Passou por uma cirurgia, considerada por médicos um sucesso. Porém, por ter perdido muito sangue, o estado ainda é considerado grave. Ele está sedada. Segundo o delegado, Pierre não teria se conformado com o término do relacionamento com a mulher.
Uma colega de trabalho da vendedora disse que Allessandra se relacionou poucas vezes com Pierre , mas ele se sentia o dono dela. “Ele nunca foi namorado dela,os dois se conheceram e ficaram algumas vezes. Por diversas vezes, ela tentou se afastar dele, ele insistentemente ia ao trabalho dela,passava o dia todo ligando e mandando mensagens, mas ninguém poderia imaginar que iria chegar onde chegou”, disse.
Na academia onde o acusado treinava, na Tijuca, o clima entre os colegas de turma era de surpresa. Segundo um lutador que não quis se identificar, Pierre é ‘bonzinho’, é evangélico e quase não falava nos treinos. “Estranho imaginar que, em uma de nossas brigas, ele poderia simplesmente puxar uma arma e me esfaquear. Fora isso, eu sempre brincava com ele, que levava na esportiva”, contou.
Reflexo de sociedade patriarcal
Segundo a sexóloga Regina Navarro, colunista do DIA, casos de agressão contra mulheres são reflexo de uma sociedade ainda patriarcal, que, durante décadas, sequer torcia o nariz para homens que espancavam mulheres.
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“Eles acham que, se as mulheres não os querem mais, não serão de mais ninguém. Não aceitam serem deixados em segundo plano, principalmente se já tiver outro homem em cena. A mulher corre mais risco nos primeiros meses após a separação, quando eles podem ficar profundamente violentos, pois falharam no papel de macho insubstituível.”
Para a terapeuta especializada em relacionamentos Priscilla Carvalho, a ideia de que o homem precisa ser forte e a mulher submissa pode ser a causa destes crimes. “Ele pode cometer algo por impulso, sem medir consequências”.
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Justiça decreta prisão de ex-namorado
Acusado de atirar Nívia de Araújo do terraço da casa dela, no Rocha, em São Gonçalo, Leonardo Carvalho Oliveira, de 25 anos, teve a prisão temporária decretada pela Justiça ontem e estava foragido até às 22h. Nívia sofreu traumatismo craniano após, segundo a polícia, cair de altura de sete metros. Segundo a mãe da vítima, Neuzeli Barboza da Costa, o motivo do crime foi o fim do relacionamento entre eles.
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“Leonardo era muito ciumento, e ela não queria mais ficar com ele por isso. No domingo, ela terminou o namoro, e ele, inconformado, a matou.”
Segundo o delegado-titular da 73ª DP (Neves), José Luiz da Silva Veloso, o tipo de lesão é de quem caiu de cabeça no chão. “A queda foi de uma forma que ela não teve tempo de se equilibrar, de colocar a mão em algum lugar para se amparar”, explicou o delegado.
“Os indícios são muito fortes contra ele. Havia sangue na casa. Os peritos disseram que a perícia foi muito esclarecedora e que houve, sim, um homicídio", afirmou ele, que vai pedir a quebra de sigilo telefônico de Nívia e de Leonardo.
Imagens do circuito de uma casa vizinha flagraram Leonardo em frente à casa de Nívia na madrugada do dia 1º.
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Policiais relatam ataque de fúria
Embora o pedreiro Adilson Rufino da Silva, de 34, tenha ‘acertado’ vários inocentes num ataque de fúria provocado por ciúmes no Réveillon de Copacabana, sua ira estava mesmo ‘apontada’ para policiais. Em depoimento, três PMs que tentaram contê-lo após agredir a mulher, a diarista Rozilene de Azevedo, de 37, contaram que escaparam da morte por sorte.
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Contra Fagner do Nascimento de Carvalho, que teve a arma roubada pelo suspeito durante luta corporal, o disparo foi na direção da cabeça, mas o acusado de tentativa de homicídio e lesão corporal à mulher errou o alvo.
Já Abinoel Aldemir da Silva disse na 12ª DP que correu logo após o primeiro disparo, provavelmente contra Fágner, mas que, mesmo assim, Adílson apontou a arma na direção do soldado e apertou o gatilho novamente. O projétil teria ido parar num carrinho de pipoca.
O último a ficar na mira do pedreiro foi o cabo Moisés Oliveira do Bonfim, primeiro a interceptar o suspeito, de quem ouviu: “Não vou parar (de bater) pois ela é a minha esposa”. Moisés ficou na linha de tiro, só que a arma falhou três vezes. Na ocasião, 12 pessoas ficaram feridas.