Por thiago.antunes

Rio - No último dia 13, pelo menos 30 municípios brasileiros foram tomados por manifestações de mulheres contra a PEC 181, que, por inicialmente promover ampliações na licença-maternidade e terminar em uma tentativa de proibir o aborto em qualquer hipótese, ganhou a justa alcunha de "cavalo de troia".

A proposta de emenda constitucional teria, caso aprovada, o condão de causar um significativo retrocesso do que já estava garantido desde 1940 pelo Código Penal: atualmente não é crime abortar em casos de estupro, risco de morte para a mãe ou, segundo recente e importante interpretação do STF, fetos anencéfalos.

Nesse contexto, observamos que um Congresso notadamente não representativo, simbolizando evidente distorção da realidade brasileira, com 70% das cadeiras da Câmara preenchidas por homens brancos, se utiliza de artimanhas para forçar retrocessos que aprofundam as estruturas machistas, patriarcais e racistas.

A proibição completa do aborto indica uma misógina sina de condenar mulheres, principalmente pobres e negras, à morte. Em Salvador, por exemplo, o aborto ilegal representa a maior causa de morte materna.

Aterrorizantes dados de Anuários Brasileiros de Segurança Pública mostram que a cada 11 minutos uma pessoa é estuprada no Brasil. Em 2014, segundo dados oficiais, sabidamente sub-representativos, houve 130 casos por dia. Em 70% dos casos, as vítimas são crianças e adolescentes e em quase 25% os agressores são seus próprios pais ou padrastos.

Nesse sentido, contrariando normas internacionais de proteção à mulher, assim como as de proteção à criança e adolescente e o princípio da vedação ao retrocesso, o Congresso tenta bater o martelo que condena mulheres à morte ou à angústia de criar frutos de seus estupradores. Não passarão.

A proibição, todavia, não representa restrição ao aborto para quem pode pagar por uma clínica segura. O que se revela, portanto, é que tal alteração aponta para um reforço ainda maior da estrutura machista e racista que perpetua um genocídio da população negra.

As mulheres seguem bravamente resistindo para garantir e avançar no direito ao aborto legal e seguro que, como se observa ao redor do mundo, acaba não só por diminuir o número de interrupções da gravidez, mas, principalmente, por manter as mulheres vivas.

Maria Isabel Tancredo é acadêmica em Direito

João Tancredo é advogado

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