Por adriano.araujo

Rio - Com quase um século de existência, a maior universidade federal do país, a UFRJ, é um dos mais importantes centros brasileiros de produção científica. De seus corredores saem pesquisas de ponta reconhecidas no mundo todo. Nos últimos anos, porém, toda essa qualidade do ensino vem sendo comprometida por cortes no orçamento que culminaram numa greve, que já dura um mês. Em sete anos, o número de alunos aumentou 55%. Em 2011, a universidade tinha R$ 230 milhões para custeio e 870 terceirizados. Hoje, são R$ 301 milhões e seis vezes mais funcionários.

O reflexo da falta de investimento está à vista de todos. No campus da Praia Vermelha, alunos, professores e funcionários lamentam a degradação do patrimônio.Destruída por um incêndio, há quatro anos, até hoje a Capela de São Pedro de Alcântara, uma joia da arquitetura neoclássica, aguarda pela restauração, prometida para o mês que vem. Sem dinheiro, a equipe de manutenção foi extinta e o Palácio Universitário, sede do primeiro hospital psiquiátrico do Brasil, não possui brigada de prevenção de acidentes. Até as atividades aquáticas pararam. A piscina semiolímpica, desativada há três anos, está tomada por lodo. “É uma pena. Era um espaço que funcionava”, diz a professora da Escola de Comunicação Ana Paula Goulart, que, com a greve, não consegue ter acesso a equipamentos multimídia.

Atingida por incêndio%2C em 2011%2C a Capela da UFRJ aguarda por restauração que deve começar mês que vem. O Palácio Universitário não tem brigada de prevenção de acidentesCarlo Wrede / Agência O Dia

Segundo o técnico de anatomia e coordenador de políticas sindicais do Sintufrj, Milton Madeira, a greve teve 60% de adesão, paralisando viagens de pesquisadores e todos os processos, com exceção da emissão de diploma. Aluna do último período de Jornalismo, Roberta Camargo, 25 anos, já esteve duas vezes na UFRJ para tentar resolver problemas com disciplinas, necessárias para que ela possa obter o diploma. “Estou preocupada. A gente não sabe até quando essa situação vai se estender”, diz.

Além de sofrer com assaltos e sequestros-relâmpagos, alunos do campus do Fundão, na Ilha do Governador, que não aderiram à greve, temem o atraso no ano letivo. Sem técnicos, professores não tem como usar os laboratórios para suas aulas, que ficam só na teoria.

Para piorar, partes dos campus do Fundão e da Praia Vermelha estão sem limpeza. Sem salários há três meses, funcionários decidiram cruzar os braços. A UFRJ afirmou que fez o pagamento à empresa, mas que esta não o repassou. Na ECO, o início da aula se arrasta para depois do horário convencional porque a professora e os alunos precisaram varrer a sala.

Há 27 anos na UFRJ, o técnico Luiz Fernando de Oliveira tem acumulado tarefas. “Preciso liberar diploma, preparar editais. Nada disso eu faria se não tivesse greve”, diz. O recém-eleito reitor da UFRJ, Roberto Leher, assume o cargo nesta sexta-feira, mas já avisou que o orçamento só cobrirá gastos até setembro.

Roberta não sabe quando conseguirá o diploma de jornalismoCarlo Wrede / Agência O Dia

?Prédios históricos terão restauração cara, cuidadosa e demorada

?A restauração do Palácio Universitário custará R$ 50 milhões aos cofres da UFRJ, sendo que só a reforma da capela consumirá R$ 15 milhões. Como a capela se situa dentro do Palácio, que é um imóvel tombado, é necessário que o projeto de restauração, a cargo da empresa Retrô Projetos de Restauro Ltda, recupere toda a parte de hidráulica, elétrica, telefonia e sistemas de ar-condicionado. A previsão é que o restauro completo com a recuperação das fachadas seja concluído em três anos, com a entrega de um novo telhado para a capela.

Abandonado durante anos e coberto por pichações, o Hospital São Francisco de Assis , na Cidade Nova, referência no atendimento a pacientes com Aids, começa a ganhar novas cores.

A UFRJ está recuperando toda a estrutura e as fachadas externas do hospital, com orçamento próprio e apoio do BNDES. A pintura da fachada recuperou os tons originais do edifício de 136 anos, de estilo único na América Latina. A universidade prevê que até o final de 2016 todo o exterior esteja recuperado. Para remover pichações sem danificar as paredes, será usado produto especial que impedirá novos danos. A próxima etapa será o restauro interno e desenho original do edifício.

A piscina semiolímpica do campus da Praia Vermelha%2C desativada há três anos%2C está tomada pelo lodo. UFRJ garante que não há risco de dengueCarlo Wrede / Agência O Dia

?Na Rural, restaurante foi fechado

Na Universidade Federal Rural do Rio (UFRRJ), em Seropédica, a greve interrompeu o funcionamento da biblioteca, do restaurante, do almoxarifado e do único posto de saúde. “Não há condição de trabalho. Faltam materiais essenciais, como gaze, seringa e anestésicos. Nos laboratórios, vários aparelhos quebraram e não foram repostos”, diz Ivanilda Reis, coordenadora-geral da Federação de Sindicatos de Trabalhadores em Instituições de Ensino Superior (Fasubra). Para ela, o corte no orçamento agravou a situação. “Não vamos resolver a crise se o governo não rever os cortes do ajuste fiscal”, diz ela, lembrando que trabalhadores estão se aposentando e não há concurso. “Alguns setores que tinham 18 técnicos hoje só tem oito”, diz.

Colaborou Amanda Prado

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