Por felipe.martins

Rio - Acho que a aventura do conhecimento guarda relações com a arte maior de debicar uma pipa e saber reconhecer o que os ventos sugerem. A produção do saber pode ser rigorosa e, ao mesmo tempo, brincante. Eu, ao menos, tento fazer isso, na esperança de lutar, na aldeia da Guanabara, por uma cidade que seja mais Bola Preta e menos tarja preta.

Em um país em transe, a ampliação potente da democracia — indo muito além da frágil falácia da transformação social como simples ampliação do acesso a bens de consumo — pressupõe o falar de muitas vozes, o descortinar de miradas e a ousadia de experimentar rumos que libertem as mulheres e os homens da nossa crônica doença do desencanto, nascida na negação da potência do que podemos ser.

Escrevo História como se fosse crônica, escrevo crônica como se fosse História. Faço música, bato tambor, invento, tento, acerto, erro, brinco e canto. Escrevo sobre macumba e samba. Faço besteira, encho o pote e jogo bola. Estudo pra cacete. Vez por outra pinta alguém, com fumos acadêmicos, sugerindo que eu trabalhe com o conceito de algum intelectual bacana para legitimar o trabalho.

Eu gosto, leio, mas pergunto: o sabichão sugerido sabe o que é macumba? Sabe a diferença entre cabula e barravento, risca ponto com a pemba, bate cabeça, não confunde jurema com juremá, cambonou Cambinda, raspou o fundo do tacho, percebeu o agueré na batida de caixa da Mocidade? É isso que eu estudo, afinal.

Magníficos, por que não podemos escrever sobre a rua com a língua da rua e falar de macumba com conceitos que o Seu Pedra Preta elaborou? Desencarna, turma. Simbora chutar o pau da barraca e inventar outras coisas. Vamos botar as caras, escrever, escutar o caboclo, encantar a palavra, cagar pro figurão, ousar na forma, pintar os cacetes, desconfiar dos títulos, deixar de virar lattes para virar as latas nas esquinas mais vagabundas. Subverter esse Brasil mesquinho pela força do Brasil com tambor, poesia, viração, trovas e teses.

Pomposo sabichão que desconfia daquilo que desconhece, cheio de soberba: sossegue dentro do seu terno, não atrase as prestações do jazigo perpétuo e nos deixe brincar com o conhecimento. No terreiro onde dançamos, da tua boca não sai ponto. Cante pra subir, se fantasie com a toga, pendure quadro na parede e não atravesse o samba. Nós precisamos é do reconhecimento da nossa gente, dos nossos amores, das gentilezas do povo da rua e da proteção dos deuses que dançam. O resto é paz na terra, escola na rua, rua na escola e cerveja no copo!



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