Por felipe.martins

Rio - Se estivesse vivo, George Savalla Gomes, o Carequinha, completaria 100 anos amanhã. E para manter viva a memória daquele que até hoje é considerado o maior palhaço do Brasil, um circo foi armado na Praça Tiradentes, no Centro do Rio de Janeiro. Lá no picadeiro, que por mais de 80 anos foi praticamente a casa de Carequinha, palhaços de várias gerações vão se apresentar, gratuitamente, das 10h ao meio-dia, num espetáculo que promete ser inesquecível para o respeitável público.

O diretor teatral e responsável pela homenagem, Limachem Cherem, 58 anos, confessa que desde os três era fã do palhaço, mas só foi conhecê-lo pessoalmente em 1982. “Trabalhamos juntos por mais de 20 anos e foi ele quem batizou minha filha de palhaça Carequita”. Ele diz que escolheu a Praça Tiradentes para montar a lona do circo porque era lá, na porta do Teatro Carlos Gomes, que Carequinha ia todas as segundas-feiras encontrar outros palhaços, malabaristas, trapezistas. “Era onde eles se encontravam para tratar de trabalho. Carequinha chegava sempre no meio da tarde e pagava café para todo mundo”, conta. Limachem não esconde que a vida de palhaço não é fácil e que hoje, com tanta tecnologia, as famílias circenses estão acabando. “Mas não tem tristeza não. E nossa homenagem vai ser uma palhaçada total”.

Com mais de 80 anos de vida circense%2C George Savalla Gomes encantou gerações e inspirou novos palhaçosDivulgação

Limachem diz, ainda, que atualmente as escolas de circo têm lançado muitos artistas. “Alguns até tentam imitar o Carequinha, mas a verdade é que ele era único, diferente, não falava palavrão, compôs músicas que até hoje cantamos. Ele mudou a imagem do palhaço”.

Para o diretor da Escola Nacional de Circo, Carlos Viana, Carequinha continua sendo um grande ícnone para as novas gerações. “Ele tirou do palhaço aquela imagem do bobo e o transformou numa espécie de herói”. A dupla Patati Patatá também se rende aos elogios. “O Carequinha é a nossa maior referência. Qualquer profissional que queira fazer um trabalho bonito para as nossas crianças precisa se inspirar no legado que ele deixou, na ingenuidade das suas músicas e na alegria que encantou gerações”.

O ator Marcos Frota, que está à frente do projeto Unicirco, lembra da importância de Carequinha para a tradição circense. “Ele, ao lado do Arrelia e do palhaço Torresmo, rompeu a barreira das lonas e levou o universo do circo para a TV. Foi uma vida de luta para permanecer nos picadeiros Brasil afora. Carequinha se confunde com a arte do circo, que é a arte da perseverança”.


“Eu sempre vou amá-lo”

“Achei ele muito bonito, ainda mais tocando violão”. Assim Wanda Chamusca, de 96 anos, descreveu a primeira impressão que teve de Carequinha. Quem lembra das roupas coloridas do palhaço viveu uma grande história de amor. Se conheceram quando ela tinha 16 anos e ele, 20, em Valença, interior do estado. “Era para ele ficar uma semana com o circo. Ficou um mês”, contou.

Os dois namoraram por um ano e chamavam um ao outro de ‘noivo’ e ‘noiva’ nas cartas que escreviam para manter o contato. “Ele vivia longe. Meu pai era contra, dizia que eu não podia me casar com um palhaço. Mas ele não morava com a gente, então não fazia diferença”.

Dona Wanda revela%2C emocionada%2C as cartas de amor que trocava com Carequinha%2C que conheceu no interiorJoão Laet / Agência O Dia

Com uma memória de dar inveja, Dona Wanda contou o dia em que um pretendente, que veio a se tornar seu marido mais tarde, estava em sua casa e Carequinha apareceu para visitá-la. “Ele nunca avisava, só vinha. Meu irmão disse que o moço era meu noivo. Foi muito triste e ele não disse nada. Mas acabou ali”, explicou.

Quarenta e três anos mais tarde, os dois se reencontraram em um evento no Clube Valqueire e mantiveram contato até o fim da vida do artista em 2006. “Sempre vou amar o Carequinha e tenho certeza que ele também me amou.”

Colaborou a estagiária Flora Castro

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