Por thiago.antunes

Rio - No debate sobre a renegociação das dívidas estaduais, tem ficado em segundo plano a compensação das perdas sofridas em decorrência das desonerações do ICMS, concedidas pela Lei Kandir desde 1996. Como essa é a principal fonte de arrecadação dos estados, ficou claro que a União fez caridade com o chapéu alheio.

Apesar de a Constituição determinar, no Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, que a União compense os estados pelo prejuízo, isso jamais foi feito a contento. Nunca foi aprovada lei complementar para disciplinar transferências de recursos.

Por isso, o Supremo Tribunal Federal determinou, em novembro, que a norma fosse elaborada em até 12 meses. Se o Congresso não cumprir a decisão, caberá ao Tribunal de Contas da União calcular quanto a União deve pagar a cada estado.

A Lei Kandir foi aprovada sob o pretexto de incentivar as exportações e impulsionar a Federação (a desoneração recai sobre a exportação de forma ampla, incluindo produtos primários e semielaborados). Mas, ao retirar dos estados importantíssima fonte de recursos, a lei acabou ferindo o Pacto Federativo, que é cláusula pétrea da Constituição e assegura a autonomia dos entes federados.

Recentemente, a Associação Nacional dos Procuradores dos Estados e do Distrito Federal (Anape) analisou dados oficiais do Banco Central e do Conselho Nacional de Política Fazendária. Concluiu que o prejuízo das desonerações chega a superar a dívida que a União cobra dos Estados.

Minas Gerais, Pará e Mato Grosso, por exemplo, teriam mais a receber do que a pagar. Se a União descontasse da dívida que cobra aquilo que deve, quatro das 27 Unidades da Federação teriam suas dívidas reduzidas e as outras 23 passariam a ser suas credoras.

O caso do Rio de Janeiro é ilustrativo: credor de cerca de R$ 47 bilhões e devedor de algo em torno de R$ 80 bilhões. Causa estranheza a assinatura de um acordo de revisão de dívidas sem incluir as compensações. É muito dinheiro para deixar de lado.

A situação é tão paradoxal que os Estados são, ao mesmo tempo, devedores e credores da União. É indispensável um ajuste nessas contas. É urgente que essa discussão seja posta na mesa – seja no bojo do PLP 343 (que estabelece o Regime de Recuperação Fiscal dos Estados), seja aditando o acordo já assinado. O governo federal tirou estados e municípios do projeto de Reforma da Previdência, justamente sob o argumento de preservar a autonomia federativa.

Chegou a hora de os estados acordarem e exigirem da União a compensação dos prejuízos amargados pela política equivocada de desonerações.

Ou somos uma Federação que realmente preserva a autonomia federativa e as respectivas competências tributárias ou entregamos as chaves dos estados e municípios à União e nos transformamos em Estado unitário.

Bruno Hazan é secretário-geral da Anape e presidente da Aperj

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