Rio - Em tempos de economia com roda presa, os 2.860 motoclubes legalizados do Estado do Rio estão turbinando as vendas e o turismo da capital e, principalmente, do interior. De acordo com a Associação Estadual dos Motociclistas (Amo-RJ), durante todo o ano, há atividades envolvendo o setor nos 92 municípios. Segundo a entidade, só os maiores eventos, nos finais de semana, como o 4º Encontro Nacional de Motociclistas de Piraí, no Sul do estado, que se encerra hoje, movimentam pelo menos R$ 150 milhões a cada 12 meses.
“Pelas nossas estimativas, cada motociclista, sem contar com o carona, gasta pelo menos R$ 300 em três dias de encontro. A média de cada confraternização é de dez mil pilotos, exceto os maiores, como o de Rio das Ostras, na Região dos Lagos, que chegou a reunir 52 mil em março, o de Penedo e Volta Redonda, no Sul Fluminense, com mais de 40 mil participantes. São 48 finais de semana por ano de grandes festas”, justifica o advogado tributarista e presidente da Amo-RJ, Aluízio Brás, de 63 anos.
Levantamento da Amo-RJ mostra que 26 cidades já têm os encontros de motociclistas como a segunda ou primeira festa mais importante de seus calendários. As prefeituras são parceiras, oferecendo infraestrutura, palco e bancando, na maioria dos casos, apresentações de bandas musicais. É o caso de Piraí. O prefeito Luiz Antônio Neves (PSB) calcula que, no mínimo, R$ 4 milhões são gastos no comércio local, rede hoteleira e restaurantes.
“Depois da Festa de Santana (padroeira de Piraí), o Encontro Nacional de Motociclistas já é o evento mais badalado. Os pilotos são ávidos consumidores e ordeiros, não vandalizam nada, e deixam apenas lucro e saudade”, explica Luiz Antônio. Mais da metade dos visitantes, segundo dados oficiais, é formada por médicos, engenheiros, advogados, e outros profissionais liberais, com bom poder aquisitivo, e acaba regressando.
Em Rio das Ostras, a prefeitura informou que este ano o 20º OstrasCycle, que recebeu 800 motoclubes do Brasil e do exterior, resultou num impacto econômico positivo de R$ 6,5 milhões para a cidade.
?Comerciantes contratam temporários
Os 110 empresários ligados à Associação Comercial e Industrial de Piraí estão eufóricos. Afinal de contas, nos últimos três dias, a multidão de motociclistas de todo o País que, literalmente, invadiu a região —lotando inclusive hotéis e pousadas instaladas até em Volta Redonda, distante 40 quilômetros — obrigou comerciantes a reforçar seus quadros de funcionários para atender os clientes temporários.
No Restaurante Casa do Inácio, no Centro, o dono, Inácio Furtado, 55, teve que contratar mais quatro empregados, além dos 13 fixos, para dar conta dos 40% a mais de movimento registrados desde quinta-feira. “Espero continuar trabalhando aqui, como ocorreu com outros colegas ano passado”, diz a garçonete Sindi Baptista, 24 anos.
Cid Whately, gerente da MWV Imports, que vende motos para todos os bolsos — de R$ 4 mil a R$ 70 mil — no Centro de Piraí, resolveu unir o útil ao agradável e instalou um departamento de capacetes, roupas e acessórios na mesma loja. “Nosso ano de boas vendas começa a partir deste encontro”, garante Cid. “Movimento quase igual na nossa loja, só no Natal”, compara José Renilton, 52, da oficina Preto e Branco Motos, que comercializa três mil itens de peças.
?‘Nos apaixonamos à primeira troca de piscada de faróis’
Além da eterna postura de adoradores de rock e blues, com suas jaquetas incrementadas com escudos e botons, os motociclistas que participam de encontros com bandanas na cabeça e motos possantes, também carregam o romantismo sobre duas ou três rodas por onde passam. Otacílio de Souza Júnior, 52, de Piraí, que o diga. Ele conheceu a esposa, a baiana Lúcia Vilas Boas, 50, num encontro em Angra dos Reis, há três anos.
“Foi amor à primeira troca de piscada de faróis”, lembra Otacílio, que garante já ter dado uma volta ao mundo de moto. “Hoje viajamos pelo Brasil inteiro”, afirma Lúcia, garantindo que, se der tempo, ela e o amado saem ainda hoje de Piraí para curtir o último dia também do 20º Tubarões Bikerfest, em Cabo Frio, promovido pelo Tubarões Motoclube e prefeitura local, na Praia do Forte. A expectativa é que 30 mil pessoas tenham passada por lá desde sexta-feira.
A programação comemora os 20 anos de fundação do Tubarões Motoclube, com tenda ao lado do Forte São Mateus, ponto turístico e cartão postal. O evento encerra hoje com shows a partir das 12h.
Pousadas e hotéis cheios
Para atrair os motociclistas, hoteleiros passaram a dar descontos para os participantes de encontros. “Na minha pousada (em Piraí), o casal tem 20% de desconto na diária. Não tinha mais vagas desde a semana passada”, atesta a proprietária da Pousada Vale dos Pássaros, Sônia Constantino, 59. Feliz da vida, Luiz Geraldo Teixeira, 62, dono do bar Rei do Torresmo, no Centro, revela ter vendido mais de 200 quilos da iguaria a hóspedes nos últimos três dias. “As vendas superaram o Carnaval”, ressalta.
E a tendência é que o rastro dos motociclistas se alastre cada vez mais. Segundo o Detran-RJ, o número de motos em circulação cresce a cada ano: foram cerca de 60,3 mil novos emplacamentos em 2013; 70 mil em 2014; e este ano deverá chegar a 80 mil. Hoje, o número de motociclistas no Estado do Rio chega a 3,8 milhões.
Mas engana-se quem pensa ser fácil entrar para um motoclube. “Nosso rigor para admitir um novo integrante é como uma prova para o Bope (Batalhão de Operações Especiais)”, brinca o presidente do Cyber Motors de Piraí, Wander Labio, 40. Uma comissão de motociclistas experientes monitora a conduta dos novos adeptos por um ano.
“Quem tem muitas multas, se mete em confusões, tem ficha criminal e não observa nossas regras de solidariedade, prestação de serviços e ignora a preservação da natureza, é vetado”, diz Augusto Ferreira, 50, um dos 25 membros do Cyber. “Aqui só tem maluco beleza. Somos uma irmandade”, define Analídia Moreira, 45 anos.